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Estado de Minas

Anatel freia projetos no setor de telecom

Operadoras não cumpriram o edital que previa a prestação de serviço para zona rural por meio da faixa de 450MHz


postado em 17/04/2018 12:00 / atualizado em 17/04/2018 17:10

Estão envolvidas na disputa pela frequência as quatro maiores operadoras do país(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
Estão envolvidas na disputa pela frequência as quatro maiores operadoras do país (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)

Rio de Janeiro – A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) está há 27 meses debruçada sobre o processo de retomada da frequência de 450MHz, nas mãos das operadoras de telecom desde 2012.

As empresas deveriam ter devolvido esse espectro em 30 de dezembro de 2015 porque não ativaram os serviços. Sem isso, deixaram de atender da forma que determinava o edital da zona rural do país (áreas a 30 km de distância das cidades).

Apesar de terem perdido o direito sobre a frequência, as empresas ainda tentam mantê-lo junto à Anatel. Mas não são apenas as operadoras de telecom que querem ficar com a frequência 450MHz.

Também estão de olho no uso dessa faixa as empresas de utilities (especialmente as do setor de energia), os provedores de internet, algumas polícias civis e militares, além da Polícia Federal. Apesar do interesse e da pressão para que a faixa de 450 MHz seja disponibilizada por meio de um novo edital, nada aconteceu até agora.

A Anatel informa, por meio de nota, que o processo está nas mãos do conselheiro Otávio Rodrigues. “Na 847ª Reunião do Conselho Diretor (realizada em 5 de abril), solicitou prorrogação de prazo de 60 dias para pautar a matéria”. Portanto, se não houver mais uma extensão de prazo, uma decisão sobre o caso poderia ser anunciada a partir do início de junho.

A faixa de 450MHz foi outorgada para as prestadoras de serviço de telecom que adquiriram a frequência de 2,5GHz para a implantação da rede 4G dentro do edital 04/2012.

Isso aconteceu porque o lote relativo exclusivamente à faixa de 450MHz não teve interessados na época. Ou seja, as operadoras tiveram de levar o atendimento à zona rural por meio da faixa de 450MHz caso quisessem oferecer o 4G.

Segundo o edital, se até 30 de dezembro de 2015 não houvesse a ativação de serviços na faixa de 450MHz, as operadoras de telecom teriam de abrir mão da autorização de uso do espectro, “sem prejuízo do cumprimento dos compromissos assumidos”, informa a Anatel.

Ainda de acordo com a agência, como está em discussão no Conselho Diretor da Anatel a possibilidade de utilização de sistemas via satélite em vez da faixa de 450MHz para atendimento dessas obrigações de cobertura em regiões rurais (processo nº 53500.025122/2014-48), “a conclusão do processo de devolução ou não da faixa de 450MHz não se completou, por estar relacionada ao objeto sob avaliação no referido processo”.

Ou seja, as operadoras já deveriam ter aberto mão do espectro por descumprimento de contrato, mas como estão negociando o uso de satélites para atender a essa demanda, a Anatel não tirou delas a faixa de 450MHz.

De um lado, estão envolvidas na disputa as quatro maiores operadoras do país: Vivo, Tim, Claro e Oi. Em uma das reuniões do colegiado da Anatel, em meados do ano passado, as empresas alegaram que o uso da faixa de 450MHz é inviável por conta da pouca oferta tanto de equipamentos para a rede terrestre quanto de aparelhos para os usuários.

As teles optaram por utilizar outras frequências, combinadas com conexões via satélite, e assim atender em parte aos compromissos assumidos ao vencerem o primeiro leilão de 4G no país, em 2012.

Já o conselheiro Otávio Rodrigues comentou na ocasião que a construção dessa infraestrutura para o 450MHz também faz parte da licitação, portanto não basta oferecer o serviço por meio de outra tecnologia, como o uso de satélites.

Prazo

No entanto, como as teles vêm oferecendo o atendimento parcial à zona rural por satélite, uma das possibilidades admitidas pela Anatel seria que as empresas tivessem um novo prazo, de até dois anos, para que fizessem todos os investimentos em infraestrutura terrestre, conforme previsto no edital e, enquanto isso, continuassem a fazer a prestação de serviço na zona rural como vem ocorrendo atualmente.

Em 6 de abril, durante o evento UTCAL Summit, sobre tecnologia da informação e comunicações para utilities, promovido pela entidade Utilities, Telecom & Tecnology Council América Latina (UTCAL), no Rio de Janeiro, os representantes do setor se reuniram com Adriana Mendes, coordenadora de Regulamentação das Condições de Uso de Radiofrequências da Anatel, para discutir o assunto.

As utilities defendem há dois anos junto à agência que a frequência de 450 MHz seja tirada das mãos das operadoras de telecom e entregue às empresas que atuam no setor de energia.

“Estamos tentando buscar um consenso no setor sobre o uso da faixa. Sabemos da importância dessa pauta e do papel do setor de utilities para a economia, como gerador de empregos e prestador de serviços essenciais. Mas a questão da devolução da frequência não foi definida. A Anatel precisa ver quais são as obrigações da teles e analisar qual é a melhor alternativa”, comenta Adriana.

A coordenadora da Anatel lembra que não são apenas as utilities, apoiadas por fornecedores que equipamentos, interessadas em vender seus produtos, que estão fazendo pressão pela retomada da faixa de 450MHz.

O setor de segurança pública, segundo ela, também reivindica a autorização para utilizar essa frequência. As polícias Civil e Militar de alguns estados, além da Polícia Federal, já pleitearam a faixa junto à agência, mas também estão na fila de espera até que haja uma decisão. A Polícia Federal foi procurada para comentar o assunto, mas não respondeu aos contatos.

Para os interessados, ter uma faixa exclusiva para suas operações é importante porque minimiza os riscos de falhas e gargalos no uso das redes tradicionais, que são compartilhadas por todos – do usuário final às empresas. Segundo Ronaldo Santarem, vice-presidente da UTCAL, a entidade já mostrou à Anatel os problemas que as utilities podem ter ao compartilhar faixas, como acontece hoje, em vez de ter uma faixa de uso exclusivo.

“As utilities têm de se mobilizar muito rápido em caso de emergência, como um apagão ou uma ventania. Essa comunicação precisa de agilidade entre os funcionários e as centrais de operação das empresas. Mas imagine em um dia de temporal em uma cidade com todo mundo usando o celular para avisar a família que está parado no congestionamento. As utilities vão compartilhar essa mesma rede sobrecarregada, que pode até ficar fora do ar, apesar da urgência em identificar e comunicar as falhas no fornecimento de energia, por exemplo”, explica.

Para o executivo da UTCAL, as utilities não podem “ser mais uma na fila para usar o serviço da operadora de telefonia em caso de emergência. Por isso, a frequência dedicada (exclusiva ou compartilhada, desde que tenha prioridade de uso) é tão importante”.

Mas mesmo que a Anatel decida pegar de volta a frequência de 450MHz das operadoras de telecom, a vida das utilities pode não ser tão fácil. Essas empresas defendem que, por prestarem um serviço de caráter essencial, não deveriam pagar para ter direito a essa faixa.

Ou seja, esperam que a agência libere o uso sem cobrar. “A Anatel é dona do espectro. Se ela cobrar vai inviabilizar a operação para as utilities”, reclama Santarem.

A Associação Brasileira de Telecomunicações (Telebrasil) informou que, como a demanda é das operadoras, não poderia comentar o assunto. Por meio de nota, a Vivo informa que “está em fase de estudos e testes para utilização mais eficiente desta frequência. A operadora destaca também que atende a área rural com as frequências existentes, conferindo mobilidade ao serviço de banda larga móvel rural.” Tim, Oi e Claro não comentaram o caso.

 

Frequência foi 'brinde amargo' para empresas


Quem também cobiça a frequência encostada pelas teles são os provedores regionais de internet, representados pela Associação Brasileira de Internet e Telecomunicações (Abrint). Para Basílio Perez, presidente da entidade, não há dúvidas de que o edital 04/2012 previa a obrigatoriedade das teles em investirem na faixa de 450 MHz.

“Na época em que ofereceram essa frequência, os provedores regionais de internet só não entraram no leilão porque não era economicamente viável, mas havia o interesse. Já as operadoras receberam esse ‘brinde amargo’ quando ganharam a frequência de 2,5GHz para implantar a rede 4G”, diz.

Para Perez, não só a área rural perde com a atual cobertura oferecida pelas operadoras, mas os caixas públicos, já que a Anatel deixa de arrecadar tanto com a falta de prestação de serviço quanto com o atraso de dois anos na retomada da frequência de 450 MHz e na sua oferta em um novo leilão.

“Além disso, o Brasil deixa de ter investimento em tecnologias que são importantes”, avalia o representante da Abrint.

Por meio de nota, a Claro informou ter investido em infraestrutura para uso do espectro 450 MHz para assim cumprir as metas rurais.

"Não há tratativas junto à Anatel para devolução do 450 MHz. A empresa possui mais de 200 Estações Radio Base com frequência 450MHz. A sua infraestrutura implantada no espectro 450MHZ atendeu aos prazos oficiais. Foram realizados vários testes que atestam a regularidade da sua rede 450MHz dentro dos prazos", informa a tele.

A empresa diz que tem um processo junto a agência para que seja possível o uso do satélite de maneira complementar, "dados os desafios peculiares das regiões dos referidos compromissos de abrangência".

* A jornalista viajou a convite da UTCAL Summit


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