O governo tem poucos dias para convencer deputados da base aliada a votarem pela reforma da Previdência. Depois de mais de um ano de negociações, 10 adiamentos e, pelo menos, três alterações no texto da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 287/2016, o mapa de apoios ainda não alcança os 308 votos que são necessários para a aprovação.
Conforme calendário definido pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), os debates em plenário começarão na próxima terça-feira e a votação, até o dia 28. No Palácio do Planalto, a orientação é foco total para conseguir captar os votos restantes e contemplar aqueles que ainda pedem agrados — um deles foi encaminhado ontem ao Congresso Nacional, em forma de projeto que prevê o repasse de R$ 2 bilhões do orçamento às prefeituras.
Outro foco tem sido os empresários, com quem o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, tem se encontrado quase todos os dias. Otimista, Marun afirma que o assunto será resolvido neste mês, apesar de admitir que ainda faltam uns 40 votos dos 80 deputados que se dizem indecisos. “Não podemos considerar que, diante de uma situação como essa, seja impossível aprovar um assunto de tanta importância para o Brasil”, comentou no fim da tarde de ontem. O ministro se reunirá com Rodrigo Maia hoje para traçar a estratégia e tentar marcar uma reunião com os líderes da base aliada na segunda-feira para medir a temperatura das bancadas.
Além da incerteza que permeia a aprovação da reforma, grande parte da sociedade ainda não consegue entender, de maneira prática, como ela afetará a vida daqueles que estão e dos que ainda não entraram no mercado de trabalho. Pessoas aposentadas ou que completam os requisitos atuais, mesmo que não tenham requerido o benefício, não serão afetadas. No levantamento, a idade mínima de aposentadoria considera o gatilho — dispositivo inserido no texto que prevê o aumento conforme a expectativa de sobrevida do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que deve chegar a 63 anos/66 (mulheres/homens), na década de 2030 e, 64/67, em 2040. Além disso, os cálculos de valor desconsideram contribuições anteriores à profissão atual do personagem retratado.
Reforma para quem?
Por meio da história de alguns personagens, com base no texto atual, mostramos como a reforma da Previdência mudará a vida de setores específicos. Confira:
Políticos
Lindbergh Farias, 48 anos, senador
Salário: R$ 33.763
Tempo de atividade: 23 anos como político
Contribui com: 11% do salário bruto
(R$ 3.713,93)
Sem reforma: Pode se aposentar aos 60 anos, com salário integral, se permanecer político até 35 anos de contribuição (em 2030). Se largar a política e trabalhar na iniciativa privada até os 35 de contribuição, receberá proporcionalmente ao tempo que esteve no Congresso.
Com reforma: Pode se aposentar aos 65 anos, com salário integral, se for político até os 35 anos de contribuição. A fórmula de cálculo continua a mesma: proporcional ao tempo que teve mandato.
Ronaldinho Gaúcho, 37 anos, com pretensões de ser senador
Salário: R$ 33.763, caso seja eleito
Tempo de atividade: 22 anos na iniciativa privada
Contribuiria com: 11% do salário bruto (R$ 3.713,93)
Sem reforma: Pode se aposentar aos 60 anos se for eleito senador, desde que complete 35 de contribuição. O valor do benefício dependerá do tempo que ele terá na política. Se ficar só quatro anos, terá direito a R$ 3.858,63.
Com reforma: Pode se aposentar aos 67 anos devido ao gatilho. Como ele já tem os 15 anos de contribuição que passarão a ser exigidos também dos políticos, faltará atingir a idade mínima.
Servidores Público
Carlos Fernando dos Santos Lima, 54 anos, procurador da Lava-Jato
Salário: R$ 33.763
Tempo de contribuição: 40 anos
Contribui com: 11% da remuneração (R$ 3.713,93)
Sem reforma: Pode se aposentar em 2019, aos 55 anos, com integralidade (salário atual) e a paridade (mesmos reajustes dos servidores da ativa). A soma dos 40 anos de contribuição com os 55 de idade dá 95, mínimo para se encaixar na regra de servidores que entraram antes de 2003.
Com reforma: Para manter integralidade e paridade, precisará se aposentar aos 65 anos de idade.
Diogo Castor de Mattos, 31 anos, procurador da República
Salário: R$ 28.947,55
Tempo de contribuição: 7 anos
Contribui com: 11% da remuneração bruta (R$ 3.184,23)
Sem reforma: Pode se aposentar aos 60 anos, quando terá 36 de contribuição. Não tem direito a integralidade e paridade porque entrou depois de 2003.
Com reforma: Precisará completar 65 anos de idade e 25 de contribuição, sem integralidade e paridade.
Trabalhador Rural
Francisco Marques Andrade, 33 anos, trabalhador rural
Salário: R$ 1.500, em média.
Tempo de atividade: 15 anos.
Contribui com:2,3% sobre o valor da receita bruta da venda da produção, que varia.
Sem reforma:Pode se aposentar a partir dos 60 anos, com, pelo menos, 15 anos comprovados de trabalho no campo. A aposentadoria é de um salário mínimo (hoje, R$ 954).
Com reforma: O sistema permanece o mesmo.
Policiais
Fernando Segóvia, 48 anos, diretor-geral da Polícia Federal
Salário: R$ 33.763,80
Tempo de contribuição: 25 anos.
Contribui com: 11% do salário bruto (R$ 3.713,93)
Sem reforma: Pode se aposentar aos 53 anos, quando completará 30 de contribuição, sendo, pelo menos, 25 na polícia.
Com reforma: Pode se aposentar aos 55 anos. Terá de trabalhar dois anos a mais para chegar à idade mínima estabelecida para policiais federais, de 55 (homens e mulheres).
Professores
Gustavo Machado, 26 anos, professor
Salário: R$ 5.400
Tempo de contribuição: 4 anos
Contribui com: 11% sobre a remuneração bruta (R$ 594)
Sem reforma:Pode se aposentar com 52 anos, em 2044, se completar 30 anos de contribuição.
Com reforma: Pode se aposentar aos 63 anos, com 15 de contribuição.A idade mínima para professores da rede privada é de 60 anos, mas aumentará com o gatilho.
Quem não contribui
Deivlin Rodrigues, 20 anos, estudante
Sem reforma: Pode se aposentar aos 65 anos, com 15 de contribuição, ou por tempo de contribuição, depois de 35 anos de trabalho. Se ele começar a trabalhar amanhã, por exemplo, conseguirá se aposentar aos 55, desde que consiga manter as contribuições em dia até 2053. Tem ainda a regra 85/95, pela qual ele pode receber o valor integral se completar 95 pontos, somando a idade e a contribuição.
Com reforma: Pode se aposentar, possivelmente, aos 68 anos, com 15 anos de contribuição, caso opte por trabalhar na iniciativa privada. A idade inicial é de 65 anos, que ele completará em 2063, mas, com o gatilho, projeta-se que a idade mínima já tenha mudado pelo menos três vezes.
Salário mínimo
Zoremilde Carlos da Luz, 40 anos, empregada doméstica
Salário: R$ 1.000
Tempo de contribuição: Cerca de três anos, desde junho de 2015, a partir da sanção da lei que regulamentou a profissão.
Contribui com: 16% do salário (R$ 160) - 8% (R$ 80) dela e 8% (R$ 80) do patrão.
Sem reforma: Pode se aposentar a partir dos 60 anos, com pelo menos 15 de contribuição. Supondo que continue recebendo R$ 1.000 e contribua todos os meses, ganharia o salário mínimo, atualmente, em R$ 954.
Com reforma: Pode se aposentar a partir dos 63 anos, quando terá 23 anos de contribuição. Com a fórmula nova, o cálculo seria baseado em 71,5% do valor se ela completar 26 anos, ou seja, R$ 715, ou 60% (R$ 600), se ela completar apenas os 15 exigidos. Por ser menor que o salário mínimo nos dois casos, ela receberia o mínimo.
Iniciativa privada
Revalceon Santana, 45 anos, frentista
Salário: R$ 1.900
Tempo de contribuição: 25 anos
Contribui com: 8% sobre o salário bruto (R$ 171)
Sem reforma: Pode se aposentar aos 55 anos, ao atingir 35 de contribuição, se continuar trabalhando. Nesse caso, incide o fator previdenciário. Pela tabela atual, ele receberia 68,7% do salário, ou R$ 1.305,30. Se preferir, pode esperar mais cinco anos, e, aos 60, se aposentar com o salário integral, pela regra 85/95.
Com reforma: Pode se aposentar aos 58 anos, em 2031. Pela regra de transição, pode se aposentar por tempo de contribuição, pagando o pedágio de 30% sobre o tempo que falta para os 35 anos exigidos. Assim, poderia se aposentar daqui a 13 anos (os 10 que faltam, mais o pedágio de 3).