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Estado de Minas

Marcelo Odebrecht vai continuar longe dos negócios

Para especialistas, saída do executivo da cadeia não deve alterar os planos da empresa de profissionalizar a gestão e deixar o fantasma da corrupção e da Lava-Jato para trás


postado em 20/12/2017 12:00 / atualizado em 20/12/2017 08:34

São Paulo – A ida de Marcelo Odebrecht para casa, onde cumprirá prisão domiciliar, reacende a dúvida: será que a família Odebrecht pretende se reaproximar dos negócios? Ou o escândalo revelado pela Operação Lava-Jato foi suficiente para que se tomasse a decisão de profissionalizar a gestão e afastar qualquer vestígio da antiga administração? Quatro dias antes de Marcelo deixar o presídio de Curitiba, depois de 913 dias no cárcere, em direção ao apartamento onde vive a família, em São Paulo, Emílio, seu pai, anunciou que deixará a presidência do Conselho de Administração do grupo em breve.

Para o mercado, o futuro do grupo é tão incerto que a volta de Marcelo aos negócios, ainda que informalmente, é vista como algo improvável, sob risco de colocar todo o investimento que tem sido feito nos últimos dois anos em práticas de governança corporativa por água abaixo. Já a decisão de Emílio de antecipar seu desembarque do conselho, que deveria acontecer em dezembro de 2018, para o primeiro semestre – provavelmente em abril – é avaliado como um movimento muito bem estudado para aumentar as chances de recuperação da companhia.

Marcelo Odebrecht chega em casa, em São Paulo, após deixar a carceragem em Curitiba depois de dois anos e meio preso(foto: Miguel Schincariol )
Marcelo Odebrecht chega em casa, em São Paulo, após deixar a carceragem em Curitiba depois de dois anos e meio preso (foto: Miguel Schincariol )

Não por coincidência, abril de 2018 será uma data muito importante para o grupo. É quando vencerá uma dívida de R$ 500 milhões da construtora e outros US$ 100 milhões em resgates de bonds. “É uma situação bem complicada, porque a empresa não tem geração de caixa suficiente”, avalia Alexandre Garcia, diretor associado da agência de análise de risco Fitch Ratings. Uma possibilidade seria tentar refinanciar esses vencimentos, mas o momento não é favorável à construtora, que viu sua receita despencar de R$ 4,1 bilhões em dezembro de 2016 para R$ 2,2 bilhões em 30 de setembro de 2017.

A situação é tão grave que desde janeiro de 2017 a nota dada pela Fitch à construtora é CC (duplo C) – quando a empresa alcança níveis altos de risco e o default, ou calote, parece ser provável. Abaixo do CC vem o C (quando, por exemplo, algum credor não recebeu na data prevista) e D (quando o pagamento não ocorreu e o default é decretado, seja por meio de um pedido de recuperação judicial ou quando um credor pede a falência).

Emílio Odebrecht antecipou para o 1° semestre sua saída da presidência do Conselho de Administração(foto: Ari Kaye/Jcom/D.A Press - 17/9/09)
Emílio Odebrecht antecipou para o 1° semestre sua saída da presidência do Conselho de Administração (foto: Ari Kaye/Jcom/D.A Press - 17/9/09)

“É interesse de todos os acionistas que o negócio prospere, por isso parece improvável que o Marcelo resolva voltar a tomar alguma decisão no grupo”, afirma um analista que conhece de perto a empresa. Segundo Garcia, hoje o grupo tem uma preocupação em revitalizar dois de seus principais ativos: a construtora e a Braskem.  Por isso, tem implementado uma série de mudanças nos últimos dois anos, quando começaram os acordos de colaboração com a Justiça no âmbito da Operação Lava-Jato.

“A tendência é que o grupo foque em algumas áreas onde tem maior expertise, como construção e petroquímica. Ainda assim, a expectativa é que essas empresas fiquem menores do que estão hoje”, diz Paulo Furquim de Azevedo, coordenador do Centro de Estudos em Negócios do Insper. Ainda segundo o professor, em outros setores a saída deve ser a venda de ativos, como vem acontecendo, já que a economia de escala é fundamental e chega um momento em que o negócio deixa de ser viável. “O mercado não é ingênuo e já sabe que isso (venda de ativos) vai acontecer depois de todo o vendaval”, afirma o especialista.

Azevedo vê como improvável a volta de Marcelo aos negócios, ainda que seja um acionista importante. No período de negociação pré-delação premiada, sua relação com a família começou a se deteriorar por conta de opiniões divergentes. Como consequência, Marcelo acabou negligenciado nas decisões da companhia. “Ainda que ele pudesse voltar aos negócios, isso não seria uma ameaça à modificação profunda no modus operandi da nova gestão”, diz Azevedo. Já a saída de Emílio, explica o professor, pode ter um peso positivo, porque mostra ao mercado que os negócios dão mais um passo importante para a profissionalização do grupo.

SEM MUDANÇAS Assim como Azevedo, Marcos Melo, professor de finanças do Ibmec-DF, diz que a prisão domiciliar de Marcelo não deve mudar a condução dos negócios da família ou a forma como o mercado tem percebido o grupo desde a sua prisão. “Entre os fatos mais recentes, sem dúvida o mais importante é a saída do Emílio do conselho, porque pode representar a continuidade do grupo e a possibilidade de no futuro voltar a prestar serviço para clientes para os quais não pode hoje, como a União.”

Ainda que o mercado saiba que o grupo vem se comprometendo com regras mais rígidas de governança corporativa desde que estouraram os escândalos envolvendo suas empresas, as mudanças levarão muito tempo para serem efetivamente implementadas. “Por mais que os envolvidos em atos criminosos tenham sido afastados ou punidos pela Justiça, infelizmente esse comportamento permeia a cultura da empresa e leva um tempo para que a nova cabeça da organização influencie todo o corpo, ou seja, colaboradores e seus fornecedores”, diz Melo.

Por meio de nota, a Odebrecht informou apenas que manifesta “solidariedade com Marcelo, esposa e filhas por seu retorno ao convívio familiar. Marcelo conta com o reconhecimento da empresa por enfrentar as adversidades atuais com coragem e espírito de colaboração”. O texto, curto e pouco elucidativo, pode ser mais um sinal de que o ex-presidente do grupo será tratado apenas como acionista, e nada mais.

Grupo vende ativos e troca nomes de empresas

Desde que teve de enfrentar a Justiça, o Grupo Odebrecht vem passando por uma série de mudanças – da troca do nome de algumas de suas empresas à venda de ativos. Até agora, o programa de alienação de ativos, tanto no Brasil quanto no exterior, trouxe para a companhia R$ 7,3 bilhões, mas a estimativa é que a soma alcance R$ 12 bilhões.

O processo só deve ser concluído no primeiro semestre de 2018. Mas o que foi feito até agora, segundo a companhia, já reduziu a dívida consolidada pela Odebrecht S.A. em R$ 9 bilhões. Com a conclusão do programa, prevista para o primeiro semestre de 2018, a redução deverá chegar a R$ 16 bilhões.

Além de se desfazer de ativos para reforçar o caixa, o grupo optou por mudar algumas marcas. A Odebrecht Agroindustrial passou a se chamar Atvos. A Odebrecht Realizações Imobiliárias tornou-se a OR. Já a Braskem, apesar de ter mantido o nome, passou a adotar uma nova marca, com identidade visual nas cores azul e amarelo. A intenção é que a marca Odebrecht passe a ser usada exclusivamente para denominar a holding.

O grupo em números*


75 mil
Total de funcionários em 2016

R$ 89,8 bilhões
Receita bruta

R$ 91 bilhões
Dívida bruta consolidada, sendo que cerca de 80% estão equacionados

R$ 17,8 bilhões
Ebtida

*Dados referentes a 2016

 


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