A combinação de juros em alta e a grande oferta de crédito exige cuidados do consumidor para não cair em armadilhas e se atolar em dívidas. Empréstimo fácil com parcelas a perder de vista e longos financiamentos podem levar à temida “bola de neve”. A coordenadora institucional da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste), Maria Inês Dolci, alerta que, quanto maior o prazo para pagar as parcelas, mais pesados são os juros. Ela explica que, antes de aceitar as ofertas, o cliente deve pesquisar as taxas de juros em pelo menos três instituições financeiras, além de avaliar todas as condições. Caso opte pelo empréstimo, deve ainda avaliar o custo efetivo, que engorda a dívida ainda mais, já que inclui taxas de juros e correções. “O crédito está fácil, porém, com juros bastante elevados. O ideal é a redução de gastos, já que empréstimo é dívida”, diz.
Maria Inês explica que o valor do empréstimo não deve comprometer mais de 30% da renda líquida. A coordenadora da Proteste reforça que os empréstimos sem comprovação de renda, geralmente oferecidos para negativados, devem ser a última opção. “Quanto menores as exigências, maiores são as taxas de juros. O crédito consignado, com desconto em folha de pagamento, pode ser uma boa opção, ao contrário do cartão de crédito, por exemplo, modalidade com os juros mais altos”, explica.
Desde janeiro, o corretor de seguros Francisco Saldanha vem recebendo propostas de empréstimo no extrato bancário. Na última, o banco ofereceu R$ 2.986 no caixa eletrônico que, no fim das contas, sairiam por R$ 10.076,40, ou seja, três vezes acima do valor ofertado. “Só vou pagar uma mixaria em 60 parcelas de R$ 167,94, sem a menor burocracia. Ou seja, vou pagar mais de R$ 10 mil pelos R$ 2.986!”, ironiza.
“É uma agiotagem legalizada. Os bancos estão dando tiros pra todo lado e cabe a nós, consumidores, abrir o olho para não entrar nessa canoa furada”, disse. Saldanha, que não é adepto de empréstimos, afirma que o risco existe para o consumidor, que pode se endividar. “No caso dos bancos, esse perigo é quase nulo, já que, na maioria das vezes, as parcelas dos empréstimos são debitadas direto na conta do cliente”, afirma.
Um levantamento do Procon da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) junto a sete das principais instituições bancárias que atuam no Brasil mostra que os juros mensais na modalidade empréstimo pessoal não consignado a pessoa física estão na casa dos 4,75% ao mês, em média. Isso significa uma taxa anual de aproximadamente 74%, pressionada pelas recentes elevações da taxa de juros básica (Selic) pelo Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom). Em março, a Selic subiu 0,5 ponto porcentual, para 12,75%. No entanto, ela não é a utilizada para empréstimos e financiamentos voltados ao consumidor final. Portanto, os juros cobrados são muito superiores, já que os bancos embutem seu lucro, custos operacionais e riscos de não obter de volta o valor emprestado.
Segundo pesquisou o Estado de Minas, dos sete bancos, a maior taxa média no crédito pessoal é praticada pelo Bradesco, de 6,86% ao mês, de acordo com dados do Banco Central (BC). No cheque especial, o Santander é o campeão, com 13,33% mensais (veja quadro). Segundo destacou o BC, as taxas foram coletadas entre 2 e 9 de abril e podem variar, inclusive, entre agências de um mesmo banco, em um mesmo dia, dependendo da negociação feita com o representante da instituição.
Antecipar parcelas é alternativa
A economista do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) Ione Amorim destaca que a liquidação antecipada de uma operação de crédito é uma interrupção da cobrança dos juros dos meses faltantes para o término do contrato. Segundo ela, se o consumidor tiver um crédito pessoal, um parcelamento da fatura do cartão de crédito ou até mesmo se comprou um eletrodoméstico com juros e quitar o empréstimo antes, poderá ganhar mais em desconto dos juros do que com rendimentos da poupança e outras aplicações financeiras.“O desconto dos juros pode ser sete vezes maior”, alerta.
Ione explica que as taxas de juros para operações de crédito são bem superiores às taxas para remuneração de qualquer aplicação financeira porque embutem os custos administrativos, o compulsório, risco da inadimplência, impostos e lucro dos bancos. Portanto, se o consumidor tem dívidas com valores equivalentes aos recursos que tem aplicado, a quitação da dívida antecipada pode ser mais vantajosa. Ela explica que a relação é muito desproporcional: uma operação de crédito pessoal tem uma taxa mensal de 7,4% ao mês (135,53% ao ano), enquanto a taxa de remuneração da poupança é de 0,4273% (5,11% ao ano).
Podem ser liquidadas antecipadamente, com redução proporcional do saldo devedor, dívidas caracterizadas como operações de crédito ou de arrendamento mercantil contratadas com bancos, cooperativas de crédito, outras instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central, exceto administradoras de consórcios (Resolução do Banco Central nº 3.516/07, em vigor desde dezembro de 2007). Como o cálculo dos juros envolve a data em que deve ser realizada a liquidação, o consumidor deve solicitar à instituição financeira a memória do cálculo com o detalhamento do desconto das parcelas a vencer. “Os bancos não costumam entregar esse demostrativo, mas todo correntista tem direito a ele”, alerta Ione Amorim.
Bola de neve
Banco Taxa de empréstimo Taxa do cheque
(ao mês) especial (ao mês)
Banco do Brasil 4,34% 9,42%
Bradesco 6,86% 9,03%
Caixa 3,96% 8,20%
HSBC 4,64% 12,76%
Itaú 4,92% 10,16%
Safra 4,44% 9,45%
Santander 4,69% 13,33%
* Período de 2 a 9 de abril - Fonte: Banco Central