São 15h30, véspera de feriado. Apoiada de improviso num balcão, a televisão está ligada na Rede Globo, exibindo Sessão da Tarde. Três pessoas ocupam uma das quatro mesas de madeira da única lanchonete do aeroporto da Pampulha, na capital mineira.
Outros cinco ou seis passageiros aguardam para embarcar no saguão do terminal, que se prepara para retomar a operação de voos domésticos nacionais, autorizada em outubro por portaria do governo federal.
A movimentação de passageiros projetada acolhe demanda quase 20 vezes maior em relação à atual.
Funcionários do aeroporto e taxistas alimentam a expectativa de reviver os “bons tempos” da Pampulha, época em que o Aeroporto Internacional Tancredo Neves, em Confins, era considerado um “elefante branco”. E, para que isso aconteça, a Pampulha só depende do interesse das companhias.
A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) abriu na segunda-feira processo para as empresas requisitarem a aprovação dos horários e rotas dos voos. O que não deve demorar e pode ocorrer antes mesmo do início do verão, em dezembro.
Divulgado esta semana pela Anac, o planejamento da movimentação do terminal indicou que Brasília, Rio (Santos Dumont), Vitória, São Paulo (Congonhas) e Goiânia foram as rotas de voo mais requisitadas. Gol e Azul controlarão um quinto dos voos (20%) cada uma, sendo que a Gol terá participação de 26% dos assentos e a Azul, 20%.
O horário mais cobiçado foi o das 9h. Depois de divulgar o resultado, a Anac ainda não recebeu nenhum pedido de voo pelas companhias, que estão estudando as rotas.
A imagem de um saguão vazio e com poucos serviços à disposição dos passageiros contrasta com os planos de expansão do terminal, que vai ter capacidade para embarcar 300 passageiros e desembarcar 360 passageiros por hora.
Em um ano, a projeção é de mais de 5,7 milhões de passageiros, distante da capacidade de 22 milhões de passageiros de Confins, mas 19,2 vezes maior do que a movimentação da Pampulha hoje.
Para se ter uma ideia, em todo o ano de 2016, houve 300 mil embarques e desembarques no terminal vizinho à Lagoa da Pampulha, num total de 41,6 mil poucos e decolagens.
Estrutura Para atender à demanda atual, Pampulha conta com apenas uma lanchonete, cujos preços são “mais amigos” do que os de Confins. Ainda se consegue comprar na Pampulha salgados e refrigerantes por R$ 5, café por R$ 4 e um cappuccino por R$ 6.
Além da lanchonete, o terminal conta com um restaurante desativado. Espaços para lojas e estandes também estão fechados. Segundo a Infraero, que administra o aeroporto, um grupo de trabalho finaliza processos licitatórios para serviços na Pampulha. A estimativa é de que isso ocorra em novembro e dezembro.
O aeroporto conta com dois estacionamentos, com 274 vagas ao todo – em Confins, são 625 vagas. O maior, com 152 vagas, está desativado por falta de clientes. O valor da hora é R$ 10 e, pela diária, cobram-se R$ 40.
O terminal tem dois banheiros para uso de passageiros, reformados recentemente, junto com balcões de check-in e instalação de novas balanças.
Também foram revitalizados testeiras, pisos táteis, fachada do terminal, sinalização e iluminação do sistema de pistas, recuperação de pavimento da pista de pouso e decolagem, pista de taxiamento de pátio de aeronaves e sistema de iluminação, elevação do nível de proteção contra incêndio.
EXPECTATIVA Na contramão de moradores da região, críticos à retomada dos voos, e de defensores da exclusividade de Confins para voos nacionais, quem depende do movimento da Pampulha para o sustento está contando os dias para centenas de passageiros voltarem a movimentar o terminal.
“Estamos prontos para receber os passageiros”, garante a funcionária da lanchonete, Sílvia Oliveira, que reclama do pouco movimento.
Os taxistas também estão à espera dos passageiros. “Nos bons tempos, 3 mil taxistas rodavam aqui por dia. Já estou parado no aeroporto faz quase três horas e não aparece ninguém. Estamos ansiosos para melhorar”, afirma o taxista José Maia, de 68 anos, que passou a metade da vida no ponto em frente ao aeroporto.
Os passageiros reconhecem o benefício da comodidade de um aeroporto dentro da cidade, mas fazem ponderações. “Pampulha é bom para vir só para Belo Horizonte.
Antes de ter voo de Valadares para cá, nem vínhamos de avião, porque não compensava muito ir para Confins. Mas, pra fazer conexões com outras capitais, Confins é melhor”, afirma o médico Wagner Chagas, de 46 anos, que aguardava seu voo para Governador Valadares, no Vale do Rio Doce, com a mulher, Rosane Chagas, de 46, e o filho, Victor, de 10.
“Aqui não tem estrutura. Viemos para uma consulta médica e preferimos esperar o tempo passar em um shopping, porque aqui não tem nada”, comenta Rosane. O bancário Caio Lopes, de 28, também de Governador Valadares, não tem dúvidas da facilidade da Pampulha.
“A localização é extraordinária, mas a estrutura é muito inferior à de Confins. A Pampulha precisava ser climatizada”, afirma Lopes, sentindo falta de um ar-condicionado.
Entenda o caso
* No dia em que seria votada a permissão para a continuidade de mais uma denúncia contra o presidente Michel Temer (PMDB), o governo publicou a portaria que autoriza os voos de grande porte no aeroporto da Pampulha.
* A Portaria 911 revoga outra de maio de 2017, que impedia os voos comerciais no aeroporto.
* O texto também atribui à Infraero a exploração do terminal da Pampulha.
* O ato foi assinado pelo Ministro dos Transportes em exercício Fernando Fortes Merlo Filho.
* A portaria foi assinada pelo ministro interino já que o titular da pasta, Maurício Quintella, foi exonerado para dar mais um voto a favor de Temer na Câmara dos Deputados.
Pronto para a retomada
O aeroporto da Pampulha está habilitado a funcionar em todos os dias, 24 horas por dia, antes mesmo deste verão. De acordo com a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), há 11 posições de estacionamento de aeronaves em voos comerciais, sendo quatro para aeronaves de maior porte, como Airbus 319 ou o Boeing 737.
Desde 2005, quando os voos de grandes jatos foram transferidos para Confins, o terminal recebe aviões com capacidade máxima de 72 passageiros. Atualmente, a principal atividade é com voos do Projeto de Integração Aérea Regional (Pirma), que liga 17 municípios mineiros a BH por meio de aeronaves de pequeno porte.
Batizada de Voe Minas Gerais, a iniciativa, da Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig) e da Secretaria de Estado de Transportes e Obras Públicas (Setop), ajudou a aumentar o movimento do terminal, depois do encerramento das atividades da Azul na Pampulha.
A concessionária BH Airport, que administra o Aeroporto Internacional Tancredo Neves, em Confins, na Região Metropolitana, entrou com ação na semana passada no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para tentar barrar a retomada de voos domésticos nacionais na Pampulha. A principal reclamação é que a concorrência levaria ao enfraquecimento de toda a malha aérea de Confins. Ainda não há posicionamento da Justiça sobre o pedido de liminar.