Brasília, 25 - O governo decidiu frear de vez os reajustes aos servidores federais que ainda tramitam no Congresso. Com isso, acabou deflagrando uma "guerra" de salários, com algumas categorias tendo os aumentos aprovados e outras não. Agora, servidores de áreas com grande poder de pressão cobram o compromisso assumido por Michel Temer: de honrar os reajustes negociados ainda na gestão Dilma Rousseff.
Para alguns servidores, o salário de início de carreira subirá para patamares entre R$ 19,21 mil e R$ 21,64 mil no ano que vem. A situação coloca o presidente em uma encruzilhada, porque ficou mais difícil justificar para a população novos aumentos, enquanto as contas públicas acumulam rombos sucessivos e o governo cobra medidas de ajuste fiscal.
Dados do Ministério do Planejamento, responsável pela gestão da folha de pagamentos de cerca de 1.300 carreiras de servidores da União, mostram que os projetos pendentes teriam um impacto de R$ 7,2 bilhões em 2017. Os aumentos já aprovados, porém, resultarão em gastos adicionais de R$ 11,5 bilhões no ano que vem. A folha vai crescer R$ 23,4 bilhões em 2017, mas parte desse dinheiro pode ser economizado - se os projetos forem congelados - e usado para reduzir o déficit.
Entre as carreiras que ainda não tiveram aumento estão a dos ministros do Supremo Tribunal Federal, cujo salário subiria de R$ 33.763,00 para R$ 39.293,38 mensais, e delegados da Polícia Federal, cuja remuneração ficaria entre R$ 21,64 mil e R$ 28,26 mil após o reajuste. No caso da Receita Federal, os salários passarão a patamares entre R$ 19,21 mil e R$ 24,94 mil, fora o bônus de produtividade, que pode chegar a R$ 7 mil mensais. Diplomatas, por exemplo, ainda nem tiveram o projeto de lei encaminhado ao Congresso.
O ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, avalia que o momento não é oportuno para colocar esses projetos em votação. "É preciso esperar para a evolução da conjuntura", justificou. Ele disse acreditar que os servidores terão compreensão e responsabilidade em manter os serviços públicos.
Discriminação
Mas não é esse o clima em Brasília. Pelo contrário, a tradicional disputa de salários entre as categorias só se acirrou, e elas acusam o governo de discriminação e incoerência. "Não se pode estabelecer dois pesos e duas medidas", disse Cláudio Damasceno, presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais (Sindifisco), que representa um dos grupos de servidores com maior força.
"Quando o governo deu o aval no Congresso, já não se conhecia o cenário de crise? Os números já eram conhecidos, foi uma decisão discriminatória do presidente", disse a presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais (Anadef), Michelle Leite. Os defensores tiveram o reajuste de 67% até 2018 aprovado pelo Congresso, mas o texto foi vetado pelo presidente.
"Chance zero, zero, desses projetos serem aprovados", garantiu o senador José Aníbal (PSDB-SP). Também são contrários parlamentares do PMDB, PSDB, DEM e até de partidos do Centrão, como PSD e PP. Até mesmo alguns integrantes da oposição chegam a endossar o movimento para barrar os reajustes.
Descontentes com a postura do governo, algumas categorias já articulam formas de exercer pressão. A Defensoria Pública Federal e os auditores fiscais ameaçam greve. "Jogaremos duro na mesma forma. A Receita Federal caminha para completa desestabilização", disse Damasceno. Os sinais dessa paralisação já começam a aparecer na arrecadação e nas investigações no âmbito da Operação Lava Jato, disse o presidente do Sindifisco.
Caso o presidente Temer persista na ideia de barrar os reajustes em tramitação, será "um desastre", disse o presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), Luís Antônio Boudens. "Já há sentimento interno de que há represália a carreiras envolvidas na Lava Jato", afirmou. A categoria ainda tem esperanças de que seus reajustes não sejam vetados, uma vez que a tramitação do projeto segue na Câmara, mas também articula manifestações caso não seja contemplada. No comando da PF, também há preocupação com a aprovação dos aumentos.