Férias coletivas, redução de turnos de trabalho e demissões são expedientes usados para enfrentar a tempestade. Em 2015, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o PIB da indústria despencou 6,2%, enquanto a queda da atividade no país foi de 3,8%.
Na indústria, os números negativos perseguem todos, não escolhe lados, afetando praticamente todos os segmentos. Nem grandes nem pequenos empreendimentos escapam. De gigantes dos setores automotivos e da mineração até as pequenas fábricas, todos enfrentam de algum modo o mau humor da economia. Com céu nublado, especialistas apontam que uma recuperação da indústria está ligada ao fim da crise política que vem contaminando a economia e derrubando expectativas.
Michel Aburachid, presidente do Sindicato da Indústria de Vestuário de Minas Gerais (Sindvest-MG), explica que 98% das fábricas que atuam no setor da confecção, intensivo no uso da mão de obra, são de pequeno porte e sentiram o freio da atividade econômica. Dos uniformes para empresas até a fabricação de roupas vendidas no mercado interno, a produção despencou 30% em 2015.
O sindicato estima que ao redor de 500 indústrias no segmento foram desativadas no ano passado.“As confecções têm tentado se adequar com novos produtos, como a linha de sportwear (roupas esportivas). Esperamos que uma recuperação seja agora favorecida pelo câmbio. Acredito que já chegamos ao fundo do poço”, avalia Aburachid.
Nos últimos 12 meses até fevereiro, 68 mil postos de trabalho foram cortados pela indústria na Grande Belo Horizonte. No país, 344 mil vagas foram eliminadas no período. Há três meses, Rodrigo de Souza, de 33 anos, perdeu o emprego como encarregado de fábrica em uma indústria de estruturas metálicas que funcionava no Distrito Industrial de Contagem, na região metropolitana da capital. “O volume de serviço caiu muito e a fábrica fechou.”
Rodrigo está em busca de outro trabalho, mas tem lidado com um mercado hostil. Enquanto não encontra trabalho fixo tem feito bicos, varrendo galpões vazios ou como auxiliar em serralherias. “Na indústria eu recebia salário de R$ 3 mil. Meu rendimento caiu muito, perto de 70%”, calcula ele, que tem como meta se recolocar na mesma atividade.
“Fechamos 2015 em queda no faturamento e a projeção para 2016 continua negativa. Nem mesmo os setores exportadores estão bem. O Brasil está experimentando um processo de desindustrialização precoce. Em economias maduras, isso ocorreu em um estágio avançado de crescimento e bem-estar da população”, diz Lincoln Gonçalves Fernandes, presidente do Conselho de Política Econômica e Industrial da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg). Segundo ele, se uma luz no fim do túnel sinalizar para reformas que façam renascer as expectativas na economia brasileira, principalmente os setores ligados às exportações podem ser os primeiros a reagir.
BAIXA CONFIANÇA Dono de uma pequena indústria em Contagem, Rafael Júnior fabrica portões, ferragens e equipamentos em aço e ferro para grandes empresas. No último ano, as encomendas foram reduzidas a 30% do volume habitual. Para fazer frente ao panorama, ele dispensou a maior parte dos funcionários e passou a atuar também no setor de sucatas. Reduziu as horas trabalhadas desligando as máquinas durante um turno do dia.
Há 20 anos no setor, ele conta que está acompanhando o fechamento de muitas empresas. “Grandes empresas pararam as obras e não estão fazendo encomendas. Um outro efeito dessa crise está nos salários. Vejo que as pessoas estão aceitando trabalhar por até 50% menos”, afirma. Algumas indústrias procuradas pelo Estado de Minas preferiram não se pronunciar sobre o momento delicado.
Em uma fábrica de médio porte de Contagem, os funcionários lembraram que, recentemente, a empresa funcionava em três turnos, reduzidos agora a um expediente de oito horas. Eles observam que a demanda caiu pelo menos 30%. “Os resultados do ano passado foram péssimos. Este ano começou ruim e não há o que comentar, porque o nível de confiança continua muito baixo”, diz outro industrial, há mais de 20 anos atuando na Grande BH, que prefere não se identificar.
Vagas encolhem 11,5%
A marcha a ré da indústria tem repercutido de forma pesada no mercado de trabalho. Dados da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg) apontam que no estado, nos últimos 12 meses, o emprego encolheu 11,5% e a massa salarial (a soma de todos os salários pagos) despencou 15,2%. João Alves, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Betim, Igarapé e São Joaquim de Bicas, diz que em 2013 a categoria contava com aproximadamente 47 mil empregados, contingente que, em 2016, caiu para 38 mil.
A valorização do câmbio deu refresco às exportações, mas, ainda assim, a indústria de máquinas e equipamentos amargou em fevereiro queda de 24% no faturamento, ante o mesmo mês do ano passado. Nos últimos 12 meses terminados em fevereiro, foram 311 mil empregos a menos no setor em todo o país. Em Minas, cerca de 18 mil vagas foram cortadas no mesmo período.
Marcelo Veneroso, presidente da regional da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), considera que apesar de o câmbio ter melhorado o ambiente para o setor, com a instabilidade das cotações da moeda norte-americana é ruim para os negócios. “A previsibilidade fica comprometida, contratos foram fechados com o câmbio a R$ 4 e, agora, a moeda americana já está próxima a R$ 3,60.” Na sexta-feira, o dólar comercial fechou a R$ 3,56.
O industrial confirma que no último ano, indústrias do setor foram desativadas e outras estão hibernando, mantendo apenas os empregados mais qualificados, que, segundo Veneroso, vão participar do processo de reestruturação das fábricas quando a demanda e a competitividade forem restauradas. Na indústria, somente na linha de produção 30 funcionários foram dispensados em um time de 33. “Costumamos dizer no jargão da indústria que o juro alto aleija, mas o câmbio fora da dose mata a indústria, porque esse é competitividade na veia.”