Brasília – Passados seis meses desde que assumiu a presidência da República, Michel Temer conseguiu alterar o clima de pessimismo generalizado em relação à capacidade do país de sair da recessão, mas os desafios não são poucos para inverter os indicadores desfavoráveis do desempenho da economia. Com discurso conciliador, Temer apaziguou as relações do Executivo com o Congresso Nacional – que vivia em constante conflito com a gestão de Dilma Rousseff – e viu avançar na Câmara dos Deputados e no Senado Federal proposta com potencial para reequilibrar as finanças públicas, a chamada PEC do Teto de Gastos.
A melhora do ambiente político influenciou o preço dos ativos brasileiros e levou a mudança positiva das expectativas de empresários, consumidores e analistas de bancos e corretoras para a economia. A Bolsa de Valores de São Paulo (BMF&Bovespa) rompeu os 60 mil pontos e o dólar chegou a ser cotado a R$ 3,10, depois de ultrapassar os R$ 4 em janeiro. No entanto, se engana quem pensa que os problemas do país estão resolvidos. Há muito a ser feito.
O presidente Temer ainda tem de garantir a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 55 – novo número que o projeto de limitação dos gastos públicos ganhou ao chegar ao Senado. A previsão é de que o texto final seja votado em segundo turno em 13 de dezembro. A equipe do Planalto precisa ainda tornar pública a proposta de reforma da Previdência e enviá-la ao Legislativo.
O governo do peemedebista deu demonstrações de que tem maioria na Câmara, com votações expressivas para aprovar o limite ao crescimento dos gastos públicos, mas seu poder de fogo ainda não foi testado no Senado. Os auxiliares do presidente têm ciência de que a onda de pressões contrárias a mudanças nas regras para concessão de benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) será expressivamente maior.
A percepção mais favorável quanto à recuperação do país, entretanto, pouco se traduziu em resultados positivos na economia real, aquela que envolve o dia a dia das empresas e dos trabalhadores. As expectativas para a inflação de 2016 estão abaixo de 7% e para o próximo ano em 4,9%. Os preços têm dado sinais de trégua e o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), indicador oficial do custo de vida no país, parece ter entrado em trajetória de queda.
Já o Produto Interno Bruto (PIB, a soma da produção de bens e serviços do país) continua a amargar resultados negativos. Tanto o governo quando o mercado financeiro esperavam que a geração de riquezas no país desse sinais de melhora a partir do terceiro trimestre, o que não passou de percepção positiva, ao passo que o país não retomou a capacidade de recuperar crescimento.
Dificuldades Com o desemprego em elevação, os brasileiros cortaram despesas e evitam consumir. As vendas do comércio e do setor de prestação de serviços patinam e a produção industrial mantém nível alto de oscilação. Além disso, as concessões na área de infraestrutura ainda não saíram do papel. Como várias empresas enfrentam dificuldade para arcar com o pagamento de outorgas e grandes construtoras estão envolvidas na Operação Lava-Jato, o Executivo precisa criar mecanismos para resolver esses problemas, além de atrair investidores para os leilões de aeroportos, rodovias e portos. Só as exportações têm aproveitado o câmbio valorizado para impedir que a queda do PIB seja ainda maior neste ano. Assim, os analistas que esperavam crescimento superior a 1,5% passaram a revisar as projeções para baixo.
'Foi realizado o óbvio'
O grande feito de Temer nos seis primeiros meses de governo foi ter realizado o óbvio, explica o economista Evandro Buccini, da Rio Bravo Investimentos. Ao escolher uma equipe técnica para comandar a economia, ele alterou as expectativas e trouxe confiança para o mercado financeiro, para empresários e consumidores. “Antes discutíamos um quadro de dominância fiscal. Isso foi engavetado. Antes corríamos para o precipício e agora mudamos de direção. Estamos perto do buraco e não estamos andando para longe dele na velocidade que gostaríamos”, diz.
Buccini diz que o governo decidiu atacar o problema fiscal de maneira lenta e gradual, mas por meio de um componente estrutural. “A grande mudança é que se acreditava que a dívida não estava sob controle. O governo decidiu andar lentamente para não tropeçar no caminho. Para uma estratégia boa, depende, no entanto, da aprovação da reforma da Previdência", comenta. Na visão do especialista, se as mudanças na regra para concessões de benefícios não forem aprovadas tudo o que o governo arrecada será destinado para pagar aposentadorias nos próximos anos.
O governo Temer se move na direção correta, para o estrategista-chefe do Banco Mizuho, Luciano Rostagno. Entretanto, ele alerta que os desafios são enormes, mesmo com os avanços conquistados a partir do andamento da PEC que limita o crescimento dos gastos públicos. “A eleição de Trump para a presidência dos Estados Unidos dificultou ainda mais a tarefa do governo. O cenário externo é mais complexo. Ainda há incerteza quando à capacidade do governo de endereçar os problemas fiscais. E isso passa pela conscientização dos parlamentares”, alerta.
O maior desafio do Executivo será tornar as promessas realidade, afirma a economista-chefe da XP Investimentos Zeina Latif. Ela pondera que os sinais da equipe econômica são claros e o diagnostico é preciso, mas o governo resiste a abrir mais de uma frente de batalha. “O lado bom disso é o pragmatismo. O risco é de que algumas decisões sejam postergadas. Ainda temos um tumulto criado por eventos não econômicos, o que é um problema”, afirma.
Para o economista-chefe da SulAmerica Investimentos, Newton Rosa, o governo tem atuado de maneira correta e isso se refletiu na melhora de indicadores de confiança de consumidores e empresários, além dos preços dos ativos. “A atividade econômica não responde de imediato porque a herança da desorganização macroeconômica fará com que a recuperação seja lenta”, comenta. Ele alerta que os desafios fiscais não serão pequenos diante dos problemas nos demais entes da federação. “O Rio de Janeiro é um exemplo claro. Como fazer ajuste em um momento delicado como o que passa o estado? Isso vai exigir do governo um talento enorme ara gerenciar esses riscos”, destaca.