Morada Nova de Minas e Fama – Na região Central do estado, às margens do lago de Três Marias, os peixes estão morrendo de calor. A temperatura da água já chegou a atingir 31 graus, bem acima dos 26 considerados ideais para os pescados. Por dia, os piscicultores medem a mortandade em toneladas. O terceiro ano consecutivo de estiagem no estado está secando os lagos e esquentando a água. Em busca de água e oxigênio para os peixes, piscicultores se tornam nômades, migrando seus tanques de tempos em tempos.
O nível crítico da represa de Três Marias, que até o fechamento desta reportagem estava em 14% de seu volume, já fez até o porto da balsa, que leva a Morada Nova de Minas, mudar de lugar, já que seu ponto original de embarque secou. Quem chega ao pequeno município, de 10 mil habitantes, pode atingir pontos da represa de Três Marias pela ponte do Rio Sucuruí. A paisagem é um aviso do que vem pela frente. O pouco que sobrou do espelho d’água pode ser visto do lado direito da travessia. Debaixo da ponte, só terra esturricada, carcaças de animais e uma paisagem desértica, onde a erosão abre fendas na terra batida.
Morada Nova de Minas, segundo dados da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), é o maior produtor de peixes da região de Três Marias, com 214 toneladas mensais. O município concentra perto de 60% da área do reservatório e a piscicultura é uma atividade que começou a crescer nos últimos cinco anos, incentivada pelos órgão de assistência técnica e até pelo extinto Ministério da Pesca.
Em níveis críticos, a estiagem está provocando a mortalidade dos pescados e atrasando o crescimento, o que faz os produtores contabilizarem prejuízos. Apontando a uma distância de aproximadamente 500 metros, o piscicultor Alisson Braga mostra onde era sua criação de tilápias. Acompanhando o nível da represa, que baixou quase 10 metros, ele precisou transferir os tanques, movimento que está sendo repetido por praticamente todos os produtores da região.
Sua marca, a Tilápia Mineira, produz cerca de 70 toneladas ao mês e todos as manhãs ele enterra os peixes que amanhecem o dia boiando na água, entre 300 e 500 quilos por dia, perto de 3 toneladas por mês. A imagem é desoladora. Nem quem vive na água escapa ao sol escaldante. “Os níveis de oxigenação caem muito com o calor”, explica o piscicultor.
Na mesma região, Olimpio Dayrell, segue os mesmos procedimentos e pela manhã faz a limpeza de seus tanques recolhendo os animais que não sobreviveram. Geralmente a mortalidade é maior entre os peixes que estão bem próximos ao ponto de abate, pesando entre 700 gramas e 900 gramas. A situação da represa, faz o piscicultor repensar seus investimentos. Ele planejava contratar uma linha de financiamento para expandir o negócio, mas vai aguardar primeiro pelas chuvas.
Alisson Silva lembra que Morada Nova de Minas vive da piscicultura e da agricultura tocada por grandes empreendimentos. Ele comenta que quando o lago foi construído a cidade ficou desolada. Tinha 18 mil habitantes na década de 60. De lá para cá, no caminho inverso do país, a população diminuiu em 8 mil habitantes. Um ensaio da retomada vem acontecendo devagar, já que Morada Nova ficou por décadas esquecida no mapa. A piscicultura criou um movimento na cidade que já conta com três frigoríficos abatedouros e já produz seus próprios alevinos, filhotes de peixes.
“É tudo uma cadeia, quando precisamos produzir para incentivar o consumo, vem a queda no nível do reservatório, que tem mais haver com sobradinho do que com a chuva. Daí a produção de peixes cai em um momento que deveria aumentar, reduzindo preços, para abastecer o consumidor que quer comprar, mas está apertado.” O coordenador de piscicultura da Emater, José Rasguido, explica que o consumo de peixes no país vem crescendo, mas tem espaço para avançar. Durante a crise da água, ele aponta que uma alternativa encontrada é reduzir a alimentação para evitar a mortalidade. Em vez de três rações diárias, a dieta é reduzida a uma porção. “O que atrasa o abate em aproximadamente um mês”, calcula.
Planos adiados A crise da água se torna mais forte com o revés da economia, que encareceu e reduziu o crédito para investimentos. Lylia Prado, é dona do frigorífico Minas Pescados, já autorizado pelos serviços sanitários. Este ano, ela planejava uma expansão no pequeno abatedouro que lhe daria mais um selo de qualidade. “A essa altura do ano, eu já precisava estar com minha área pronta. Preciso de um crédito de R$ 100 mil, mas no momento os bancos não têm linhas para investimento que se adequem ao meu negócio.”
Carlos Junior de Faria, montou um negócio de criação de alevinos e hoje fornece para toda a região de Três Marias e até para outros estados. Este ano, ele também planejava expandir o negócio, mas foi pego pela estiagem de um lado e do outro pela crise econômica. Como não conseguiu linha de crédito no sistema financeiro, usou recursos próprios para obras para ter água. Isso porque sua captação que acontecia a uma distância de 400 metros, com a estiagem se afastou em mais de um quilômetro, exigindo os investimentos, que acabaram empurrando para o ano que vem a expansão da pequena empresa.
Em Fama, no Sul de Minas, piscicultores também migram para fugir da seca que ameaça os criatórios. O pescador e piscicultor Edson Coelho cria tilápias no Lago de Furnas e já olha para o nível das águas com preocupação. “Se a água baixar mais um pouco já começa a ficar ruim, a dar doença no peixe”, afirma. No ano passado, também por causa das chuvas escassas, foi necessário mudar os tanques de pesca de lugar. “Eles ficavam na margem, agora está dentro do leito do rio”, explica.