São Paulo – Blockchain. Grave bem esse nome. Caso se confirmem as previsões, em um futuro muito próximo ele será reconhecido como a nova revolução tecnológica, só comparável ao que se viu com o início da internet. O Blockchain (corrente de blocos, em tradução literal), mais conhecido como a tecnologia que está por trás das negociações com moedas digitais, as chamadas criptomoedas, tem potencial para transformar a forma de guardar e armazenar dados em blocos sequenciais de forma segura.
Além disso, como são movimentações públicas, elas podem ser vistas e auditadas por qualquer pessoa. “Essa forma de guardar dados de maneira pública e segura permite que a tecnologia seja aplicada a uma série de outras aplicações e não só em moedas digitais”, afirma Gustavo Chamati, fundador e atual CEO do Mercado Bitcoin e especialista no assunto.
Segundo Chamati, é consenso entre os especialistas que o potencial de aplicação da tecnologia blockchain é muito grande, especialmente na utilização para armazenar registros públicos de contratos, ou identidade, e históricos que precisam de checagem. O problema, diz ele, é que a tecnologia ainda não tem escalabilidade, ou seja, qualquer crescimento exponencial de demanda poderá causar demora na leitura dos registros, como já aconteceu nas negociações com as transações com Bitcoin, onde tudo começou.
Para Omarson Costa, outro especialista em tecnologia, com o Blockchain as casas bancárias e câmaras de compensação deixam de ser os únicos veículos seguros e com credibilidade para efetuar pagamentos e até mesmo emitir e colocar moedas no mercado, que serão substituídas por notas digitais ou outras não lastreadas, como a precursora Bitcoin.
“Da mesma forma que até hoje depositamos nossa crença cega nos bancos, entregando a eles todas as nossas economias, e que aceitamos e recebemos nossos salários em réis, cruzeiros, cruzados, reais, dólares ou euros, surgirão rapidamente novos modelos monetários sustentados por tecnologias digitais de segurança que irão aposentar a velha e surrada carteira de couro para levar nosso suado dinheirinho para digital wallets no smartphone, no relógio ou algum outro equipamento conectado ao corpo”, prevê Costa.
Da mesma maneira que hoje os investidores trocam Biticoins, no futuro vamos poder trocar, ou adquirir imóveis, por exemplo, utilizando a mesma tecnologia, diz Rosine Kadamani, criadora da Blockchain Academy, projeto educativo voltado para o desenvolvimento e formação de empreendedores na nova tecnologia.
Segundo ela, grandes empresas, bancos e bolsas de valores de todo o mundo já estão investindo pesado para desenvolver projetos ancorados na nova tecnologia. “Vamos ter uma legislação para regular esses negócios. Não é pouca coisa”, diz Rosine, lembrando que em breve surgirá um sistema financeiro paralelo que não vai passar pelo setor bancário tradicional. Nesse caso, as fintechs já são uma realidade e só estão começando. “Os bancos terão que reestruturar seus modelos de negócio, assim como outros intermediários, como cartórios e bolsas. As trocas na internet vão incluir todas os produtos e serviços”, diz ela.
O advogado Renato Opice Blum, coordenador do cursos de direito digital do Insper, alerta para várias questões legais que podem atrapalhar a disseminação da nova tecnologia. Ele cita a Lei europeia, que entra em vigor na sexta-feira, e que não autoriza o armazenamento de informações que não podem ser modificadas.
Como o Blockchain não permite mudanças após ser armazenada, e o Brasil deverá seguir a legislação da Europa, ele acha que vai haver dificuldades para a nova tecnologia ganhar espaço. “Vamos ter que fazer ajustes na lei”, diz ele. Quanto aos cartórios, que hoje são os maiores intermediários na venda de bens móveis e imóveis, ele considera que essas instituições terão que adotar plataformas próprias de Blockchain. “É uma tecnologia mais barata e mais simples, mas sua adoção ainda é muito complexa”, afirma o advogado.
Na questão dos bancos, Omarson Costa lembra ainda que os correntistas já estão acostumados a acessar e movimentar a conta pelo celular, o que ajudou bastante a adesão as fintechs, que começam a ficar cada vez mais populares. Atualmente, com poucos toques no aplicativo, seja lá qual for a unidade monetária, fazer transferências de recursos peer-to-peer, liquidar contas, investir, comprar produtos com promoções exclusivas criadas especialmente para seu perfil, pagar o Uber ou o Airbnb, são aplicações comuns entre os usuários mais jovens. “A digitalização monetária, como toda tecnologia disruptiva, gera inicialmente muita polêmica, mas sua implementação é inevitável em uma economia cada vez mais dependente da web e da expansão do mobile”, afirma o especialista.
Tanto que bancos centrais de diversos países já declararam a intenção de emitir suas próprias moedas digitais, o que demandaria o crescente desenvolvimento e adoção da tecnologia blockchain para garantir a segurança das transações.
SEGURANÇA No Brasil, a Febraban, federação que reúne os bancos brasileiros, formou uma comissão para debater a regulamentação das instituições digitais que não têm agências físicas e a abertura de contas pela internet, sem contato pessoal com o gerente – todas as operações são feitas no ambiente on-line.
A preocupação da entidade é garantir a segurança nas transações, o que tem levado a um maior interesse por parte das instituições na blockchain e na realização de testes da nova tecnologia. Empresas como Microsoft, Amazon e IBM também estão se estruturando para atender a nova tecnologia, seja com soluções ou até como mantenedores da plataforma Blockchain.