Iguarias típicas de Minas Gerais, o quiabo e o pão de queijo ajudaram a conter a inflação no ano passado, mas a queda de preços de 17,28%, em média, do fruto queridinho da gastronomia e a alta comportada de 1,36% do preço da famosa quitanda pouco adiantaram como alívio, diante do orçamento apertado dos consumidores das regiões metropolitanas de Belém (PA), Recife (PE) e Rio de Janeiro. Na terra do açaí, o fruto da palmeira amazônica encareceu 7,40%, enquanto o peixe-castanha ficou 10,69% mais caro para os recifenses e a merluza impôs aos cariocas remarcação de preços de 51,61% em 2014.
Para os desavisados, a dança dos preços mostra que a inflação pode surgir de produtos e serviços de que menos se espera, ainda que eles pareçam restritos aos hábitos de consumo de um ou de poucos locais do país, num universo de mais de 360 subitens de nove grupos de despesas que compõem o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). À exceção daqueles gastos mais comuns entre os brasileiros com alimentos, transportes, saúde e educação, os produtos e serviços identificados com os gostos e hábitos regionais nem sempre lembrados pelo consumidor influenciam o cálculo da inflação para o bem ou para o mal e podem ser também decisivos no final do IPCA.
É o caso de 88 produtos e serviços que bem poderiam ser consideradas coringas do IPCA, ao puxar para cima ou para baixo os gastos da média da população, embora sejam pesquisados em no máximo quatro capitais. Para surpresa até das donas de casas mais afiadas na arte de driblar o surrado dragão da inflação, o IBGE só pesquisa os preços do quiabo na Grande BH, da mesma forma que os do salame na Região Metropolitana de Porto Alegre, os do açaí em Belém e entorno e os do amido de milho na área metropolitana de Fortaleza. A tradição cultural pode explicar esses exemplos, mas não todo aquele lado curioso da formação do indicador. O hambúrguer, um ícone da comida rápida mais vendida no mundo, só é cotado no Distrito Federal.
Com os serviços não é diferente (veja o quadro). Quem não se sentiu representado no índice de 2014, e, com razão, até desconfia dos números, vai precisar de calma para entender de onde vem a inflação oficial. O analista do IBGE em Minas Antonio Braz de Oliveira e Silva explica que além das características regionais dos gastos, os números são acompanhados onde mais se gasta com cada um dos produtos e serviços ou refletem as despesas nos locais onde são mais caros.
Como se fosse um carrinho de compras cheio no supermercado, o IPCA é medido com base na evolução dos preços de cada produto ou serviço selecionados para o cálculo e na participação que eles têm no orçamento de famílias com renda entre um e 40 salários mínimos. Essas ponderações têm como referência a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), uma espécie de radiografia do consumo de mais de 66 mil domicílios do Brasil, que o IBGE fez pela última vez em 2008 e 2009. Cada região metropolitana tem a sua média, que resulta na inflação local, e a partir de todas elas o IBGE chega ao cálculo da média final do IPCA.