Brasília – Com base nas estimativas de analistas de bancos e corretoras, o Brasil deverá registrará, entre 2015 e 2016, o mais longo período de retração da economia dos últimos 50 anos. Entre os especialistas, as apostas mais pessimistas são de até 11 trimestres seguidos de contração do Produto Interno Bruto (o PIB, conjunro da produção de bens e serviços do país), em relação ao mesmo período do ano anterior, o que dará ao governo Dilma Rousseff o título de maior insucesso desde a redemocratização do país. Para este ano, as expectativas são de queda de 1,8% do PIB.
Segundo Ivo Chermont, economista-chefe da Itaim Asset, com a esperada queda entre abril e junho deste ano, já serão cinco os trimestres de recuo da atividade econômica. “Olhando para a frente, é difícil imaginar recuperação tão cedo da economia”, diz. O recorde que pode ser quebrado foi registrado entre 1981 e 1983, quando o Brasil computou nove trimestres consecutivos de retração, acumulando, no período, perdas de 8,5% que deram início às duas décadas perdidas da qual a população se ressente até hoje.
Boa parte da fatura contratada por Dilma tem relação com o estrangulamento das contas públicas, que detonou desconfiança sem precedentes no país. Para elegê-la, seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva, pisou no acelerador dos gastos. Esperava-se que, com a posse da petista, a responsabilidade fiscal voltasse ao radar, mas o que se viu foi descontrole, abuso da contabilidade criativa e das famosas “pedaladas fiscais”, que estão sendo questionadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
O quadro é tão dramático que o rombo do setor público chegou a 8,12% do PIB, ou seja, R$ 462,7 bilhões, no acumulado dos 12 meses terminados em junho último. Quando assumiu o poder, Dilma herdou um déficit nominal de R$ 93,7 bilhões e não se intimidou em quase quadruplicá-lo. Não à toa, o Brasil sofre a ameaça de perder o grau de investimento, uma espécie de selo de bom pagador, dado em 2008 pela agência de classificação de risco Standard & Poor’s.
Para o economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, perante o que se vê hoje nas contas públicas, o Brasil terá que fazer uma revolução, a cargo do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que tem se esforçado em conversas com investidores e parlamentares no Congresso para vender o ajuste fiscal proposto pelo governo. A promessa de uma arrumação rápida na casa não se confirmar, diante da resistência encontrada no Congresso Nacional. Na melhor das hipóteses, a expectativa é que a melhoria das contas só apareça em 2018, quando o superávit primário, a economia para pagamento de juros da dívida pública, chegaria a 2% do PIB. Em 2015, a promessa é de um saldo positivo de 0,15%, podendo haver déficit de até 0,3% do PIB, o correspondente a R$ 17,7 bilhões.
“O governo tem que apresentar um plano de redução de despesas de custeio muito ousado para conseguir fazer caixa, não ficar apenas pensando em aumento de receitas. Mas é difícil imaginar o que poderá conseguir, pois o país perdeu a confiança e qualquer plano que seja apresentado talvez não tenha eficácia esperada”, afirma Agostini, que vê a dívida pública ameaçando superar os 70% do PIB.
Piora Na opinião de Simão Davi Silber, professor do Departamento de Economia da Universidade de São Paulo (USP), o que ocorreu foi uma longa deterioração na área fiscal, sem que o governo demonstrasse qualquer sinal de preocupação. “Muito pelo contrário. Começou a enfeitar os números com a contabilidade criativa e finalizou com as pedaladas. Foi uma irresponsabilidade fiscal gigantesca”, afirma. No entender dele, são grandes as chances de o país perder o selo de bom pagador.
Corte de investimentos é pior via
O governo vem fazendo o ajuste fiscal por meio de corte de investimentos, que é a pior forma de acertar as contas, já que agrava a retração econômica, observa o especialista em contas públicas Mansueto Almeida. Somente no primeiro semestre, a tesourada foi de 36%. “Além disso, a conta de juros está cada vez mais alta (7,32% do PIB), e isso vem ajudando a piorar o resultado primário – a economia que o governo precisa fazer para garantir o pagamento dos encargos financeiros e segurar o aumento da dívida pública. O único gasto que está sendo controlado é o de investimentos. O crescimento real das despesas de 0,5% é baixo, mas o problema é que as receitas caíram mais de 3%. Essa combinação ainda é muito ruim”, destaca.
Na avaliação de Almeida, o ajuste fiscal proposto por Levy vem sendo feito, mas na margem. “O quadro fiscal piorou muito. A recuperação da economia será muito mais lenta do que se esperava”, diz. Para o economista Amir Khair, o ajuste não deve funcionar porque não há uma estratégia de retomada do crescimento. “O governo conseguiu uma façanha. A dívida pública vai bater em 70% do PIB e isso é resultado de dois abusos: mandar mais de R$ 400 bilhões para o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) sem que houvesse crescimento da economia”, critica Khair.
Entre os analistas, há projeções de uma redução de 10% em termo reais, do volume de investimentos no país neste ano, na comparação com 2014. A perspectiva é de que deixem de ser aportados R$ 110 bilhões na economia em 2015. O relatório Focus, que consolida as previsões de economistas de bancos e corretoras para os principais indicadores, apontou ontem que a taxa Selic, aquela que remunera os títulos do governo no mercado financeiro e serve de referência para as operações nos bancos e no comércio, encerrará o ano em 14,25%, depois de o Comitê de Política Monetária (Copom) ter afirmado que a manutenção desse patamar, por período suficientemente prolongado, será capaz de fazer a inflação convergir para a meta, de 4,5%, no fim de 2016.