Brasília, 15 - O Tribunal de Contas da União (TCU) quer restringir as contratações de empreiteiras por concessionárias que tenham, entre seus sócios, empresas coligadas às construtoras. O objetivo é evitar combinações de preços entre contratantes e prestadores de serviços. No limite, o tribunal avalia até a possibilidade de proibir as concessionárias de subcontratar empresas que tenham ligação com seus grupos econômicos.
A proposta tem sido defendida pelo ministro do TCU Bruno Dantas, que pediu aos técnicos do tribunal que avaliem alternativas para restringir as contratações feitas pelas chamadas Sociedades de Propósito Específico (SPEs), termo usado para definir as empresas que assumem as concessões feitas pelo governo. A ideia é chegar a uma proposta que, sem interferir em decisões de empresas privadas, evite situações de abuso e combinações de preços.
Com as mudanças, o TCU quer evitar situações como as que ocorreram nas primeiras concessões de aeroportos. Ao analisar as contratações das concessionárias que assumiram a gestão dos terminais de Guarulhos, Viracopos, Brasília e Galeão, o TCU constatou que a estatal Infraero - sócia de cada uma das SPEs com 49% de participação - havia adotado uma postura omissa na análise de contratações de obras milionárias realizadas pelos aeroportos, grande parte delas prestadas pelos próprios sócios privados de cada concessionária.
Segundo a corte de contas, a estatal não analisava a contratação nem os aditivos decorrentes do contrato. À época, amostragem de contratos analisados apontou para um total de R$ 4,539 bilhões em negócios feitos com os aeroportos de Brasília, Guarulhos e Viracopos, valor 39% acima do valor de referência estimado pelo tribunal.
Prática
A atuação de empreiteiras como sócia e prestadora de serviços não é exclusividade dos aeroportos. A prática é comum nas concessões do setor elétrico, por exemplo. Em Jirau, a Camargo Corrêa, que já deteve 9,9% da sociedade da usina, prestava serviços na construção da hidrelétrica na Amazônia. Vizinha no Rio Madeira, a usina de Santo Antônio, que tem a Odebrecht como sócia, também foi erguida com os serviços da empreiteira.
"Isso realmente é uma preocupação nossa. Estamos discutindo o tema no TCU, para que haja ao menos uma governança mais robusta sobre essas sociedades", disse o ministro Bruno Dantas ao jornal
'O Estado de S. Paulo'
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Para o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic), José Carlos Martins, a proibição seria uma "invasão na esfera privada", mas a situação requer mudanças. "O TCU pode recomendar que os contratos tragam cláusulas que evitem o controle absoluto de sociedades por empreiteira. Isso reduziria sua força da decidir sozinha sobre quem contratar para realizar o projeto", diz.
Segundo Carlos Campos, coordenador de infraestrutura do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o modelo atual é a prova de que as regras precisam mudar. "O que vimos nos aeroportos era óbvio desde o início, com a Infraero completamente subordinada à administração do setor privado. Isso precisa mudar. É preciso buscar formas de restringir essa subcontratação".
Segundo Bruno Dantas, o trabalho ainda está em análise e uma proposta deve ser levada em breve ao plenário da corte de contas.
As empreiteiras não comentam o assunto. A Infraero não retornou os pedidos de entrevista. Em 2016, uma auditoria interna realizada pela estatal constatou que as obras de expansão de Guarulhos e Viracopos, iniciadas em 2012, teriam custado R$ 1,316 bilhão a mais que o preço médio do mercado.
A auditoria investigava possíveis irregularidades em uma série de contratações feitas pelas concessionárias que administram os dois aeroportos paulistas, todas elas com o aval da Infraero. Na ocasião, a Infraero atribuiu as aprovações de contratos com valores acima dos preços de mercado às decisões da "administração anterior", mas não explicou por que deixou de realizar o levantamento detalhado de custos antes de as contratações serem aprovadas pelas concessionárias. As informações são do jornal
O Estado de S. Paulo.
(André Borges)