A receita das exportações mineiras de produtos farmacêuticos, locomotivas, itens de aviação, válvulas cardíacas e próteses médicas cresceram a altas taxas nos últimos 10 anos, variando de 13,6% a 61,8% ao ano. Embora esses itens tecnologicamente sofisticados tenham pequena participação na pauta de vendas de Minas Gerais ao exterior, o ritmo de expansão faz inveja ao das mercadorias mais tradicionais embarcadas pelo estado, minério de ferro e outros bens minerais, café e aço. Os embarques desse grupo avançaram no máximo 20,9% ao ano.
Os dados jogam luz nova na antiga discussão sobre o potencial de diversificação das exportações mineiras, uma vez que as estrelas da tecnologia não chegam a contribuir com 0,5% da receita total.
Minérios, café e aço respondem por 70% a 75% do total. O estudo comparativo das taxas de crescimento entre 2004 e 2013 foi realizado pela pesquisadora da Fundação João Pinheiro Elisa Maria Pinto da Rocha, diretora do Centro de Pesquisas Aplicadas da instituição, e a professora do Cefet Jane Noronha Carvalhais, em parceria com a Exportaminas, órgão ligado à Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico, e a Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de Minas Gerais (Fapemig).
Entre os itens de maior conteúdo tecnológico e que não são embarcados em grandes volumes como o minério de ferro, líder das exportações mineiras e brasileiras, o melhor desempenho foi observado no segmento ferroviário e naval (veja o quadro). Segundo Elisa Rocha, os registros dos embarques envolvem locomotivas elétricas e a diesel, peças e partes de embarcacções navais. No ano passado, pouco mais de dois terços desses embarques atendeam clientes em Moçambique, ao passo que outros 30,2% tiveram a Colômbia como destino e 0,3% o Chile.
“Quando saímos do contexto dos produtos tradicionais e das análises de conjuntura das exportações, os números mostram que é possível pensar em alguma diversificação da pauta mineira. Se esses itens tecnologicamente sofisticados mantiverem taxas altas de crescimento da receita pelos próximos 10 anos, terão participações maiores no total em 2024”, afirma a pesquisadora. Os autores do estudo sabem que mudanças na base das exportações não ocorrem em curto prazo, mas alertam que a polêmica tende a ganhar espaço no novo mandato da presidente Dilma Rousseff e nos dos governadores.
O pressuposto da discussão é o de que falar em exportações é falar no cerne da questão da competitividade e da produtividade no país. Os resultados do estudo coincidem com levantamentos semelhantes feitos pelo Centro Internacional de Negócios da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg). Os itens mais sofisticados não se movem, propriamente, em razão de preços ou variação cambial, mas demandam investimentos em marca, graus de qualificação e concorrência em bases de ciência e inovação tecnológica, observa Alexandre Brito, especialista em comércio exterior da Fiemg.
“O Brasil entrou tarde nesses mercados e isso exige um custo adicional. Não é fácil disputar quando já há concorrentes estabelecidos e com referência”, diz Brito. A Fiemg está trabalhando em apoio a empresas potencialmente exportadoras na área de desenvolvimento de proteínas e produtos farmoquímicos para levantar informações relevantes nesses mercados e pesquisar clientes. Junto do Instituto Euvaldo Lodi, braço da instituição voltado para inovação, a federação tenta ajudar as empresas a pisarem no comércio internacional, a entender e a superar gargalos nas exportações.
Experiência mineira A performance do segmento ferroviário/naval na pauta das exportações de Minas reflete os investimentos e a expansão da fábrica de locomotivas de Contagem, na Grande Belo Horizonte, da GE Transportation, presente no Brasil desde 1962. Além da atuação da empresa no mercado nacional, a companhia já produziu mais de 160 máquinas para clientes na África. Só da unidade mineira saíram mais de 400 unidades destinadas à América Latina.
A empresa informa que entre as quatro linhas de locomotivas que mantém, as de médio porte respondem por boa parte das exportações para Uruguai, Chile, Bolívia, Argentina, Colômbia, África do Sul, Angola, Botswana, Costa do Marfim, Moçambique e Nigéria. Outro nicho importante de vendas externas e que deverá ser impulsionado na América Latina, de acordo com a assessoria da GE, é o desenvolvimento de softwares destinados a operações ferroviárias. A fábrica de Contagem tem capacidade para produzir 120 locomotivas por ano.
Falta ação pública integrada
O estímulo à diversificação das exportações, a partir dos produtos tecnologicamente sofisticados, requer mais que uma política pública de comércio exterior, na avaliação dos pesquisadores. Segmento talvez pouco conhecido das vendas externas de Minas, e que envolve esses conhecimentos específicos, a exemplo dos de biotecnologia, a receita das exportações de válvulas cardíacas feitas em Minas cresceu 13,6% ao ano entre 2004 e 2013. No ano passado, a Bélgica importou 23,1% do total desses itens, seguida da Suiça, com 20,8%, e da Costa Rica, 16%. Os números são prova da atuação de empresas como a Labcor Laboratórios, de BH. Líder no Brasil na fabricação de biopróteses cardiovasculares, a empresa produz mais de 20 mil válvulas cardíacas e enxertos por ano e exporta para Alemanha, Bélgica, Argentina, Colômbia, Venezuela, Peru, França, Itália, Áustria, Espanha e Portugal, entre outros países.
Elisa Rocha, da Fundação João Pinheiro, afirma que é necessário integrar medidas de apoio ao desenvolvimento e investimentos em ciência e tecnologia. Basta observar como esses itens valorizam e incrementam a receita das exportações. Tomando-se como parâmetro o segmento de aviação-aeroespacial, o valor da tonelada exportada por Minas Gerais em 2013 foi, na prática, muitas vezes superior em comparação aos produtos minerais: US$ 954.144 por tonelada, ante US$ 95,40, respectivamente.
“Enquanto o país patinar na ciência e tecnologia, será muito difícil para esses produtos tecnológicos galgarem mais posições no ranking das exportações. É preciso criar sinergias entre as políticas públicas dos ministérios do desenvolvimento (Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior), de ciência e tecnologia (Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação) e as do próprio MEC (Ministério da Educação)”, afirma Elisa Rocha. A pesquisadora destaca que as experiências no mundo de empresas bem-sucedidas mostram esse esforço conjunto do setor público, incluindo a oferta de linhas de financiamento.
Para Alexandre Brito, da Fiemg, o ambiente de baixo crescimento da economia brasileira é também um fator de desânimo para empreendedores de qualquer porte na busca de mercados no exterior. Dentro das empresas, passar a exportar ou avançar nos embarques requer, ainda, investimentos constantes em recursos técnicos e inovação. “O dono e controlador da empresa, muitas vezes, é quem tem o conhecimento científico e precisa tornar-se, ao mesmo tempo, o contato comercial da organização.”