Brasília – O calote do Brasil entrou no radar das previsões dos investidores, principalmente, agora, após a Moody’s rebaixar o país, ontem, e colocar os títulos soberanos brasileiros definitivamente no rol dos papéis considerados “lixo” pelas agências de rating. Nesta semana, um relatório do diretor de pesquisa para a América Latina do Goldman Sachs, Alberto Ramos, deixou o mercado alarmado, pois também indicou “uma percepção crescente do risco de insolvência fiscal do Brasil” em visita que fez ao país.
A possibilidade de uma moratória da dívida pública como aconteceu nos anos 1980 não é imediata. Mas ela vem sendo considerada por especialistas a médio prazo, caso o governo não consiga fazer um ajuste fiscal crível, capaz de reduzir o ritmo cada vez mais acelerado de crescimento da dívida pública em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), que ficou em 66,2% do PIB em 2015 pelos dados do Banco Central. Essa taxa estaria em mais de 70% do PIB podendo encerrar em 80%, conforme levantamentos que consideram as operações compromissadas (de curtíssimo prazo) do BC, que exclui esse dado que equivale vem encostando em R$ 1 trilhão.
O aumento da dívida pública é o motivo principal dos rebaixamentos da Standard & Poor’s, em setembro de 2015 e na semana passada, e da Fitch Ratings, em dezembro. Não à toa, o consenso dos especialistas é que novos downgrades virão ao longo do ano. Em janeiro, o estoque da dívida somou R$ 2,749 trilhões, 1,54% menor que os R$ 2,793 bilhões de dezembro, conforme dados divulgados ontem pelo Tesouro Nacional, graças ao resgate total de R$ 150,4 bilhões, dos quais R$ 143,9 bilhões da dívida interna e R$ 6,5 bilhões da externa. As emissões líquidas (diferença entre o resgate e as emissões) somaram R$ 78,4 bilhões.
“Sempre há um volume grande de títulos que vencem em janeiro que supera o número de emissões e faz com que o estoque caia temporariamente”, explicou o coordenador-geral de operações da dívida do Tesouro, José Franco Medeiros de Morais, essa queda é normal para o período. No entanto, ele avisou que a tendência de aumento da dívida e que ela poderá chegar a R$ 3,3 trilhões, conforme o Programa Anual de Financiamento (PAF). Questionado sobre o risco de calote, o técnico do Tesouro, negou essa possibilidade. “Não existe risco algum”, assegurou Morais. Ele descartou a dificuldade para rolar a dívida e garantiu que o colchão de liquidez tem “folga para o Tesouro escolher o momento mais adequado para mais emissões”, se necessário.
Especialistas concordam com o técnico sobre a questão do risco de calote externo, pois o grosso desse montante (cerca de 95%) é devido internamente. Logo, basta o governo ativar a máquina da Casa da Moeda para emitir dinheiro e pagar os títulos que forem vencendo no mercado doméstico. Só que as consequências disso todo mundo conhece: a volta da hiperinflação. “Ainda é cedo para falar em calote, mas ele pode ser possível dentro de três a quatro anos, se o governo não conseguir conter o aumento da dívida púbica. Por isso, há muito espaço para a inflação subir, o que não deixa de ser preocupante, porque o custo será bem alto para o brasileiro”, alertou Monica de Bolle, pesquisadora do Peterson Institute for International Economics, em Washington.
O economista Simão David Silber, professor da Universidade de São Paulo (USP), também evita o tom alarmista de um calote imediato do governo. “A dívida externa é muito pequena perto dos US$ 370 bilhões de reservas internacionais, portanto, essa possibilidade é inexistente”, avaliou. No entanto, ele reconheceu que, antes de uma moratória, o governo precisará fazer novos cortes no Orçamento, atrasando o pagamento de benefícios e de obras, atrasos de salários, a exemplo do que alguns estados superendividados, como o Rio Grande do Sul. Aliás, a União já começou a atrasar o pagamento de alguns órgãos, de acordo com o presidente da Câmara Brasileira da Construção Civil (CBIC), José Carlos Martins. “Os atrasos do Dnit (Departamento Nacvional de Infraestrutura de Transporte) são de, no mínimo, 60 dias e a dívida soma R$ 2,8 bilhões”, informou ele.
Mercado O principal índice da BM&FBovespa, o Ibovespa, amenizou as perdas registradas nas primeiras horas do pregão de ontem, com melhora do cenário externo, mas, ainda assim, fechou no negativo, puxada pelo comportamento das blue chips. A perda do grau de investimento pela única agência que ainda conferia o selo de bom pagador ao país, a Moody's, com a nota rebaixada em dois graus de uma só vez pesou no índice até o fim do pregão. O Ibovespa chegou a cair um pouco mais de 3% no meio do dia, mas no início da tarde, com a reversão do sinal negativo do petróleo e um pouco mais tarde das bolsas internacionais, a queda ficou menos acentuada. Ontem, o índice fechou com recuo de 1,03%, aos 42.084,56 pontos.
Apesar do corte da nota de crédito do Brasil, o dólar perdeu força ante o real e terminou o dia em baixa. O dólar comercial terminou em queda de 0,15%, aos R$ 3,9568.
FMI prega melhora fiscal
Nova York – A recessão no Brasil está se mostrando mais longa e mais forte que o esperado e é “imperativo” que o país adote um conjunto de medidas econômicas apropriadas, afirma o Fundo Monetário Internacional (FMI) em um documento que será apresentado na reunião do G-20 dias 26 e 27 na China. A recomendação é que o governo de Dilma Rousseff persiga a melhora das contas fiscais e continue com uma política monetária apertada.
“O governo deve prosseguir a consolidação fiscal resolvendo a rigidez e mandatos insustentáveis no lado dos gastos públicos”, afirma o relatório do FMI, chamado “Desafios de políticas econômicas e perspectiva global”, que contém uma série de recomendações de políticas econômicas. Além disso o documento vê como essencial as reformas estruturais no país, para melhorar a produtividade, a competitividade e a infraestrutura. Neste último caso, o documento pede que o Brasil implemente programa de concessões.
Nas contas fiscais, o FMI fala da necessidade de reforma da Previdência, de medidas nos impostos e cortes de gastos discricionários para melhorar a trajetória das contas públicas no curto prazo. O documento que o fundo vai apresentar na reunião do G-20 também fala da inflação brasileira. “A redução da inflação para a meta de 4,5% em 2017 vai exigir uma política monetária apertada”, afirma o FMI. Para a pesquisadora Monica de Bolle, do Peterson Institute for International Economics, em Washington, a inflação no Brasil não vai ceder. Ficará na faixa de 10% a 20% ao ano até 2018. “Em janeiro e a prévia de fevereiro mostra que o IPCA (Índice de Preços Médio ao Consumidor Amplo) não caiu. Ele está em curva ascendente”, alertou.
A avaliação do FMI é que a deterioração da confiança de empresários e consumidores no Brasil, em meio a condições políticas difíceis, segue pesando na demanda doméstica. O fundo prevê que a economia brasileira vai encolher 3,5% este ano e terá crescimento zero em 2017. Nos dois casos, o desempenho é o pior entre as economias do G-20, de acordo com uma tabela apresentada no relatório.
A economia mundial deve crescer 3,4% este ano e 3,6% no próximo. Os mercados emergentes devem ter expansão de 4,3% e 4,7%. Já para os países que fazem parte do G-20, a previsão é de avanço de 3,4% e 3,7%. A Rússia, que deve encolher 1% este ano, deve voltar a crescer em 2017, com expansão prevista de 1%. A Argentina, outro país com recessão em 2016, também deve melhorar o desempenho no ano que vem, com avanço esperado de 2,6%.
O FMI faz uma série de recomendações de política econômica para países avançados e emergentes. Entre elas, avanço rápido em reformas estruturais e medidas de estímulo à demanda. Nos países desenvolvidos, a sugestão é que a política monetária permaneça acomodatícia e o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) comunique claramente seus próximos passos para elevar os juros, sobretudo agora que a expectativa de elevação das taxas em 2016 se reduziu.
Para evitar dependência excessiva da política monetária, alguns governos de países desenvolvidos que estão em melhor situação nas contas públicas podem lançar mão da política fiscal para estimular o crescimento, afirma o FMI. Nos emergentes, é "crítico" que os governos reforcem o conjunto interno de políticas econômicas, com o objetivo de reduzir vulnerabilidade.
A possibilidade de uma moratória da dívida pública como aconteceu nos anos 1980 não é imediata. Mas ela vem sendo considerada por especialistas a médio prazo, caso o governo não consiga fazer um ajuste fiscal crível, capaz de reduzir o ritmo cada vez mais acelerado de crescimento da dívida pública em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), que ficou em 66,2% do PIB em 2015 pelos dados do Banco Central. Essa taxa estaria em mais de 70% do PIB podendo encerrar em 80%, conforme levantamentos que consideram as operações compromissadas (de curtíssimo prazo) do BC, que exclui esse dado que equivale vem encostando em R$ 1 trilhão.
O aumento da dívida pública é o motivo principal dos rebaixamentos da Standard & Poor’s, em setembro de 2015 e na semana passada, e da Fitch Ratings, em dezembro. Não à toa, o consenso dos especialistas é que novos downgrades virão ao longo do ano. Em janeiro, o estoque da dívida somou R$ 2,749 trilhões, 1,54% menor que os R$ 2,793 bilhões de dezembro, conforme dados divulgados ontem pelo Tesouro Nacional, graças ao resgate total de R$ 150,4 bilhões, dos quais R$ 143,9 bilhões da dívida interna e R$ 6,5 bilhões da externa. As emissões líquidas (diferença entre o resgate e as emissões) somaram R$ 78,4 bilhões.
“Sempre há um volume grande de títulos que vencem em janeiro que supera o número de emissões e faz com que o estoque caia temporariamente”, explicou o coordenador-geral de operações da dívida do Tesouro, José Franco Medeiros de Morais, essa queda é normal para o período. No entanto, ele avisou que a tendência de aumento da dívida e que ela poderá chegar a R$ 3,3 trilhões, conforme o Programa Anual de Financiamento (PAF). Questionado sobre o risco de calote, o técnico do Tesouro, negou essa possibilidade. “Não existe risco algum”, assegurou Morais. Ele descartou a dificuldade para rolar a dívida e garantiu que o colchão de liquidez tem “folga para o Tesouro escolher o momento mais adequado para mais emissões”, se necessário.
Especialistas concordam com o técnico sobre a questão do risco de calote externo, pois o grosso desse montante (cerca de 95%) é devido internamente. Logo, basta o governo ativar a máquina da Casa da Moeda para emitir dinheiro e pagar os títulos que forem vencendo no mercado doméstico. Só que as consequências disso todo mundo conhece: a volta da hiperinflação. “Ainda é cedo para falar em calote, mas ele pode ser possível dentro de três a quatro anos, se o governo não conseguir conter o aumento da dívida púbica. Por isso, há muito espaço para a inflação subir, o que não deixa de ser preocupante, porque o custo será bem alto para o brasileiro”, alertou Monica de Bolle, pesquisadora do Peterson Institute for International Economics, em Washington.
O economista Simão David Silber, professor da Universidade de São Paulo (USP), também evita o tom alarmista de um calote imediato do governo. “A dívida externa é muito pequena perto dos US$ 370 bilhões de reservas internacionais, portanto, essa possibilidade é inexistente”, avaliou. No entanto, ele reconheceu que, antes de uma moratória, o governo precisará fazer novos cortes no Orçamento, atrasando o pagamento de benefícios e de obras, atrasos de salários, a exemplo do que alguns estados superendividados, como o Rio Grande do Sul. Aliás, a União já começou a atrasar o pagamento de alguns órgãos, de acordo com o presidente da Câmara Brasileira da Construção Civil (CBIC), José Carlos Martins. “Os atrasos do Dnit (Departamento Nacvional de Infraestrutura de Transporte) são de, no mínimo, 60 dias e a dívida soma R$ 2,8 bilhões”, informou ele.
Mercado O principal índice da BM&FBovespa, o Ibovespa, amenizou as perdas registradas nas primeiras horas do pregão de ontem, com melhora do cenário externo, mas, ainda assim, fechou no negativo, puxada pelo comportamento das blue chips. A perda do grau de investimento pela única agência que ainda conferia o selo de bom pagador ao país, a Moody's, com a nota rebaixada em dois graus de uma só vez pesou no índice até o fim do pregão. O Ibovespa chegou a cair um pouco mais de 3% no meio do dia, mas no início da tarde, com a reversão do sinal negativo do petróleo e um pouco mais tarde das bolsas internacionais, a queda ficou menos acentuada. Ontem, o índice fechou com recuo de 1,03%, aos 42.084,56 pontos.
Apesar do corte da nota de crédito do Brasil, o dólar perdeu força ante o real e terminou o dia em baixa. O dólar comercial terminou em queda de 0,15%, aos R$ 3,9568.
FMI prega melhora fiscal
Nova York – A recessão no Brasil está se mostrando mais longa e mais forte que o esperado e é “imperativo” que o país adote um conjunto de medidas econômicas apropriadas, afirma o Fundo Monetário Internacional (FMI) em um documento que será apresentado na reunião do G-20 dias 26 e 27 na China. A recomendação é que o governo de Dilma Rousseff persiga a melhora das contas fiscais e continue com uma política monetária apertada.
“O governo deve prosseguir a consolidação fiscal resolvendo a rigidez e mandatos insustentáveis no lado dos gastos públicos”, afirma o relatório do FMI, chamado “Desafios de políticas econômicas e perspectiva global”, que contém uma série de recomendações de políticas econômicas. Além disso o documento vê como essencial as reformas estruturais no país, para melhorar a produtividade, a competitividade e a infraestrutura. Neste último caso, o documento pede que o Brasil implemente programa de concessões.
Nas contas fiscais, o FMI fala da necessidade de reforma da Previdência, de medidas nos impostos e cortes de gastos discricionários para melhorar a trajetória das contas públicas no curto prazo. O documento que o fundo vai apresentar na reunião do G-20 também fala da inflação brasileira. “A redução da inflação para a meta de 4,5% em 2017 vai exigir uma política monetária apertada”, afirma o FMI. Para a pesquisadora Monica de Bolle, do Peterson Institute for International Economics, em Washington, a inflação no Brasil não vai ceder. Ficará na faixa de 10% a 20% ao ano até 2018. “Em janeiro e a prévia de fevereiro mostra que o IPCA (Índice de Preços Médio ao Consumidor Amplo) não caiu. Ele está em curva ascendente”, alertou.
A avaliação do FMI é que a deterioração da confiança de empresários e consumidores no Brasil, em meio a condições políticas difíceis, segue pesando na demanda doméstica. O fundo prevê que a economia brasileira vai encolher 3,5% este ano e terá crescimento zero em 2017. Nos dois casos, o desempenho é o pior entre as economias do G-20, de acordo com uma tabela apresentada no relatório.
A economia mundial deve crescer 3,4% este ano e 3,6% no próximo. Os mercados emergentes devem ter expansão de 4,3% e 4,7%. Já para os países que fazem parte do G-20, a previsão é de avanço de 3,4% e 3,7%. A Rússia, que deve encolher 1% este ano, deve voltar a crescer em 2017, com expansão prevista de 1%. A Argentina, outro país com recessão em 2016, também deve melhorar o desempenho no ano que vem, com avanço esperado de 2,6%.
O FMI faz uma série de recomendações de política econômica para países avançados e emergentes. Entre elas, avanço rápido em reformas estruturais e medidas de estímulo à demanda. Nos países desenvolvidos, a sugestão é que a política monetária permaneça acomodatícia e o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) comunique claramente seus próximos passos para elevar os juros, sobretudo agora que a expectativa de elevação das taxas em 2016 se reduziu.
Para evitar dependência excessiva da política monetária, alguns governos de países desenvolvidos que estão em melhor situação nas contas públicas podem lançar mão da política fiscal para estimular o crescimento, afirma o FMI. Nos emergentes, é "crítico" que os governos reforcem o conjunto interno de políticas econômicas, com o objetivo de reduzir vulnerabilidade.