Brasília – Se a retração que o país enfrenta já assusta, é bom que os brasileiros se preparem para mais dificuldades. O Comitê de Política Econômica (Copom) do Banco Central (BC) elevou, ontem, em 0,5 ponto percentual para 14,25% ao ano a Selic, taxa básica de juros do país, que remunera os títulos do governo no mercado financeiro e serve de referência para as operações nos bancos e no comércio. Trata-se da sétima alta seguida e do maior patamar desde agosto de 2006, portanto em nove anos. O Copom sinalizou que não pretende promover novos aumentos. O Brasil já tinha e mantém a maior taxa de juros do mundo.
A decisão de elevar a Selic, sem viés, foi unânime entre os integrantes do Copom que participaram da reunião. Houve, porém, uma ausência, a do diretor de Assuntos Internacionais, Tony Volpon, que se absteve, algo inédito. Em comunicado ao presidente do BC, Alexandre Tombini, ele disse que tomou a decisão “a fim de evitar possíveis prejuízos à imagem do Banco Central do Brasil, sendo essa decisão em caráter irrevogável”.
Declarações de Volpon foram consideradas antecipação de seu voto no Copom. Ontem, o líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), disse que Volpon deveria ser demitido caso não se explicasse. Ele prestou esclarecimentos à diretoria do BC, que considerou os argumentos convincentes, mas recomendou, em ata, que os membros do Copom “redobrem a natural e reconhecida cautela em suas manifestações”.
A segunda parte do encontro dos integrantes do Copom começou às 17h10 e durou até 20h50, mais do que o habitual. “O Comitê entende que a manutenção desse patamar da taxa básica de juros, por período suficiente prolongado, é necessária para a convergência da inflação para a meta no final de 2016 “, afirmou por meio de nota depois da reunião.
Para os analistas de bancos e corretoras, isso significa que essa alta encerra um ciclo e que a taxa ficará nesse patamar até começar a cair no próximo ano. “Não há outra conclusão possível”, disse o ex-diretor do BC Alexandre Schwartsman. Havia muito pressão para que mesmo a alta de ontem não ocorresse, mas a autoridade monetária considerou-se sem alternativas diante do avanço do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que acumula variação de 8,89% em 12 meses até junho, bem acima do teto da meta, de 4,5% com tolerância de dois pontos para cima ou para baixo.
Decisão esperada, mas criticada
A última elevação da Selic ocorreu em junho, quando passou de 13,25% para 13,75%. Para economistas e empresários, a decisão não foi surpreendente, ainda que, na avalição de alguns deles, não seja o melhor para o país neste momento. Como já era esperado, a nova elevação desagradou, num cenário de economia paralisada, a indústria e o comércio. O presidente da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), Olavo Machado Júnior, critica a medida num momento de negócios, empregos e confiança abalados, além da previsão de queda do Produto Interno Bruto (o PIB, conjunto da produção de bens e serviços do país). “Já passou da hora de parar com os aumentos da Selic”, afirmou em nota divulgada na noite de ontem.
O presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH), Bruno Falci, diz reconhecer a importância de o país conter o avanço da inflação, mas considera o instrumento da elevação da Selic muito negativo para o comércio varejista. “Sabemos que juros mais altos são sinônimos de redução de consumo, e o ciclo de elevações da Selic, iniciado em outubro de 2014, já vem surtindo efeitos negativos no varejo da capital mineira”, afirma.
Eduardo Velho, economista-chefe da INVX Global Partners, disse que a decisão está em linha com o discurso do BC. “Se não tomassem essa decisão, correriam o risco de perder a credibilidade”, afirmou. Segundo Velho, a alta foi reforçada com a decisão do governo de reduzir a meta de superávit fiscal de 1,1% do Produto Interno Bruto (PIB) para 0,15%, anunciada na semana passada. Recursos poupadas dessa economia para o pagamento dos juros da dívida pública seriam destinados a consumo e investimentos, pressionando a inflação.
Houve, porém, reações mais fortes. “Nunca vi essa combinação de recessão e política monetária agressiva. Só na Grécia. A diferença é que no caso do Brasil, não são instituições externas que estão obrigando o país a fazer isso. A troica (Banco Central Europeu, Fundo Monetário Internacional e União Europeia) é daqui mesmo”, disse Luiz Gonzaga Belluzzo, professor de economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Ele critica o aumento da Selic por reduzir a atividade econômica e as perspectivas de investimento.