O pequeno investidor em bolsas de valores busca nos tribunais brasileiros um feito histórico: recuperar prejuízos gerados pela queda do preço das ações nos últimos anos. Para se ter ideia, a Petrobras e OGX, petroleira do empresário Eike Batista, acumulam perdas superiores a 80% do patrimônio investido. A condução desses processos, até então vista como uma via-crúcis pelo longo prazo até se chegar a uma decisão definitiva, vem levantando discussões no próprio Judiciário, à medida que crescem pedidos de reparação nas vias administrativa, cível e penal. Os consumidores desses “produtos” do mercado financeiro ainda têm pouco conhecimento sobre seus direitos, mas começam a correr atrás deles para minimizar as perdas.
Para a advogada Alessandra Cervellini, que representa acionistas minoritários em pelo menos quatro estados no país, há muito que ser discutido até chegar a um veredito final, que segundo ela deve levar em torno de seis anos. “Não faltam meios legais para reaver essas perdas, já que houve dano ao patrimônio desses clientes”, disse. Para a defensora, a maioria dos investidores deixa de buscar seus direitos por desconhecimento. “É um fato inusitado e muitos estão em choque, porque se vê pouco disso no país”, disse.
À frente de pelo menos sete processos na Justiça Federal contra a Petrobras, o advogado Francisco Antonio Stockinger explica que o fundamento jurídico da perda de valor das ações deve ser suficiente para sentenças favoráveis aos acionistas. Para que isso ocorra, é necessário provar a má gestão, já que investimentos no mercado de capitais envolvem risco. Entre as provas, segundo Stockinger, há relatórios do Tribunal de Contas da União e da Controladoria Geral da União apontando prejuízos ao patrimônio público.
“A maior parte desses acionistas investiu suas poupanças em papel em valores que vão de R$ 50 mil a R$ 1 milhão. São investidores não habituados com o mercado de capitais e que acreditaram no governo”, disse. Ele afirma que os investimentos se concentram em 2008 e 2009, quando os papéis alcançaram os maiores níveis. “As perdas ultrapassam 80% do valor de face do papel. Hoje, uma ação da estatal vale em torno de R$ 8”, disse.
Empresas X No caso da OGX, as perdas chegam a 90% do patrimônio investido. Os primeiros processos contra a petroleira foram instaurados ainda em 2012, mas segundo o economista carioca Aurélio Valporto, representante de um grupo de minoritários que entraram na Justiça contra a companhia, “voltaram à estaca zero” com o afastamento do juiz Flávio Roberto de Souza do processo que tem Eike como réu, por manipulação do mercado e uso indevido de informações privilegiadas. “Essa reviravolta estragou parte do trabalho que vinha sendo feito. No entanto, vamos dar entrada ainda neste mês com outro processo na esfera cível contra Eike e a CVM”, acusada pelos minoritários de ter sido negligente na fiscalização da companhia e na prestação de informações pelo controlador.
Em 2013, o analista de sistemas Joaquim Costa adquiriu mil ações da OGX, a R$ 6,10 cada. Hoje, ele vê cada papel na casa dos centavos. “O prejuízo é tão alto que o valor atual se tornou irrisório. Ainda penso se vale a pena me preocupar em vender na atual cotação ou tomar alguma medida para tentar reaver as perdas”, disse.
Nesses casos, segundo o presidente da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimentos e Mercado de Capitais (Apimec), Juliano Lima Pinheiro, o ideal é avaliar e acompanhar a situação da empresa daqui pra frente. “Se a companhia tem perspectivas de crescimento, vale a pena segurar. Se está muito endividada, não”, explica.
O especialista ressalta que, antes de investir, é importante conhecer o mercado e a trajetória da empresa. “Quando a pessoa compra uma ação, ela tem que ter em mente que ela está se tornando sócia daquela companhia. Por isso, a necessidade de conhecer e acompanhar os negócios. O problema é que muitos investidores só tomam conhecimento da situação quando há crise”, lamenta.
Para o economista e consultor de finanças Paulo Vieira, a instabilidade do mercado brasileiro e o baixo crescimento da economia vêm afastando o investidor pessoa física da bolsa. Conforme balanço da BM&FBovespa, no fim de fevereiro, as contas de investidores individuais no mercado de ações foi de 566.615, contra 567.902 em janeiro.“Hoje, menos de 200 mil clientes cadastrados na bolsa são regulares, ou seja, aqueles que investem pelo menos uma vez por mês”, disse.
Segundo Vieira, quem investe em ações deve estar preparado para a atual oscilação. “Estamos passando por uma época de sobe e desce e vale lembrar que a bolsa é um investimento de longo prazo, de pelo menos cinco anos”, disse. O especialista afirma ainda que, para quem está começando, o ideal é procurar um fundo de ação com o perfil de empresas conservadoras. “Caso contrário, é preciso preparar o coração.”