A crise econômica que atinge praticamente todos os setores da economia não excluiu a alimentação fora de casa. Nos cálculos do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Belo Horizonte (Sindhorb), este ano, cerca de 500 estabelecimentos, somando desde os pequenos bares e lanchonetes até casas de maior porte, fecharam as portas na capital. Nessa conta, também entram diversos restaurantes tradicionais, voltados para as classes A e B, em regiões como Centro-Sul, Oeste e Pampulha.
De abril a agosto, pelo menos 10 casas encerraram suas atividades, incluindo espaços para comida internacional, contemporânea, vinhos, pizzaria. A maioria deles na região Centro-Sul. Sem citar números para 2015, Lucas Pêgo, diretor-executivo da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), observa que é alto o percentual de empresas brasileiras que encerram suas atividades no primeiro ano de vida: no setor, chega a 27%. “O que nos preocupa é o fechamento de casas tradicionais ou consolidadas, com gestão habilidosa”, comenta o executivo.
O Estado de Minas conversou com alguns empresários que fecharam o ponto comercial recentemente. Os motivos são diversos, mas, de modo geral, a queda do movimento acaba sendo fator comum e decisivo. Depois de sete anos funcionando no Bairro de Lourdes, o restaurante Ficus, especializado em cozinha contemporânea, funcionou pela última vez no mês passado.
Questões antigas que pesam nos custos do setor, como a carga tributária, preço dos aluguéis, mão de obra, até a Lei Seca, foram agravados pela redução do emprego, inflação em alta e pela menor confiança do brasileiro, que acompanha a alta da inflação e com isso está reduzindo gastos. No aperto, o consumidor economiza nas saídas ou muda de hábitos, dividindo os restaurantes com espaço de menor custo, como os espetinhos, por exemplo. Lucas Pêgo reforça também um desafio do setor formal. Segundo ele, em Belo Horizonte, 50% dos estabelecimentos do setor, estimados em mais de 18 mil, são informais.
A concorrência dos informais e até da comida de rua, sem regulamentação, pesam ainda mais nos momentos de menor crescimento da economia. Há nove anos na Pampulha, o restaurante Matusalem funcionou pela última vez no domingo. O proprietário Matusalem Gonzaga diz que está partindo para novos projetos. O que o fez mudar o rumo? Um conjunto de fatores. Além dos encargos do setor, das dificuldades para formar funcionários, da conjuntura econômica e política do país, as obras que fecharam a avenida Pedro I, depois da queda do viaduto em obras para a Copa do Mundo, deixou o restaurante ilhado. “Foram 41 dias sem receber um cliente. Não há negócio que suporte nada parecido.” Desde então o movimento da casa chegou a cair 60%. Apesar dos desafios, Matusalém está otimista com o mercado, estudando agora novo negócio no ramo.
DEMISSÕES
Paulo César Pedrosa, presidente do Sindhorb, diz que a expectativa é que Belo Horizonte ganhe força no turismo de negócios para atrair eventos, o que pode movimentar parte do setor que enfrenta baixa demanda. Segundo ele, o sindicato dos trabalhadores da categoria no último mês, homologou perto de 200 demissões por semana.
Segundo dados da Abrasel diante da atual panorama econômico do país, o consumidor vem mudando o seu perfil de consumo, mas a alimentação fora de casa continua sendo a opção. A cada 10 refeições do brasileiro, quatro são fora do lar. No primeiro trimestre de 2015 (últimos dados disponíveis) o faturamento do setor caiu em média 2,3% na comparação com o último trimestre de 2014. “Os estabelecimentos com tíquete médio abaixo de R$ 15 aumentaram o faturamento”, comenta.
Também em Lourdes, o Restaurante Atlantico, especializado em pratos com peixes e frutos do mar, encerrou suas atividades depois de sete anos no mercado. O proprietário da casa, Tomaz Gomide diz que economia do país cria empecilhos para todos os setores. Desde o mês passado, ele decidiu fechar o restaurante para focar em seus dois outros negócios, também no ramo da alimentação, o francês Gomide e a parrilla L’Entrecôte, que estão com bom desempenho. “A parrilha tem um custo-benefício muito bom para o consumidor”, observa.
Outros estabelecimentos como Oak Wine Bar, no Lourdes, Copa Bistrô, na Savassi, Pizzaria Perfetta, no Sion, Exclusivo Choperia, no Gutierrez Dom Pasquale e Social Bar, no Funcionários, são exemplos de casas que encerraram suas atividades nos últimos meses na capital.
BUFÊ ESCASSO
As festas e eventos corporativos também estão com menor demanda. João Teixeira, presidente do Sindicato dos Bufês de Belo Horizonte e Região Metropolitana (SindBufê), diz que a expectativa é de 10% queda no faturamento do setor em 2015, na comparação com o ano anterior. Ele comenta que o setor também sofre a desaceleração da atividade econômica. Recentemente o tradicional Bufê Faleiro, associado ao sindicato, encerrou suas atividades no setor de eventos, mantendo apenas o comércio de produtos direto aos seus consumidores. As opções do setor têm sido baratear os custos com criatividade, produtos de época e substituição de itens muito caros. “Com essas medidas é possível deixar o contrato entre 15% e 20% mais barato”, diz Teixeira.
Água no chope
Além dos efeitos da recessão, os donos de bares de Belo Horizonte têm mais um motivo para se preocupar. Projeto de lei aprovado em segundo turno pela Câmara Municipal proíbe bares e restaurantes de colocar mesas e cadeiras na rua depois das 23h. O texto está sob análise do prefeito Marcio Lacerda (PSB). Segundo estabelecimentos comerciais, se aprovado, o projeto pode agravar a situação do setor, com o fechamento de milhares de bares. A proposta define punições de até R$ 30 mil para quem desrespeitar a regra.
Autor do projeto de lei, o vereador Leonardo Mattos (PV) justifica ter recebido denúncias de moradores que sofrem com o desrespeito à Lei do Silêncio, além de ter sido vítima do problema. Por outro lado, a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes em Minas Gerais (Abrasel-MG) considera a lei uma generalização que põe no mesmo pacote estabelecimentos que cumprem e descumprem as regras da Lei do Silêncio.
“Se o problema é barulho, que se cumpra a Lei do Silêncio. Muitos bares dependem do uso das calçadas”, afirma o presidente da entidade, Fernando Júnior. Em cálculo da entidade, o fechamento de 1 mil bares na cidade pode resultar em perda de receita de aproximadamente R$ 360 milhões por ano.
Na avaliação do gerente do bar Chopp da Fábrica, Júnior Augusto, a rua é o lugar mais visado pelos clientes. “É o lugar que enche primeiro. É mais arejado, mais visível. No calor, o cliente prefere, por ser mais refrescante”, afirma. Segundo ele, a legislação pode cortar parte considerável da receita do estabelecimento, que, sexta e sábado, funciona até 6h. “Prejudica muito a visibilidade da casa. O cliente passa na rua, vê o movimento e decide entrar”, afirma Augusto.