Brasília, 24 - Começa a ganhar força no setor de transporte de cargas o entendimento de que a polêmica tabela que estabelece preços mínimos para o frete não está em vigor. Essa é uma das teses que serão usadas pelas transportadoras que estão descumprindo o tabelamento determinado pelo governo. Como o jornal O Estado de S. Paulo mostrou na última sexta-feira, 22, diante do impasse em torno da tabela que travou o transporte de mercadorias e matérias-primas em todo o País, algumas transportadoras passaram a ignorar o preço mínimo, mesmo correndo o risco de serem punidas.
A tabela do frete teve uma primeira versão publicada no dia 30 de maio, na forma de um anexo da Resolução 5820 da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), como parte do acordo que encerrou a paralisação dos caminhoneiros. As empresas reagiram duramente contra ela e pressionaram o Planalto, que prometeu corrigir falhas e publicar uma segunda versão.
No dia 7 de junho, a resolução 5821 alterou o texto da 5820. Essa norma foi publicada numa edição extraordinária do Diário Oficial, tamanha sua urgência. Mas, em questão de horas, os caminhoneiros estavam no gabinete do ministro dos Transportes, Valter Casimiro, protestando.
No dia seguinte, uma nova resolução revogou a 5822, como prometido pelo ministro aos caminhoneiros. "Isso virou uma novela", comentou à época o líder dos autônomos Wallace Landim, o Chorão. Para o governo, o resultado de tudo isso é que está em vigor a primeira tabela, a da Resolução 5820. Esse é o entendimento da ANTT.
Mas, no mercado, circula o entendimento de que a tabela da Resolução 5820 foi revogada pela 5821 e não foi restabelecida pela 5822. "A tabela não pode ressuscitar assim", diz o advogado Frederico Favacho, da Favacho Advogados, que assessora a Associação Nacional de Exportadores de Cereais (Anec). "Não existe esse efeito Walking Dead."
Ele explica que, quando uma primeira lei é revogada por uma segunda e essa segunda, por sua vez, é revogada por uma terceira, a primeira lei não volta a existir automaticamente. A menos que a terceira lei diga explicitamente que a primeira volta a vigorar. Essa regra se aplica a leis. Para normas administrativas, como é o caso das resoluções da ANTT, é algo que se discute.
Essa tese é uma base a ser usada na defesa de empresas que não estão observando a tabela de frete. Muitas das que atuam na exportação de grãos, por exemplo, têm contratos de serviços de transporte assinados antes da paralisação, com preços inferiores aos da tabela, segundo informou o diretor executivo do Movimento Pró-Logística da Associação dos Produtores de Soja e Milho (Aprosoja), Edeon Vaz Ferreira.
Favacho observou também que não há nenhuma multa por parte do governo para empresas que não cumprirem a tabela. O que há na Medida Provisória (MP) 832, que instituiu a política de preço mínimo para o frete rodoviário, é uma previsão que o caminhoneiro seja indenizado no equivalente ao dobro da diferença entre o preço de tabela e o efetivamente cobrado. Mas, para isso, ele precisará recorrer à Justiça.
A tese da inexistência de tabela é uma discussão que corre em paralelo às ações de inconstitucionalidade da MP 832 no Supremo Tribunal Federal (STF), sob a relatoria do ministro Luiz Fux. Na próxima quinta-feira, ele fará uma nova tentativa de conciliação entre caminhoneiros e empresas.
Caso não haja acordo, ele promete reavaliar sua decisão de suspender o andamento de todas as ações que discutem a constitucionalidade da MP. Algumas associações haviam conseguido liminares suspendendo os efeitos da tabela. Mas essas decisões foram sustadas por Fux. O jornal O Estado de S. Paulo questionou a Advocacia-Geral da União (AGU) sobre o assunto, mas não obteve resposta. As informações são do jornal
O Estado de S. Paulo.
(Lu Aiko Otta)