O plano de turbinar o setor hoteleiro em Belo Horizonte com os jogos da Copa do Mundo se transformou em frustração e prejuízo quatro anos depois. Às vésperas do início de um novo Mundial, a capital mineira tem seis hotéis que foram lançados para receber os turistas em 2014 com obras ainda em andamento. Mesmo empreendimentos que lucraram alto durante o torneio no Brasil contabilizam baixa ocupação nos últimos anos. A avaliação de especialistas do setor é que a falta de grandes eventos na cidade após a Copa, a recessão econômica e a superoferta de vagas deixaram o cenário hoteleiro da capital mineira em situação crítica e levaram ao fechamento de mais de 10 mil postos de trabalho.
Segundo os dados da prefeitura, apenas 13 hotéis que haviam sido licenciados para a Copa concluíram a obra e atestaram o início das atividades nos prazos planejados. De 2014 até o ano passado, outros 29 entraram em funcionamento na capital, mas no mesmo período 14 estabelecimentos, entre hotéis e pousadas, encerraram suas atividades depois da Copa.
DESEMPREGO
“Após o mundial, o cenário hoteleiro de BH não melhorou e o setor hoje vive uma grave crise. Fechamos 2017 com uma taxa média de ocupação de 50%. E isso para os grandes hotéis. Em outros, a situação ficou ainda pior e muitos acabaram fechando as portas, com muitas demissões”, avalia Paulo César Marcondes Pedrosa, presidente do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de BH e Região Metropolitana (Sindhorb) e da Federação de Hotéis, Bares e Restaurantes de Minas Gerais (Fhoremg).
De acordo com o Sindhorb, somente na capital mineira foram fechadas mais de 10 mil vagas de trabalho no setor hoteleiro nos últimos dois anos. Paulo César avalia que a euforia com os números de 2014 acabaram não se sustentando nos anos seguintes e a grande concorrência entre os hotéis da capital se transformou em um problema para a sobrevivência dos estabelecimentos.
“O ano da Copa foi ótimo, movimentou muito o turismo da cidade. Mas logo em seguida o país entrou em uma crise enorme e afetou demais o setor. Também achei um exagero o número de novos empreendimentos construídos para o evento. Cheguei a falar que BH precisava de mais cinco bons hotéis para receber bem os turistas, vieram quase 40. O que tivemos depois foi uma concorrência desleal entre os empreendimentos, cada um querendo furar o olho do outro. E com a crise econômica, o setor ficou em situação caótica”, comenta Paulo César.
Esqueletos nas ruas da capital
Para a presidente da Associação de Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH-MG), Érica Drumond, a crise atual que se arrasta desde 2015 é resultado de um marketing negativo feito pela prefeitura sobre a estrutura hoteleira da capital nos anos anteriores a Copa de 2014. “O projeto de lei criado para incentivar a construção de novos prédios teve como objetivo motivar a construção civil que já estava entrando em crise naquela época”, comenta Érica.
Segundo ela, muitos empreendimentos contaram com condições favoráveis para inciar as obras e passaram a ter dívidas por não colocar os hotéis em operação antes do evento. “Além da ocupação baixa e do recuo de quase 50% na diária dos hotéis em BH hoje, o pior legado de todos são os prédios inacabados. Muitos com uma dívida enorme já que não cumpriram a lei e não se sabe o que vai acontecer. Alguns ficaram só os esqueletos espalhados por vários bairros, outros já estão quase acabados. Talvez seria necessário pensar outra destinação para esses prédios”, diz Érica Drumond.
A presidente da ABIH alerta também para a “desativação” de equipamentos da capital mineira, como o Minascentro e o Expominas, que poderiam receber grandes eventos e esquentar o turismo. “O setor hoteleiro vive hoje de eventos menores de empresas, que trazem funcionários de outros lugares para cursos ou encontros. Mas temos nossos principais equipamentos praticamente fechados, como o Minascentro por exemplo, o que atrapalha muito a agenda da cidade”, diz.
NA JUSTIÇA
Um dos exemplos de empreendimentos planejados para a Copa que se transformou em dor de cabeça para investidores foi o Site Savassi, prédio com 443 imóveis no Bairro Santo Antônio. A conclusão da obra do consórcio Maio/Paranasa foi prometida para cinco meses antes da Copa de 2014, mas até hoje não foi concluída. Em janeiro, uma decisão da 4º Câmara do Tribunal de Justiça de Minas Gerais aplicou medidas cautelares aos empresários responsáveis pelo empreendimento. Investidores cobram na Justiça um prejuízo estimado de R$ 245 milhões.
Por meio de nota, a construtura Maio informou que a obra foi severamente afetada pela crise econômica que se abateu sobre o Brasil. “Fomos surpreendidos pela repentina restrição do crédito às incorporadoras e pela inadimplência de muitos investidores, também afetados pela crise. No momento que percebemos que não conseguiríamos entregar a obra conforme o planejado, criamos uma força tarefa para minimizar o impacto em nossos clientes”, explica a empresa. A Maio informou que as obras civis estão em fase final, restando executar a montagem hoteleira, “que compreende o mobiliário, a decoração e equipamentos dos apartamentos e área comum”. A empresa espera conseguir vender unidades restantes do empreendimento e concluir a obra em um ano.