Brasília – A inflação oficial brasileira de fevereiro se distanciou ainda mais do limite da tolerância da meta estipulada pelo governo federal. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulou, no mês passado, uma alta de 7,7% em 12 meses, o maior patamar registrado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) desde maio de 2005 – bem distante dos 6,5% definidos como limite de aumento médio de preços pelas metas de inflação em vigor no país. Sem sinais de trégua, a carestia seguiu avançando no mês passado: ficou em 1,22%, depois de subir 1,24% em janeiro. A alta do custo de vida nos dois primeiros meses de 2015, de 2,48%, é maior que o dobro do observado no mesmo período de 2014. O aumento dos impostos anunciado como tentativa de recuperar a economia teve influência significativa nessa escalada dos preços, sublinhou a coordenadora de Índices de Preços do IBGE, Eulina Nunes dos Santos.
A inflação continua se mostrando resistente e disseminada, com elevação de preços em praticamente todos os grupos pesquisados. As despesas com transportes pesaram mais 2,2% no mês, puxadas pela disparada de 8,42% no preço da gasolina – em 12 meses, o salto é de 10,84%. O reajuste nas alíquotas do PIS/Cofins, em vigor desde 1º de fevereiro, levou o combustível a exercer um impacto de 0,31 ponto percentual: sozinha, a gasolina foi responsável por um quarto do IPCA de fevereiro.
O governo tem perdido a batalha para a inflação. Há praticamente um ano – desde março de 2014 – o IPCA não fecha o mês abaixo dos 6% no acumulado de 12 meses. O centro da meta, de 4,5%, ficou esquecido. O índice de difusão – que mede a proporção de produtos com taxa de variação positiva – segue alto e torna o cenário ainda mais desafiador: no mês passado, ficou em 68,1%, ou seja, praticamente sete de cada 10 produtos pesquisados pelo IBGE subiram de preço.
Em todas as 13 capitais analisadas, a inflação estourou o teto da meta em 12 meses. Em Belo Horizonte, a inflação permaneceu alta e praticamente repetiu o índice de janeiro, com o IPCA passando de 1,07% no primeiro mês do ano para 1,08% no segundo. No ano, os preços já subiram 2,17% na capital mineira. Em 12 meses, o indicador acumula alta de 6,64%. No Rio de Janeiro, o indicador alcançou 9,02%, o dobro do centro da meta. Não bastasse, os analistas sustentam que o custo de vida dos brasileiros ainda não chegou ao topo. “Os dados continuam a apontar para um ano desafiador. Apesar do baixo crescimento e dos juros elevados, a inflação se manterá bem acima do limite superior da meta”, disse o estrategista-chefe do Banco Mizuho do Brasil, Luciano Rostagno.
O reajuste extraordinário de 23,4% na conta de luz em março e a elevação no valor da bandeira tarifária, além da expectativa de um novo aumento dos combustíveis, mantêm o horizonte nebuloso. O Itaú Unibanco projeta uma inflação anualizada de 8,1% este mês, influenciada principalmente pela alta de energia, que deve atingir o acumulado de 62% em 12 meses. Com a forte pressão dos preços administrados, analistas já conseguem captar uma inflação anual próxima aos 9% nos próximos meses.
Alimentos No grupo de alimentação, com alta de 0,81% em fevereiro, os destaques foram a cenoura (14,41%), o feijão mulatinho (10,47%) e a cebola ( 9,92%). No Rio de Janeiro, os alimentos encareceram 11,25% em 12 meses. A estudante Julia Campos, 19, se considera privilegiada por, ainda, não ter de arcar com as despesas de casa. Mesmo assim, viu a mesada perder valor por causa do aumento da gasolina. “Antes, gastava cerca de R$ 100 para abastecer. Hoje, R$ 125”, afirmou.
As despesas com educação, repercutindo o reajuste anual das mensalidades escolares, avançaram 5,88% no mês passado — cursos regulares e diversos tiveram contribuição de 0,21 e 0,06 ponto percentual, respectivamente. A escola do filho de 17 anos da psicóloga Viviane Bezerra, 44, passou de R$ 1.844 para R$ 2.433. “É o preço de uma faculdade. Dá desgosto trabalhar mais, pagar mais impostos e ver o país como está, com o dinheiro sumindo ralo”, disse.
Em meio à dificuldade do governo em concretizar o arrocho fiscal, a inflação intensifica a crise política. O líder do partido Democratas no Senado, Ronaldo Caiado (GO), disse que a situação econômica atual é “herança maldita de más decisões tomadas no passado”. “A conta chegou e eles (o governo) querem que o consumidor brasileiro — em especial o de baixa renda, que é o que mais sofre —, se vire para pagar essa conta”, atacou.