A 1ª Vara do Trabalho de Araucária e Campo Largo, na Região Metropolitana de Curitiba, uma das mais movimentadas da Região Sul do país, chegou a uma surpreendente conclusão nesta semana: o número de processos trabalhistas despencou 62% no primeiro trimestre ante o mesmo período de 2017. A intensa rotina de audiências judiciais – sempre acompanhada de embates acirrados entre patrões e empregados – deu lugar a um ritmo mais compassado de trabalho para juízes e seus auxiliares.
O fenômeno tem uma explicação principal: a aprovação da reforma trabalhista. Em vigor desde 11 de novembro do ano passado, a alteração da legislação está ajudando a reduzir as distorções nas relações entre empregados e empregadores, e dissolvendo a tese de que a Justiça do Trabalho, seja o pleito justo ou não, está sempre do lado do trabalhador. “É nítido que boa parte das ações tinha pedidos não justificáveis, recheados de má-fé”, afirma Melek, um dos autores do texto da reforma trabalhista e autor do livro Trabalhista! E agora?, que trata do tema. “A reforma criou um ambiente menos hostil para o empreendedor” (leia entrevista).
De fato, a reforma terá o efeito de expurgar os processos nitidamente marcados por má -fé. Há um mês, um juiz da 33ª Vara do Rio de Janeiro condenou um trabalhador em 15% do valor da causa por litigância de má-fé depois de tomar conhecimento de uma mensagem no celular que zombava do processo e da Justiça. Também no Rio, uma juíza fez o mesmo ao descobrir que um trabalhador havia combinado pagamento em dinheiro para uma testemunha depor a favor dele. Em São Paulo, uma testemunha foi multada em R$ 12,5 mil por mentir para o juiz.
Abusos como esses serão menos frequentes a partir de agora, diz o juiz Marlos Melek. Segundo ele, a nova legislação deu respaldo para os magistrados serem mais rigorosos. Como a reforma estabelece na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) a possibilidade de multas por atos de má-fé de todos os envolvidos no processo – inclusive peritos –, os embustes, mentiras e armações tendem a desaparecer.
A reforma também teve o mérito de tornar o ambiente de negócios mais favorável à geração de empregos. O empresário Flávio Rocha, dono da rede varejista Riachuelo e um dos maiores entusiastas da reforma, afirma que a modernização das leis trabalhistas brasileiras já tem beneficiado o empregado, que encontra no mercado de trabalho alternativas mais flexíveis para compor sua remuneração.
“A lei anterior, uma aberração criada nos anos de 1930 e que não fazia sentido existir atualmente, afugentava investimentos, desencorajava novas contratações e colocava patrões e funcionários em uma espécie de ringue judicial”, diz Rocha. “Agora, com regras mais claras, as condições para o empreendedorismo estão criadas.”
De acordo com projeções da Tendências Consultoria, o Brasil deve criar algo em torno de 1 milhão de novas vagas neste ano em decorrência do reaquecimento da atividade econômica e do ambiente de maior segurança jurídica para as empresas. Para o economista Thiago Xavier, embora a taxa de desemprego ainda esteja em patamares elevados, há sinais de um início de virada da página. “Por ter fechado 2017 com estabilidade, depois de dois anos de destruição de empregos, já é um alívio”, diz o especialista.
Nas contas do IBGE, a taxa média de desocupação em 2017 foi de 12,7%, a maior da série histórica do IBGE, que começou em 2012. Nesse período, o desemprego atingiu 13,2 milhões de pessoas – o número mais elevado dos últimos 5 anos. “Os números reforçam a necessidade de se criar uma atmosfera de estímulo às contratações”, diz o economista Valter Fonseca, da FGV-SP. “Seja contra ou a favor, o fato é que a reforma trouxe mais previsibilidade para continuarmos trabalhando e investindo”, afirma o presidente da MAN Latin America, Roberto Cortes.
Ao longo de 2018, o ritmo de contratações, estimulado pelas novas regras trabalhistas, mostrará maior vigor, segundo o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf. “O amadurecimento das relações entre trabalhadores e empregadores tem se mostrado positivo para todos, e não uma ferramenta de exploração de funcionários, como alegaram inicialmente os críticos às mudanças”, diz Skaf.
A constatação está ancorada em números. A indústria paulista registrou o melhor mês de janeiro desde 2012, com a criação de 10,5 mil empregos, segundo a Fiesp. Entre os 22 setores pesquisados pela federação, 16 tiveram resultado positivo. “O emprego no setor manufatureiro tem mostrado resultados acima da média de forma consistente, impulsionado pela reforma e pelo aumento de produção da indústria paulista em 2017, que subiu 3,4%”, acrescenta José Ricardo Roriz Coelho, vice-presidente da federação.
O crescimento de janeiro não é um fato isolado. Dados da pesquisa Rumos, elaborados pela Fiesp e pelo Ciesp, mostram que há expectativa de recuperação do emprego para a indústria paulista em 2018, com 24,4% dos industriais afirmando que pretendem aumentar o número de vagas. Em 2017, apenas 16,5% disseram ter ampliado postos de trabalho.
A pesquisa destaca que, ao comparar os dois anos, a segurança jurídica ganhou relevância em 2018, com a reforma trabalhista sendo a justificativa para o aumento do quadro de empregados dada por 1,2% dos entrevistados em 2017 e 8,9% em 2018. “Não há como ignorar os benefícios da reforma”, completa Skaf. “A tendência é melhorar cada vez mais.”
Quatro perguntas para/Marcos Melek, juiz do Trabalho
“Acabou a hostilidade com o empreendedor”
O que a reforma trabalhista irá mudar no mercado de trabalho?
Da maneira como foi aprovada, ela faz com que o risco trabalhista seja mensurável pelas empresas e traz muito mais credibilidade ao Judiciário. Isso, pelo lado do trabalhador, também é positivo. Afinal, melhora o ambiente para o empreendedorismo e para a geração de empregos, além de tornar mais amigável o ambiente tributário. Conheço empresas, muitas delas de capital aberto, que tinham de provisionar em seus balanços milhões de reais em pagamento de indenizações, mesmo que andassem em dia com suas obrigações. Isso era um absurdo.
As mudanças já estão surtindo efeitos práticos?
Sim. Os efeitos positivos são muito visíveis. Acabou a aventura judicial e aquela velha história de, depois de trabalhar alguns meses, pedir indenização de R$ 40 mil a R$ 60 mil, argumentando qualquer coisa. Agora, percebo que os valores das causas protocoladas são reais. Existem ações de R$ 2.100, R$ 4.300 e R$ 9.200. Essas cifras não existiam antes da reforma. Era tudo acima de R$ 40 mil, ou mesmo R$ 400 mil.
Por que houve essa mudança drástica?
Porque, se ficar caracterizado que o funcionário está pedindo um valor exagerado, sem provas, pode ser condenado por litigância de má-fé. A chamada sucumbência pode sair cara para quem tentar dobrar a Justiça e tirar proveito da situação. Por isso, considero que acabou a hostilidade com o empreendedor.
Mas a geração de vagas ainda está modesta...
O mercado de trabalho só não gerou mais vagas porque ainda existe um nível muito elevado de desinformação em relação às novas regras. O Brasil, com mais de 5 milhões de ações trabalhistas em curso, ainda gera dúvidas em quem pretende contratar. Aos poucos, com mais informação, isso vai melhorar.