São Paulo, 04 - De maneira silenciosa, mas persistente, a recessão que tomou conta da economia foi comprometendo a saúde financeira dos maiores negócios nacionais. Segundo um levantamento, ao qual o jornal
O Estado de S. Paulo
teve acesso em primeira mão, cerca de 40% das maiores empresas brasileiras listadas na Bolsa de Valores de São Paulo estão muito endividadas, sendo que mais da metade delas está em estado "crítico", tem dificuldade de pagar dívidas que somam R$ 420 bilhões.
Se na conta for incluído os débitos da Petrobras, que somam cerca de R$ 450 bilhões, o volume total de dívidas consideradas críticas vai a R$ 870 bilhões.
Na avaliação dos especialistas, tão ou mais preocupante do que o tamanho da conta tem sido a solução encontrada para tirar a corda do pescoço: a maioria está apenas renegociando os passivos com os bancos. Alongam prazos, reduzem valor das parcelas, enfim, jogam a conta para frente, numa aposta de que haverá dias melhores na economia em pouco tempo.
Os dados constam de um levantamento feito pela consultoria alemã Roland Berger. Foram avaliados os balanços de 133 das maiores empresas em receita listadas na Bovespa. São as pesos-pesados da economia brasileira. Representam 25 setores e suas receitas somam R$ 1 trilhão - o equivalente a 17% do Produto Interno Bruto do País.
A conclusão: 77 empresas estão saudáveis, mas os indicadores de 26 empresas do grupo em melhor condição mostram deterioração financeira. Outras 54 empresas, 40% do total, têm dívidas muito elevadas, sendo que 34 delas chegaram a um estado "crítico": têm dificuldade de gerar receita para pagar os juros das dívidas. Esse grupo mais fragilizado concentra praticamente 70% das dívidas do total de empresas avaliadas no estudo.
"Ficou claro para nós que uma parcela importante do mundo empresarial brasileiro atravessa um momento mais complicado do que dá a entender. Há um problema grave de solvência nas grandes empresas nacionais", diz o português Antonio Bernardo, presidente da consultoria Roland Berger no Brasil.
Rolagem
Os consultores da Roland Berger se preocuparam particularmente com a estratégia escolhida pela maioria para contornar o momento adverso. A análise do endividamento teve como ponto de partida os balanços de setembro de 2015. De lá para cá, a economia se deteriorou ainda mais e as empresas que tinham os piores indicadores adotaram como estratégia principal simplesmente rolar os débitos.
"A maioria procurou os bancos e, se teve bons argumentos, conseguiu renegociar a dívida, mas no fundo não tocou na raiz do problema. Ocorre que não reestruturar o negócio num ambiente de crise é assumir um risco alto. Se a economia não sair da recessão e voltar a crescer no prazo esperado, o problema pode voltar lá na frente pior do que antes", diz Bernardo.
O sócio da Roland Berger Gustavo Lopes, responsável pela coordenação do levantamento listou para o Estado as 133 empresas avaliadas, mas não se sentiu confortável em apontar as mais problemáticas. Citou, no entanto, alguns casos públicos. Na lista das empresas consideradas em estado crítico figura a Oi, um típico exemplo do tamanho do risco que se corre quando a tática é empurrar dívidas sem mexer na operação. A maior empresa de telefonia tinha condições de pagar os juros de sua dívida, mas estava com problema de liquidez para pagar parcelas que venciam.
Ficou um ano e meio conversando com credores, num tenso processo de reestruturação financeira que deu em nada. Há cerca de duas semanas, entrou com pedido de recuperação judicial de uma dívida de R$ 65 bilhões, a maior da história do País. Outro caso é o da Gol. A empresa opera com prejuízo desde 2011, teve a nota de crédito rebaixado pelas agências de risco e tenta renegociar prazos para o pagamento de uma dívida de quase R$ 7 bilhões, boa parte dela com detentores de bônus.
Casos menores também fazem parte da lista, como a Forja Taurus, Log-in e Contax, que recentemente fecharam renegociações de dívidas.
A Petrobras está numa situação atípica. Vem conseguindo rolar as dívidas de curto prazo com financiamentos de bancos da China e emissão de bônus. Mas se de um lado ela paga a dívida financeira, está numa ampla renegociação de contratos com seus fornecedores. As informações são do jornal
O Estado de S. Paulo.