São Paulo, 16 - A diretora de ratings soberanos da América Latina da Fitch, Shelly Shetty, afirmou nesta sexta-feira, 16, que os riscos de um impeachment da presidente da República, Dilma Rousseff, aumentaram desde abril, quando a agência havia reafirmado a nota do País, mas que esse ainda não é o cenário base. A declaração foi dada durante teleconferência para explicar os motivos que levaram ao rebaixamento do Brasil na quinta-feira, 15, para BBB-, o último nível ainda dentro da faixa de grau de investimento. Ela explicou que a atual perspectiva negativa da nota já captura parte das incertezas políticas e, assim, a possibilidade de impeachment.
"No caso de um impeachment se concretizar, nós estaríamos em um território desconhecido e seria preciso analisar as implicações para as políticas econômicas", comentou Shelly.
Ela acrescentou que, quanto mais longo for esse eventual processo de impeachment, maiores seriam as incertezas e o Congresso ficaria paralisado, focado somente nisso e sem conseguir votar medidas importantes para o ajuste fiscal. "Seria preciso ver como o Brasil emergiria desse cenário, porque a situação (fiscal) pode ficar pior durante esse processo e gerar desafios ainda maiores para o eventual novo presidente", comentou.
Questionada pelo Broadcast (serviço de notícias em tempo real da Agência Estado) sobre os constantes rumores de saída do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e as recentes declarações do ex-presidente Lula contra o ajuste fiscal, Shelly disse que o ministro tem credibilidade e um papel importante no programa de ajuste.
"Os ratings tendem a se focar mais na performance econômica e fiscal (não nas pessoas). Se Levy sair, analisaríamos como seria o novo ambiente político, quais seriam as orientações para as políticas econômicas, o ritmo do ajuste", explicou Shelly Shetty.
A diretora da Fitch afirmou que, quando um País recebe perspectiva negativa, normalmente a situação se resolve entre 12 e 18 meses, mas que a agência vai continuar monitorando de perto o Brasil. "O intervalo desde a nossa última ação de rating (em abril) foi menor que esse prazo e a gente sabe que a situação do Brasil é bastante dinâmica", comentou.
Ela lembrou que o Brasil foi rebaixado na quinta por conta da deterioração macroeconômica mais rápida que o esperado, com uma piora fiscal e as incertezas políticas. "A esta altura é difícil ser otimista sobre mudanças no curto prazo no Brasil", comentou.
Shelly disse que o governo tem prometido voltar a um superávit primário este ano - após o déficit do ano passado - mas que existem riscos materiais para essa meta, até porque muitas medidas precisam de apoio do Congresso.
A Fitch estima que o resultado primário este ano ficará negativo em 0,2% do PIB, seguido de um orçamento equilibrado em 2016. "Nossa perspectiva negativa para o rating aponta que existem riscos de baixa para as projeções econômicas e fiscais", acrescentou a diretora.
Segundo ela, a dívida bruta vai continuar crescendo nos próximos anos, a menos que haja um superávit maior ou crescimento mais acelerado. "A dívida deve crescer para quase 70% no próximo ano", apontou.
Reservas internacionais
Shelly Shetty afirmou ainda que as grandes reservas internacionais do Brasil são um dos fatores que ajudam a manter o País no grau de investimento. Questionada se o possível uso das reservas pelo Banco Central para intervir no câmbio enfraqueceria esse pilar, ela disse que seria preciso avaliar a situação.
"As reservas são grandes e o Banco Central tem mostrado grande preocupação em não vender dólares no mercado à vista ainda. Eles têm dito que o câmbio tem um papel importante no processo de ajuste externo e que os swaps e os leilões de linha ajudam a manter a estabilidade financeira", comentou a diretora. "Nosso cenário base é que essa estratégia deve continuar e assim acreditamos que as reservas devem ficar relativamente estáveis. Se houver uma redução material nas reservas, teremos de analisar", acrescentou.
CPMF
Shelly disse também que o cenário-base da agência não incorpora a aprovação da CPMF, até porque existe uma grande resistência do Congresso. Esse é um dos motivos pelos quais a Fitch não espera um superávit primário para o próximo ano. "Mesmo assim, precisamos analisar o que o governo vai fazer na ausência dessa receita, pois é uma fonte importante de recursos para 2016", disse.
Ela comentou que não vê grandes movimentos do governo para encontrar outras fontes significativas de receita e apontou que o projeto para repatriação de recursos no exterior dificilmente será aprovado rapidamente pelo Congresso. "Mas é algo que poderia aliviar os céus políticos, gerar receitas para o próximo ano."
Questionada sobre os rumores de que o governo pode anunciar em breve uma nova redução na meta de superávit para este ano, Shelly explicou que, nesse caso, a agência teria de avaliar a situação, mas que a Fitch já prevê um déficit de 0,2% do PIB em 2015. "O essencial é como fica a situação de 2016 para frente", pontuou.