A vendedora Alexandra Toledano voltou para casa feliz na tarde de ontem, depois de conseguir economizar cerca de R$ 250 nas compras do pet shop para seus quatro cachorros. O estoque de tapete higiênico e de ração foi reforçado para os próximos meses e o total da conta, de R$ 648,60, baixou para R$ 398,62, quando descontado os 39,24% do imposto sobre o tapete higiênico e os 41,26% incidentes sobre a ração. Ontem, os estabelecimentos de Belo Horizonte e de Montes Claros, no Norte de Minas que adotaram a campanha do Dia da Liberdade de Impostos amanheceram com fila na porta, com consumidores que esperavam para comprar produtos mais baratos, livres da carga tributária. No posto de combustíveis Pica Pau, que vendeu o litro da gasolina a R$ 1,93 na capital, a fila começou ainda na noite de quarta-feira, por volta das 18h30.
O “desconto”, correspondente aos tributos, na verdade, foi concedido como forma de protesto, como parte das ações do Dia Liberdade de Impostos, promovido pela Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL-BH) e o Centro de Desenvolvimento Lojista Jovem (CDL Jovem), em parceria com o Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo no Estado de Minas Gerais (Minaspetro). O objetivo, segundo as entidades, era mostrar para os brasileiros que o país tem uma das cargas tributárias mais altas do mundo. Segundo estudo elaborado pelo Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) sobre os Dias Trabalhados para Pagar Tributos, o brasileiro trabalha 151 dias somente para pagar impostos. Ou seja, durante cinco meses completos, o valor equivalente ao salário dos trabalhadores é destinado ao governo, para pagar as taxas e contribuições. Dessa forma, só a partir do dia primeiro de junho é que o brasileiro passa a trabalhar em benefício próprio.
Para Alexandra, que economizou quase R$ 250 na compra do pet shop, a carga tributária brasileira deveria ser revista. Segundo ela, os altos valores cobrados pelo governo diminuem o poder de compra das famílias, que não veem o retorno desse dinheiro. “Não temos nenhum sistema operado pelo governo que seja eficaz. Saúde, educação, segurança e infraestrutura estão sucateados e a gente não sabe para onde vai o nosso dinheiro”, afirmou. A opinião da vendedora é compartilhada pelo professor Paulo Roberto Marques, de 35 anos, que ficou na fila do posto de gasolina desde as 6h até as 10h para abastecer com a gasolina mais barata. “Vale a pena ficar esse tempo e conseguir economizar quase R$ 50. Se o Brasil tivesse uma carga tributária alta, mas aplicasse os recursos de forma correta, eu não me importaria de ter que pagar os impostos. O problema é que o governo não emprega bem o dinheiro e nós não sabemos o que é feito dele”, ressaltou.
Presidente do Minaspetro, Carlos Guimarães Júnior, acredita que o protesto alcançou seu objetivo, que era alertar os consumidores sobre o verdadeiro vilão por trás dos altos preços praticados no comércio. “Com essa ação, fica claro para a população que não são os empresários que estão praticando preços abusivos. A carga tributária do país chega a representar mais de 40% do preço do produto. É importante que o consumidor saiba disso e cobre do governo a aplicação correta desse recurso”, declarou. Para o presidente da CDL Jovem, Frederico Papatella, a ação chega reforçada nessa 9ª edição, com mais empresários empenhados na conscientização da população sobre os tributos. “Já conseguimos chamar a atenção do consumidor, mas ainda falta a contrapartida do governo, que deve fazer uma revisão desses valores para menos, e não para mais, como pretende o atual ministro da Fazenda, Joaquim Levy”, disse.
INTERIOR Em Montes Claros, no Norte de Minas, o posto também amanheceu com fila de consumidores para comprar gasolina a R$ 1,94 o litro, sendo que o preço do litro do produto no mesmo estabelecimento, com impostos, é R$ 3,25. A fonoaudióloga Maria Rosimar Assis Natalino entrou na fila para abastecer seu carro com a gasolina sem impostos e enalteceu a importância do protesto. “É preciso que ações desse tipo aconteçam em outros setores, como de alimentos, por exemplo. O governo precisa ser conscientizado de que o país tem um excesso de impostos, que o povo não aguenta pagar”, reclamou Maria Rosimar.
Também na fila, o motorista Girvandro Lopes salientou que o protesto contra a alta dos impostos ocorre num momento oportuno, em que a população luta também contra a corrupção. “Infelizmente, quem paga pela corrupção é o povo mais fraco”, lamentou. O diretor da CDL Jovem de Montes Claros, Felipe Santos, ressaltou que o movimento teve o objetivo de chamar atenção para a elevada carga tributária no Brasil, que supera 40%. “O nosso movimento não tem caráter político. O objetivo é sensibilizar as pessoas para a grande carga de tributos que pagamos. Uma pesquisa feita em 30 países mostrou que o Brasil é o último colocado no retorno dos impostos em serviços para a população”, disse Felipe.
Economia fraca derruba arrecadação
Brasília – As receitas federais com impostos e contribuições somaram R$ 109,2 bilhões em abril, redução real de 4,6% em relação a abril de 2014, informou ontem a Receita Federal. É o pior resultado para o mês desde 2010. Nos quatro primeiros meses do ano, a arrecadação foi de R$ 418,6 bilhões, desempenho 2,7% inferior a período equivalente do ano passado.
O resultado fraco reflete a anemia da atividade econômica, prejudicada pela queda das vendas de bens e serviços, da produção industrial. Também concorreu para esse desempenho a dificuldade do governo em aprovar seu pacote de ajuste fiscal.
Em abril, a retração na arrecadação de tributos incidentes sobre o faturamento das empresas foi crucial para o desemp enho. O recolhimento de imposto de renda recuou quase R$ 2 bilhões ante abril do ano passado. A CSLL caiu R$ 1,4 bilhão.
O resultado do mês abarca alguns aumentos de impostos feitos pela equipe econômica de Dilma Rousseff, como IOF sobre empréstimo a pessoas físicas e taxação de combustíveis. No entanto, essa elevação foi parcialmente anulada pelo momento econômico, com menos pessoas tomando dinheiro emprestado e a redução no consumo de combustível.
DESONERAÇÕES Enquanto o governo não consegue ter a redução de sua política de desonerações aprovada pelo Congresso, o benefício tem comprometido uma parcela grande de tributos que poderiam reforçar o caixa neste momento de ajuste.
De janeiro a abril, R$ 38,3 bilhões deixaram de ser recolhidos pelo governo em função das desonerações, que no primeiro governo Dilma foram adotadas para estimular a economia e a manutenção de empregos. Esse valor é 20% maior que no mesmo período do ano passado
Só a desoneração da folha de pagamentos, que o governo tenta atenuar, custou R$ 7,4 bilhões nesses quatro meses. Em período semelhante de 2014, esse valor foi 21,7% menor.