O fôlego já não é mais o mesmo. O corpo cansado é limitação suficiente para a busca de alternativas de rendas ou continuar na ativa. As portas do mercado de trabalho se fecham na mesma velocidade com que as perdas se fazem mais presentes. Em meio a tudo isso, o ano de 2015 ainda trouxe um agravante para a terceira idade brasileira: a vida mais cara. Enquanto a população em geral sofre com o aumento dos preços, para essa parcela o aperto tem sido mais intenso e é o maior dos últimos 12 anos. Para eles, que precisam de um bom plano de saúde, de alimentação adequada e, em muitos casos, de uma quantidade significativa de remédios, o dragão não perdoa e está cada vez mais feroz.
Existe no país, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 26,1 milhões de idosos, que representam 13% da população. De acordo com a última pesquisa divulgada pela Fundação Getulio Vargas (FGV), a inflação para os que têm mais de 60 anos é maior do que para o resto da população. Segundo os estudos, o Índice de Preços ao Consumidor da Terceira Idade (IPC-3i), que mede a variação de preços da cesta de compras de pessoas com mais de 60, registrou inflação de 4,16% no primeiro trimestre, a maior para o período desde 2003, quando a variação acumulada entre janeiro e março foi de 5,28%.
Para piorar o quadro, no acumulado de 12 meses, de acordo com FGV, o índice é de 8,56%, bem acima do teto da meta do governo federal, de 6,5%, e superior ao Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), do IBGE, de 8,13%, divulgado em março. “A população mais idosa pode estar passando por uma fase mais difícil do que o resto da população mais jovem”, comenta o economista do Insituto Brasileiro de Economia da FGV, André Braz. Ele diz que para os idosos a vida se complica, principalmente porque para as aposentadorias acima de um salário mínimo (R$ 788) não há um aumento real. “E ele vai tendo mais despesas e gastos cada vez maiores”, avalia.
Um item que tem peso grande no orçamento deles é o cuidado com a saúde. De cada R$ 100 gastos, em média, R$ 15 vão para pagar planos de saúde, médico e remédios. Tanto é que, aos 76 anos, Faride Serafim já dispensou as viagens deste ano. Acostumada a passear em excursões para as praias brasileiras, como Porto Seguro, na Bahia, ela diz que, com as despesas mais altas, decidiu cortar o lazer. “O dinheiro da gente não dá para comprar quase nada. Se meus filhos não me ajudam, passo aperto”, comenta. Ela conta que recebe aposentadoria e pensão, mas que, com a inflação, sua renda está totalmente comprometida com alimentação, habitação e outras contas. O que mais pesa, segundo ela, está na conta da farmácia. Faride toma 10 tipos de remédios, cerca de 20 comprimidos por dia. “Sofro de diabetes e hipertensão. Minha receita, antes, ficava em R$ 200. Hoje, está em R$ 300”, compara.
A diferença citada pela senhora veio com o reajuste dos medicamentos, que ficaram até 7% mais caros depois do dia 31 de março. Porém, essa variação não foi medida pelo IPC-3i, já que o reajuste saiu no mesmo dia em que o índice foi concluído. “O IPC-3i do segundo semestre vai avaliar esse impacto do aumento dos produtos farmacêuticos. Sabemos que os remédios comprometem, em média, 6% do orçamento dos idosos, enquanto para a população mais jovem o percentual é de 3%”, diz André Braz.
CESTA PESADA De acordo com o índice, os itens que mais pesaram na vida dos idosos no primeiro trimestre foram transportes, alimentos, despesas diversas, além de saúde e cuidados pessoais. “Apesar de muitos não pagarem ônibus, eles compram passagens para netos e filhos. E há um impacto desses valores no orçamento”, esclarece André Braz. A habitação, com altas nas faturas de energia e água, que juntas somam mais de 57% de aumento para os consumidores mineiros, é outro peso para os maiores de 60 anos. “Os mais velhos acabam ficando mais tempo em casa. Aí, o gasto com energia para manter a residência fica ainda mais caro do que para um trabalhador que sai o dia todo e só volta à noite”, compara André Braz.
Esse peso, Márcio Siqueira, de 72, sentiu bem. Segundo ele, com tudo mais caro e sem aumento na aposentadoria, ele teve que diminuir no consumo de água. “Cerca de 60% da minha renda vão para as despesas, entre elas, a habitação. As contas estão caras demais, e, além disso, há meus custos com supermercados e sacolão, que subiram mais de 20%”, lamenta. De acordo com André, é preciso somar ainda para essa parte da população os valores do plano de saúde, que tiveram reajuste de 9,65%. Na conta da FGV para o índice, que leva em consideração uma média dos planos novos e antigos, para os quais os reajustes são diferentes, a média foi de um aumento de 8%, diluídos em 12 meses. “Um plano de saúde compromete, hoje, 8% da renda de um idoso. É um peso muito grande”, avalia André Braz.
Faride reclama dos valores cobrados pelas operadoras de saúde e diz que paga R$ 500 para a empresa e não quer a ajuda dos filhos nessa fatura, porque sabe que eles têm suas contas e um valor desses iria apertá-los também. “O nosso poder de consumo está cada vez menor. Não tem como eu trabalhar nem fazer algum tipo de atividade que aumente a renda. Enquanto minha aposentadoria não sobe, tudo vai aumentando”, reclama.
Desemprego complica cenário
Vivendo melhor e mais tempo, os maiores de 60 anos no Brasil poderão enfrentar períodos ainda mais difíceis daqui pra frente, segundo comentam especialistas. O motivo é o desemprego, que está em alta no país neste ano. Com muitas pessoas sendo demitidas, de acordo com os economistas, aumentará o número de idosos que passarão a ser provedores das famílias, contando com a renda das aposentadorias para garantir a sobrevivência. “Aí, a população que deveria cuidar da velhice será cuidada por ela”, comenta Márcio Lana, economista e conselheiro do Conselho Regional de Economia.
De acordo com André Braz, da FGV, ainda que a economia não esteja crescendo e o pessimismo esteja geral no país, os idosos estão vindo de um período em que havia ainda uma taxa de desemprego menor. “Aquele filho que saiu de casa, agora pode perder o trabalho. E podem voltar a morar junto com os pais para compensar as despesas. A aposentadoria, nesses casos, passa a garantir a sobrevivência”, diz.
Segundo Márcio Lana, com o passar dos anos, as condições dessa faixa etária melhorou bastante no país. “Hoje, eles viajam de avião, buscam se alimentar melhor e fazem atividades físicas. Por isso estão vivendo mais. Porém, tudo isso vai pesando no orçamento”, diz. O especialista afirma que os idosos representam uma renda de R$ 234 bilhões por ano para o país, o que faz a economia girar. “Mas há mais gastos com assistência médica, alimentação selecionada, entre outros. O condomínio para um idoso sobe exatamente da mesma forma em que se dá o aumento dessa conta para um jovem que está no mercado de trabalho e ganha bem. O táxi também aumentou 9% e os medicamentos estão mais caros”, enumera.
Com isso, segundo Márcio, os idosos, com o poder de compra menor, vão sentindo que o país não vai nada bem. “É uma parcela da população que tem uma sensibilidade muito grande e quando vê um filho empregado e a economia bem, ele se sente mais fortalecido. O contrário vai entristecendo-o, pode gerar depressão, angústia e outros problemas. É doloroso ficar velho no Brasil”, comenta o economista, que está com 73 anos.
O aposentado Henrique Robert, de 77, concorda. Ele, que sentiu tudo aumentar, diz ter uma filha desempregada que mora com ele e, hoje, ele é o provedor da família. “A culpa é do sistema capitalista. Fui preso político na época da ditadura, lutamos pelo direito ao 13º salário e o direito à greve. Hoje, estou aposentado e, no Brasil, quem não está na ativa não é cidadão”, reclama. Aos 60, Marília de Fátima não pode parar. Há sete anos como pipoqueira em BH, ela trabalha 12 horas por dia, de segunda a segunda. “Ajudo meus filhos e não posso cruzar os braços. Tenho diabetes, pressão alta, mas, com tudo tão caro, não posso largar meu emprego. Ganho um salário mínimo como aposentada e não dá para nada. Quem consegue viver com renda assim?”, questiona.
Enquanto isso...
...Lição importante
Uma das lições mais importantes dos economistas para momentos de inflação é a pesquisa. Mas, para essa parte da população, segundo Márcio Lana, fazer levantamentos é complicado. “Nós, idosos, não temos condições de sair de farmácia em farmácia procurando o melhor preço. Muitos também não dominam a internet. É difícil ter uma mobilidade para dar capacidade de vasculhar o melhor valor de um produto nessa faixa etária”, avalia. Ele recomenda que essas pessoas com mais de 60 anos passem a anotar seus ganhos e gastos. “Medicamentos, plano de saúde e alimentação não podem ser cortados. Por isso, é anotar e ver onde se pode reduzir”, diz. Segundo André Braz, no passado, tinha-se a noção de que ao se aposentar o cidadão teria como viajar e curtir a vida. “Faltou a preparação para a saída do mercado de trabalho. Confiávamos no regime de previdência, mas o país está longe de ter um sistema ideal. Então, essa realidade dos idosos de hoje fica como lição para os jovens, que devem se preparar, agora, para o futuro, seja construindo uma poupança seja pagando uma previdência privada.”
Existe no país, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 26,1 milhões de idosos, que representam 13% da população. De acordo com a última pesquisa divulgada pela Fundação Getulio Vargas (FGV), a inflação para os que têm mais de 60 anos é maior do que para o resto da população. Segundo os estudos, o Índice de Preços ao Consumidor da Terceira Idade (IPC-3i), que mede a variação de preços da cesta de compras de pessoas com mais de 60, registrou inflação de 4,16% no primeiro trimestre, a maior para o período desde 2003, quando a variação acumulada entre janeiro e março foi de 5,28%.
Para piorar o quadro, no acumulado de 12 meses, de acordo com FGV, o índice é de 8,56%, bem acima do teto da meta do governo federal, de 6,5%, e superior ao Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), do IBGE, de 8,13%, divulgado em março. “A população mais idosa pode estar passando por uma fase mais difícil do que o resto da população mais jovem”, comenta o economista do Insituto Brasileiro de Economia da FGV, André Braz. Ele diz que para os idosos a vida se complica, principalmente porque para as aposentadorias acima de um salário mínimo (R$ 788) não há um aumento real. “E ele vai tendo mais despesas e gastos cada vez maiores”, avalia.
Um item que tem peso grande no orçamento deles é o cuidado com a saúde. De cada R$ 100 gastos, em média, R$ 15 vão para pagar planos de saúde, médico e remédios. Tanto é que, aos 76 anos, Faride Serafim já dispensou as viagens deste ano. Acostumada a passear em excursões para as praias brasileiras, como Porto Seguro, na Bahia, ela diz que, com as despesas mais altas, decidiu cortar o lazer. “O dinheiro da gente não dá para comprar quase nada. Se meus filhos não me ajudam, passo aperto”, comenta. Ela conta que recebe aposentadoria e pensão, mas que, com a inflação, sua renda está totalmente comprometida com alimentação, habitação e outras contas. O que mais pesa, segundo ela, está na conta da farmácia. Faride toma 10 tipos de remédios, cerca de 20 comprimidos por dia. “Sofro de diabetes e hipertensão. Minha receita, antes, ficava em R$ 200. Hoje, está em R$ 300”, compara.
A diferença citada pela senhora veio com o reajuste dos medicamentos, que ficaram até 7% mais caros depois do dia 31 de março. Porém, essa variação não foi medida pelo IPC-3i, já que o reajuste saiu no mesmo dia em que o índice foi concluído. “O IPC-3i do segundo semestre vai avaliar esse impacto do aumento dos produtos farmacêuticos. Sabemos que os remédios comprometem, em média, 6% do orçamento dos idosos, enquanto para a população mais jovem o percentual é de 3%”, diz André Braz.
CESTA PESADA De acordo com o índice, os itens que mais pesaram na vida dos idosos no primeiro trimestre foram transportes, alimentos, despesas diversas, além de saúde e cuidados pessoais. “Apesar de muitos não pagarem ônibus, eles compram passagens para netos e filhos. E há um impacto desses valores no orçamento”, esclarece André Braz. A habitação, com altas nas faturas de energia e água, que juntas somam mais de 57% de aumento para os consumidores mineiros, é outro peso para os maiores de 60 anos. “Os mais velhos acabam ficando mais tempo em casa. Aí, o gasto com energia para manter a residência fica ainda mais caro do que para um trabalhador que sai o dia todo e só volta à noite”, compara André Braz.
Esse peso, Márcio Siqueira, de 72, sentiu bem. Segundo ele, com tudo mais caro e sem aumento na aposentadoria, ele teve que diminuir no consumo de água. “Cerca de 60% da minha renda vão para as despesas, entre elas, a habitação. As contas estão caras demais, e, além disso, há meus custos com supermercados e sacolão, que subiram mais de 20%”, lamenta. De acordo com André, é preciso somar ainda para essa parte da população os valores do plano de saúde, que tiveram reajuste de 9,65%. Na conta da FGV para o índice, que leva em consideração uma média dos planos novos e antigos, para os quais os reajustes são diferentes, a média foi de um aumento de 8%, diluídos em 12 meses. “Um plano de saúde compromete, hoje, 8% da renda de um idoso. É um peso muito grande”, avalia André Braz.
Faride reclama dos valores cobrados pelas operadoras de saúde e diz que paga R$ 500 para a empresa e não quer a ajuda dos filhos nessa fatura, porque sabe que eles têm suas contas e um valor desses iria apertá-los também. “O nosso poder de consumo está cada vez menor. Não tem como eu trabalhar nem fazer algum tipo de atividade que aumente a renda. Enquanto minha aposentadoria não sobe, tudo vai aumentando”, reclama.
Desemprego complica cenário
Vivendo melhor e mais tempo, os maiores de 60 anos no Brasil poderão enfrentar períodos ainda mais difíceis daqui pra frente, segundo comentam especialistas. O motivo é o desemprego, que está em alta no país neste ano. Com muitas pessoas sendo demitidas, de acordo com os economistas, aumentará o número de idosos que passarão a ser provedores das famílias, contando com a renda das aposentadorias para garantir a sobrevivência. “Aí, a população que deveria cuidar da velhice será cuidada por ela”, comenta Márcio Lana, economista e conselheiro do Conselho Regional de Economia.
De acordo com André Braz, da FGV, ainda que a economia não esteja crescendo e o pessimismo esteja geral no país, os idosos estão vindo de um período em que havia ainda uma taxa de desemprego menor. “Aquele filho que saiu de casa, agora pode perder o trabalho. E podem voltar a morar junto com os pais para compensar as despesas. A aposentadoria, nesses casos, passa a garantir a sobrevivência”, diz.
Segundo Márcio Lana, com o passar dos anos, as condições dessa faixa etária melhorou bastante no país. “Hoje, eles viajam de avião, buscam se alimentar melhor e fazem atividades físicas. Por isso estão vivendo mais. Porém, tudo isso vai pesando no orçamento”, diz. O especialista afirma que os idosos representam uma renda de R$ 234 bilhões por ano para o país, o que faz a economia girar. “Mas há mais gastos com assistência médica, alimentação selecionada, entre outros. O condomínio para um idoso sobe exatamente da mesma forma em que se dá o aumento dessa conta para um jovem que está no mercado de trabalho e ganha bem. O táxi também aumentou 9% e os medicamentos estão mais caros”, enumera.
Com isso, segundo Márcio, os idosos, com o poder de compra menor, vão sentindo que o país não vai nada bem. “É uma parcela da população que tem uma sensibilidade muito grande e quando vê um filho empregado e a economia bem, ele se sente mais fortalecido. O contrário vai entristecendo-o, pode gerar depressão, angústia e outros problemas. É doloroso ficar velho no Brasil”, comenta o economista, que está com 73 anos.
O aposentado Henrique Robert, de 77, concorda. Ele, que sentiu tudo aumentar, diz ter uma filha desempregada que mora com ele e, hoje, ele é o provedor da família. “A culpa é do sistema capitalista. Fui preso político na época da ditadura, lutamos pelo direito ao 13º salário e o direito à greve. Hoje, estou aposentado e, no Brasil, quem não está na ativa não é cidadão”, reclama. Aos 60, Marília de Fátima não pode parar. Há sete anos como pipoqueira em BH, ela trabalha 12 horas por dia, de segunda a segunda. “Ajudo meus filhos e não posso cruzar os braços. Tenho diabetes, pressão alta, mas, com tudo tão caro, não posso largar meu emprego. Ganho um salário mínimo como aposentada e não dá para nada. Quem consegue viver com renda assim?”, questiona.
Enquanto isso...
...Lição importante
Uma das lições mais importantes dos economistas para momentos de inflação é a pesquisa. Mas, para essa parte da população, segundo Márcio Lana, fazer levantamentos é complicado. “Nós, idosos, não temos condições de sair de farmácia em farmácia procurando o melhor preço. Muitos também não dominam a internet. É difícil ter uma mobilidade para dar capacidade de vasculhar o melhor valor de um produto nessa faixa etária”, avalia. Ele recomenda que essas pessoas com mais de 60 anos passem a anotar seus ganhos e gastos. “Medicamentos, plano de saúde e alimentação não podem ser cortados. Por isso, é anotar e ver onde se pode reduzir”, diz. Segundo André Braz, no passado, tinha-se a noção de que ao se aposentar o cidadão teria como viajar e curtir a vida. “Faltou a preparação para a saída do mercado de trabalho. Confiávamos no regime de previdência, mas o país está longe de ter um sistema ideal. Então, essa realidade dos idosos de hoje fica como lição para os jovens, que devem se preparar, agora, para o futuro, seja construindo uma poupança seja pagando uma previdência privada.”