Divinópolis e Nova Serrana – Duas trabalhadoras do polo industrial do Centro-Oeste de Minas Gerais começaram 2018 enfrentando realidades bem diferentes. Enquanto Daniela de Oliveira, de 40 anos, vive a expectativa de contratação em uma fábrica de roupas em Divinópolis, Suzi de Jesus Santana, de 33, passou as primeiras semanas do ano distribuindo currículo por várias empresas de Nova Serrana e cidades vizinhas, em busca de uma oportunidade para voltar ao mercado. As duas perderam o emprego durante a fase mais aguda da crise e sentiram na pele as dificuldades de anos de recessão. Se, para Daniela, a retomada mineira no interior já é perceptível, para Suzi, a perspectiva é de que a recuperação continue a gerar empregos.
Ao fim de uma manhã ensolarada de terça-feira, com os termômetros a 30 graus e sol a pino, Suzi chegava à porta de uma fábrica de calçados que anunciava a abertura de sete vagas para o setor de produção. “Vim tentar mais uma chance. Hoje entreguei em algumas empresas e consegui uma entrevista. Estamos vendo muitas placas com oferta de emprego, mas tem muita gente atrás de trabalho, por isso a situação continua difícil”, conta Suzi. Em pouco mais de uma hora em que a reportagem do Estado de Minas esteve à porta da fábrica, 14 pessoas – o dobro do número de vagas – deixaram currículo e tentaram agendar entrevistas.
Desempregada desde 2015, Suzi conseguiu trabalhos temporários para atravessar o período de recessão, mas está há cinco meses sem emprego. “A crise foi bem dura aqui na região, muita gente ficou sem trabalho nenhum por muitos meses. Muita gente voltou para casa depois de ter perdido o emprego e deixou a cidade, inclusive muitos trabalhadores do Nordeste”, diz Suzi.
No mesmo dia, Daniela de Oliveira vivia a expectativa do primeiro dia de trabalho após quase um ano. Com experiência na indústria do vestuário, a trabalhadora mineira passou 2017 distribuindo currículos e no fim de dezembro foi chamada para entrevista em uma fábrica de camisas masculinas. Aprovada na entrevista, começou na semana passada o período de testes para a vaga. “É um ânimo novo começar o ano com uma oportunidade de trabalho. No ano passado, perdi o emprego em outra fábrica e não eram muitas chances que estavam surgindo”, lembra Daniela.
Na mesma fábrica, Jéssica Aparecida, de 19 anos, e Viviane Caetano, de 26, também iniciaram o ano com emprego novo e esperam ser contratadas após o período de experiência. Em seu primeiro emprego após concluir um curso técnico no Senai, Jéssica não chegou a viver as dificuldades do período de crise na indústria do Centro-Oeste entre 2015 e 2016, mas acompanhou de perto o momento ruim enfrentado por muitos trabalhadores da região. “Assim que concluí o ensino médio busquei um curso para me qualificar, pois sabia que o mercado não estava fácil. Agora já consegui esta oportunidade e espero aproveitá-la para garantir meu primeiro emprego”, diz Jéssica.
Para o presidente do Sindicato das Indústrias de Vestuário de Divinópolis (Sinvesd), Marcelo Marcos Ribeiro, o cenário de 2018 é de alívio para fabricantes e vendedores, mas o número de empregos ainda está distante do boom que a região viveu há 10 anos. Ele analisa que o pior da crise já passou, mas os reflexos continuam impactando, principalmente no índice desemprego, que levará mais tempo para voltar aos níveis considerados aceitáveis.
“Em 2016, tivemos um ano péssimo, foi o fundo do poço na região, com muitas empresas fechando, muitas demissões, pessoas passando para a informalidade e aumento enorme na inadimplência. A partir do ano passado, a situação começou a melhorar, mas ainda foi um ano difícil. O cenário agora é de um setor voltando a decolar. A crise começa a passar e voltamos a respirar”, avalia Ribeiro. Ele ressalta que o setor depende muito das compras no crédito e que a retomada da confiança tem impacto direto no resultado das vendas.
Na dianteira
O emprego com registro voltou a se recuperar em Minas Gerais, a um ritmo comandado pelos municípios do interior do estado. Das 110 cidades com mais de 30 mil habitantes onde o Ministério do Trabalho acompanha o comportamento do mercado formal de vagas, 61 tiveram saldo positivo (diferença a maior das contrações ante as demissões), ao passo que Belo Horizonte e a Grande BH amargaram mais demissões do que contratações em 2017. Os números fazem parte do levantamento de informações de 2017, disponibilizado nesta semana pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho.
Na capital, foram 374.022 demissões ante 370.923 contratações. O saldo negativo foi de 3.099 vagas. Campeã do ranking formado do ponto de vista do saldo do emprego com carteira, Uberlândia, no Triângulo Mineiro, registrou 99 mil contratações, mas também 96.825 dispensas, o que levou à diferença positiva de 2.175 vagas. O resultado cresceu 1,13%, portanto, acima da média de 0,62% no estado, frente ao estoque de empregados de dezembro de 2017.
Em Minas, foram abertas 1.671.895 vagas com registro em 2017, mas outros 1.647.599 empregos desapareceram. O saldo ficou em 24.296 vagas. Pouso Alegre, Santa Rita do Sapucaí e Varginha, municípios importantes do Sul de Minas e Divinópolis e Nova Serrana, no Centro-Oeste do estado, também exibiram taxas positivas do saldo do emprego e se destacaram no ano passado.
Domínio feminino
Apesar de passar por recuperações em níveis diferentes, um cenário se repete nas indústrias de alimentos, medicamentos, eletrônicos ou vestuário: a forte presença da mão de obra feminina nas fábricas mineiras. Em uma empresa farmacêutica com 3 mil funcionários, mais de 80% são mulheres. Já em outra fabricante de alimentos, com 1 mil funcionários, o percentual de trabalhadoras alcança mais de 90%. No entanto, em quase todas as empresas que a reportagem do EM visitou pelo interior mineiro, os cargos de direção são ocupados por homens.
Mais qualidade, mais vagas
Alguns empresários estão revisando a opção pela terceirização da produção na indústria do vestuário em algumas cidades mineiras. Apesar da redução de custos com impostos, a diferença na qualidade do produto final entregue às lojas está sendo apontada como motivo para a busca por contratações do quadro próprio da empresa. “Tivemos uma reunião com empresários no início do ano para discutir o assunto e a maioria já avalia que a terceirização reduz significativamente a qualidade do produto. Alguns trabalhadores terceirizados produzem em casa ou galpões de outra pessoa, com 15 ou 20 pessoas. Parte deles fica só por 15 dias e para”, conta Marcelo Ribeiro, dono de fábrica de roupas e presidente do Sinvesd.
No setor, o acompanhamento da fabricação faz com que o produto seja diferenciado, com maior qualidade. “E o cliente percebe a diferença”, explica Marcelo Ribeiro. O gerente comercial de uma fábrica de camisas em Divinópolis Eugênio Humberto Pacelli também aposta na busca mais intensa da mão de obra não terceirizada da empresa em 2018. “Quando você conquista um mercado que exige padronização no produto é preciso ter uma fatia que segue o padrão para ser referência, um controle de qualidade. Desde o ano passado, buscamos aumentar a produção interna de nossas camisas”, afirma Pacelli. (MF)