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Estado de Minas

Diante da crise, brasileiros correm atrás de bicos para pagar contas

Para bancar das mensalidades da universidade às despesas com energia e água, famílias dobram jornadas de trabalho


postado em 19/06/2016 06:00 / atualizado em 19/06/2016 07:50

A cuidadora de idosos Adriana Duarte trabalha em horário integral, sem descanso na semana, para que a filha passa de formar no curso de direito, depois de ter perdido o financiamento concedido pelo Fies(foto: Gladyston Rodrigues/EM/DA Press)
A cuidadora de idosos Adriana Duarte trabalha em horário integral, sem descanso na semana, para que a filha passa de formar no curso de direito, depois de ter perdido o financiamento concedido pelo Fies (foto: Gladyston Rodrigues/EM/DA Press)
Para fazer frente ao aumento das despesas que engole o salário, a classe C está mais seletiva, corta custos e dobra a jornada de trabalho, com bicos ou atividade extraordinária. Adriana Duarte, de 47 anos, é cuidadora de idosos e atualmente trabalha em dois empregos, de domingo a domingo, sem descanso. O objetivo é pagar a faculdade da filha que se forma em direito no fim do ano. O acesso à universidade foi uma das conquistas da classe média brasileira, mas manter as mensalidades em dia tem sido um desafio para milhares de estudantes apoiados pelo Programa de Financiamento Estudantil (Fies) do governo federal.


A filha de Adriana está no nono período do curso de direito, mas perdeu o financiamento, arcando agora com a mensalidade de R$ 1,1 mil. “Já me acostumei a trabalhar sem folga. No fim do ano, depois da formatura, pretendo reduzir a jornada”, conta a cuidadora. Segundo ela, o remédio contra a crise foi trabalhar mais e simplificar a vida, cortando gastos com lazer e com itens considerados supérfluos.


Ulisses Ermelindo da Silva, 32 anos, é piscineiro, mas com a alta dos preços passou também a fazer bicos de conserto de motores e equipamentos danificados. Em casa, a família dele também reduziu os gastos com água e energia elétrica. Aproveitando a oportunidade de fazer algum dinheiro extra, na semana passada Ulisses também procurou um topa-tudo para vender uma cama infantil. “É a primeira vez que estou tentando vender alguma coisa. Se conseguir até uns R$ 80 pela cama, já ficarei satisfeito.”


Dona de bom gosto para se vestir, Gleidsiana Ferreira, 30 anos, viu o orçamento apertar com a escalada dos preços, principalmente no supermercado e na conta de luz. Uma de suas estratégias além de parar de consumir foi vender roupas de cama de sua casa, além de bijuterias e roupas para amigas. Ela conta que começou a lançar mão dessa política há algum tempo: “Logo quando comecei a sentir que a crise estava chegando, em 2014”, diz. Gleidsiana está cumprindo aviso-prévio mas espera conseguir em breve um novo emprego. “Vendo as coisas para amigos e barato, mas o dinheiro ajuda demais”, diz ela que tem dois filhos e é a chefe da família. Seu sonho de consumo é uma lavadoura de roupas e um novo colchão, projetos que, por enquanto, estão congelados.


Leonardo Gomes, 22 anos, trabalha em uma loja de compra e venda de eletrônicos no Centro da cidade. Ele conta que vendeu seu playstation 2, um jogo por R$ 150 e gostou de fazer a mercadoria girar. “Me ajudou a pagar umas contas que eu tinha”, disse ele. Com a crise, o rapaz que há seis anos está no segmento observa que o mercado de eletrônicos sofreu uma baixa e o número de clientes que procuram a loja onde trabalha para vender produtos é bem maior do que os interessados em comprar.


Entre os que lucraram de alguma forma com a crise, Gildelei de Sousa tem uma loja de produtos eletrônicos no Bairro Coqueiros, em Belo Horizonte, e diz que o movimento no seu negócio cresceu. Segundo ele, hoje os clientes têm interesse em consertar o aparelho já que um novo custa mais caro. “Calculo que os consertos que antes representavam no máximo 60% do movimento, hoje ficam com mais de 85%”, diz o técnico em eletrônica.

INADIMPLÊNCIA Pesquisa da Serasa Experiam aponta para números recordes da inadimplência. Segundo os dados, 60 milhões de brasileiros, quatro em cada 10 adultos acima de 18 anos, têm alguma conta em atraso. A população com renda per capta entre um e cinco salários mínimos somam 50% do total. “A inadimplência atinge a todos da classe A até a E, mas ela é mais forte nas classes de menor renda que não dispõem de poupança”, aponta Luiz Rabi, economista da Serasa.

(foto: Arte EM)
(foto: Arte EM)
Cresce comércio de usados

A crise da economia teve repercussões em todas as classes sociais, empurrando o movimento no mercado de usados e em segmentos como o aluguel de quartos. Smartphones que antes se transformavam em lixo eletrônico, agora são consertados. O quarto que estava vazio em casa, recebe hóspedes que pagam por dia e ajudam a custear a manutenção do imóvel. O móvel ou eletrodoméstico de pouco uso também se transforma em dinheiro em trocas rápidas no varejo de usados.

O site de venda OLX, especializado na compra e venda de seminovos, tem mostrado crescimento recorde e diz que a crise está impulsionando o crescimento do mercado. Celulares, carros, móveis de casa, eletrodomésticos são os mais vendidos. “Isso, evidentemente, beneficia o negócio, uma vez que alimentamos uma nova forma de consumo onde o vendedor pode reciclar um produto que está parado em casa, vendendo para alguém que tem a oportunidade de adquirir um item até 70% mais barato do que se fosse comprado em uma loja convencional”, argumenta Marcos Leite, Vice Presidente Comercial da OLX.

Segundo o executivo, os brasileiros estão aderindo à cultura do “desapega” como uma forma de fazer renda extra. Em Minas, o crescimento de usuários na plataforma foi de 88,6% na comparação a maio de 2015. Marina Oliveira, arquiteta, tem um apartamento bem localizado no Centro da capital. A crise econômica atingiu diretamente sua renda, já que o volume de serviços encolheu. Para ajudar na manutenção da casa ela decidiu anunciar por R$ 50 a diária o quarto que estava vago. “Foi uma boa opção que encontrei para ter uma renda extra”, comentou. (MC)


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