Igor Gadelha, 04 - A versão final do projeto que altera a lei de repatriação de recursos enviados ilegalmente ao exterior abre nova brecha para que sonegadores que ainda não foram condenados em última instância possam aderir ao programa e, assim, tenham anistia penal automática nos processos que ainda estão em fase recursal.
Na semana passada, o relator do projeto na Câmara, deputado Alexandre Baldy (PTN-GO), chegou a incluir na proposta trecho que previa que só não poderiam ser repatriados recursos alvos de processo com condenação transitada em julgado, ou seja, em última instância. Com isso, outros recursos desse contribuinte condenado poderiam ser legalizados pelo programa.
Após a repercussão negativa, porém, Baldy retirou esse trecho do projeto que irá a votação na Câmara. Ele manteve o texto original da lei em vigor, que prevê que "sujeitos que tiverem sido condenados em ação penal" não podem aderir ao programa de repatriação. O trecho, porém, não especifica que tipo de condenação impossibilita a adesão.
Na versão final entregue nesta terça-feira, 4, aos líderes, contudo, o relator incluiu novamente a brecha no texto. Em outro artigo, diferente do que foi retirado na semana passada, o projeto prevê agora que, ao cumprir as exigências para aderir ao programa de repatriação, o sonegador terá anistia penal automática.
"O cumprimento das condições previstas no caput antes do trânsito em julgado de decisão criminal condenatória extinguirá, em relação às condutas praticadas até a data de adesão (31/10/2016) e aos anos anteriores, a punibilidade do declarante em relação aos crimes previstos", diz o artigo.
Na avaliação de advogados, o trecho abre brecha para que sonegadores que tenham sido condenados em primeira instância e estejam recorrendo possam aderir ao programa. E, ao aderir, terão a anistia automática a crimes como sonegação e lavagem de dinheiro, mesmo que os crimes ainda estejam sendo analisados em fase recursal.
De acordo com advogados, qualquer cidadão é considerado inocente até que tenha uma condenação transitada em julgado. Dessa forma, o projeto abrirá margem para que sonegadores que respondam a processos em fase recursal possam aderir ao programa.
A lei que criou o programa de repatriação - e que os deputados tentam alterar - foi aprovada em dezembro de 2015 e sancionada pela então presidente Dilma Rousseff em janeiro. O programa dá anistia penal e tributária a contribuintes em troca do pagamento de 15% de Imposto de Renda (IR) e 15% de multa sobre o valor repatriado, até 31 de outubro deste ano.
Outros benefícios
O texto do projeto que os deputados vão votar também prevê outros benefícios aos sonegadores. Uma das mudanças prevê que o saldo tributado será apenas o que o contribuinte tinha na conta em 31 de dezembro de 2014, e não sobre todos os recursos enviados ao exterior, como defende a Receita Federal.
Caso o saldo nesta data seja zero, o valor tributado será o saldo em 31/12/2013 e assim sucessivamente até o fim de 2011. Dessa forma, os sonegadores pagarão menos impostos para regularizar os recursos ilegais. Além disso, caso não haja saldo em 31 de dezembro de 2011, o contribuinte pode ganhar anistia penal, sem pagar os 30% de IR e multa previstos.
O projeto beneficia ainda sonegadores ao ampliar o espectro de contribuintes autorizados a repatriar. Pela lei em vigor, não residentes no Brasil no momento da aprovação da lei só poderiam aderir ao programa se residissem no Brasil em 31 de dezembro de 2014. O texto dos deputados amplia esse prazo para entre 1º de janeiro de 2011 e o último dia de 2014.
Políticos
Embora não esteja previsto constar no projeto que será votado, alguns parlamentares articulam o fim da proibição a políticos e parentes de aderirem ao programa de repatriação, incluída para evitar que envolvidos na Operação Lava Jato fossem beneficiados. O deputado Paulo Pereira da Silva (SD-SP) vai apresentar emenda nesse sentido no plenário.
As mudanças na lei da repatriação estão sendo articuladas por Alexandre Baldy, com aval do Palácio do Planalto e do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Para evitar bater de frente com Maia, a equipe econômica não tem feito oposição forte à articulação, exigindo em troca apenas que deputados não alterem a data de adesão.