São Paulo – Após longa recessão, o varejo brasileiro finalmente retomou a trajetória de crescimento. Ela começou no terceiro trimestre do ano e se fortaleceu em novembro e dezembro. Segundo o Instituto de Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o marco da retomada foi agosto, quando as vendas de móveis e eletrodomésticos avançaram 12,9%, o melhor desempenho em cinco anos. Os resultados positivos estão disseminados por todo o setor, do varejo de moda aos supermercadistas. Mas é preciso fazer uma ressalva: a base de comparação, o melancólico ano de 2016, era baixa demais, o que de certa forma relativiza os números atuais.
Outro aspecto apontado por Gouvêa é a leve retomada dos índices de emprego, que trouxeram alguma recuperação de renda. Ele também lembra que a liberação dos saldos do Fundo de Garantia (FGTS) e, mais recentemente, do PIS/Pasep, acabou injetando um bom dinheiro no mercado. O efeito dessas medidas é que boa parte do varejo voltou a contratar, expandir lojas e encomendar mais mercadorias da indústria, fazendo a roda de vendas voltar a girar. “Sair desse estágio em que estávamos, que era de quase inanição, para o estágio atual é uma tremenda evolução. Temos que comemorar”, diz o especialista.
RECORDE NEGATIVO Nos dois últimos anos de crise, mais de 100 mil lojas fecharam as portas no país, um recorde negativo. Só no varejo paulista, 107 mil empregos com carteira assinada foram eliminados. Em 2017, segundo pesquisa de emprego da Federação do Comércio de São Paulo (Fecomércio-SP), a situação começou a se reverter. Até o final do ano, o saldo negativo deve passar a positivo, com um estoque ativo de 2,085 milhões de trabalhadores formais, alta de 0,01% em relação aos 2,082 milhões de 2016. Parece pouco, mas o importante é o viés de alta – exatamente o que os economistas valorizaram.
Supermercados (mais 12,2 mil postos) e farmácias e perfumarias (4,5 mil) estão puxando a retomada de postos de trabalho. Na outra ponta, atividades ligadas aos setores de materiais de construção, vestuário, tecidos e calçados ainda devem terminar 2017 com perdas: cerca de 4 mil vagas a menos. “O importante é que a melhora do emprego deverá ser generalizada no comércio em 2018”, afirma Guilherme Dietze, economista da Fecomércio-SP.
O Magazine Luiza aproveitou a onda positiva. Entre julho e setembro, a empresa alcançou a maior taxa de crescimento dos últimos cinco anos, de 27%, mesmo considerando uma base de comparação maior (10,8% no terceiro trimestre/2016) e o fim dos saques do FGTS em julho. Também foi no terceiro trimestre que a rede registrou lucro de R$ 92,5 milhões, o maior de sua história.
Como resultado do momento favorável, o Magazine abriu 39 lojas nos últimos 12 meses, totalizando 830 pontos de venda em 16 estados do país. “O ano de 2017 foi fantástico para a nossa empresa”, diz Frederico Trajano, presidente da empresa. “Além disso, as perspectivas para o varejo são ótimas. Acredito que 2018 será um ano que nos fará esquecer a crise recente, com a volta dos bons indicadores ao varejo.”
CONFIANÇA EM ALTA A continuidade do cenário positivo, segundo o consultor Marcos Gouvêa, vai depender da manutenção da confiança dos consumidores. O índice vem se recuperando fortemente desde o primeiro semestre do ano, ainda que tenha passado por momentos de oscilação negativa, mas com clara tendência de recuperação. Outro ponto que pode atrapalhar, diz o consultor, é o fato de as taxas de juros (apesar da redução da Selic), ainda estarem altas para o consumidor final, que já enfrenta um crédito escasso e extremamente controlado.
Além disso, pontua o economista-chefe da Associação Comercial de São Paulo, Marcel Solimeo, a não aprovação das reformas estruturais, em especial a da Previdência, pode atrapalhar o desempenho não só do comércio, mas de toda a economia em 2018. “O Banco Central deixou claro que a redução de juros não deve prosseguir se o governo não conseguir acertar as contas da Previdência”, salienta o economista.
O que chama a atenção, afirmam os especialistas, é o fato de todas projeções de vendas apontarem para cima. Gouvêa acredita que o crescimento do varejo no país deve ficar em torno de 3% em 2018. Antes disso, as vendas do Natal devem acelerar entre 4% e 5%. “O importante não é a variação, mas a consolidação da tendência de anos melhores”, diz o consultor Marcos Gouvêa. “Acho que os empresários do varejo têm que comemorar sim, mas com parcimônia”, conclui Marcel Solimeo, da Associação Comercial.