O diretor executivo da Fitch, Rafael Guedes, afirmou nesta quinta-feira, depois que a agência internacional rebaixou o Brasil, que a questão política apresentada pelos analistas do país para reduzir a nota soberana "demonstra a dificuldade que o governo está tendo em passar as medidas que são necessárias para restabelecer um equilíbrio macroeconômico e fiscal".
"A notícia má é a perspectiva negativa", comentou Guedes, ao subir inesperadamente no palco do evento que já havia participado mais cedo, em São Paulo. "A perspectiva mostra que há chance maior do que 50% de o País ser rebaixado num período de até 24 meses", disse.
E o rating sendo rebaixado resultaria, segundo ele, no grau especulativo do Brasil por duas agências de classificação, o que poderia levar o país a "perder elegibilidade para investidores institucionais". Para jornalistas logo depois, Guedes destacou que os analistas de rating soberano "geralmente gostam de resolver de 12 a 18 meses", sobre uma reavaliação de nota de um país analisado.
"O relógio começou a contar a partir de hoje. Em no máximo 12 meses terá que ocorrer outro comitê", apontou Guedes. "A nota de hoje reflete nossa expectativa quanto à capacidade de pagamento que um investidor, alguém que esteja comprando título do Brasil, tenha seu investimento pago num período de até 5 anos", definiu.
Ambiente negativo
O diretor executivo da Fitch disse também que o "ambiente político e econômico é muito negativo", o que indica um cenário conturbado no curto prazo que coloca pressão sobre a nota soberana do País. "O Brasil tem dinâmica de dívida desafiadora. Há também questões sobre o baixo crescimento", destacou.
"Com o desafio político exacerbado, o cenário para a dívida (bruta) pode não ser atingido", apontou Guedes. Segundo ele, a redução da nota do país "não deveria ser uma surpresa" depois do que falou na sua primeira palestra, logo cedo.
Nessa participação, Guedes destacou que a agência previa que a dívida bruta como proporção do PIB atingiria 66% neste ano, 69,5% em 2016 e 71% em 2017. Para o diretor da Fitch, há projeções de analistas de mercado segundo as quais a dívida bruta poderia chegar a 80% do PIB em 2018, o que seria o dobro do patamar registrado por países que têm o rating no mesmo nível do Brasil.
Agravamento
Guedes afirmou que, se a situação política levar a riscos maiores do que o esperado pela agência para a dinâmica da dívida pública, o rating soberano poderia ser revisto mais rapidamente. "O que nossos analistas certamente vão olhar é se há paralisia do governo", comentou.
Questionado sobre um eventual impeachment, ele disse que isso não configuraria um evento de crédito, ou seja, não tem implicações automáticas e diretas sobre o rating, mas é preciso analisar o que aconteceria no dia seguinte. "O impeachment é negativo porque leva a uma parada no governo. Com ou sem impeachment, o fato de não se fazer nada é negativo", afirmou.
O representante da Fitch negou que a perspectiva negativa atribuída para o rating - fato que não estava inteiramente precificado pelos mercados financeiros - seja uma forma de pressionar o governo. "Nós nunca agimos politicamente, só damos uma opinião técnica", argumentou.
Ele comentou que um dos pontos positivos observados recentemente pela agência é que o governo tomou consciência da necessidade de agir não só no lado da receita, mas também no âmbito da despesa, incluindo a Previdência. "O governo começa seriamente a pensar em fazer medidas de contenção de despesas, inclusive no lado da Previdência, e isso é absolutamente necessário."
Reservas elevadas
O diretor executivo da Fitch afirmou que as grandes reservas internacionais do Brasil são um dos fatores que justificam a manutenção do País no grau de investimento. Questionado se a possibilidade de o governo usá-las para intervenção no câmbio poderia enfraquecer esse pilar, ele disse não acreditar nisso.
"As reservas do Brasil são um amortecedor gigantesco, é um fator extremamente positivo e tem sustentado o rating no grau de investimento. Não esperamos que o governo use as reservas. Eles têm sido claros que a intervenção no câmbio nunca é com o dólar em si, e sim com instrumentos liquidados em reais", comentou.
Guedes avaliou que as contas externas do Brasil devem melhorar este ano, mas, ao mesmo tempo, o rombo na conta corrente não é mais financiado 100% pelo investimento estrangeiro direto (IED), como acontecia até alguns anos atrás. "É um desafio para 2016, porque agora depende de investimento de portfólio, que é uma qualidade menos robusta de cobrir o déficit externo", explicou.