São Paulo – O mercado brasileiro de games não quer saber de PIB em baixa, riscos políticos ou oscilações do câmbio. Esse é um setor que expande suas fronteiras independentemente das condições da economia do país. Dados divulgados recentemente pela Newzoo mostram que o país contava em 2017 com cerca de 66,3 milhões de jogadores. Os negócios nessa área movimentaram em torno de US$ 1,3 bilhão. Com isso, o Brasil já é o 13º no ranking global e o número um entre os latino-americanos. Para este ano, segundo a pesquisa, serão 75,7 milhões de gamers que devem gerar US$ 1,5 bilhão em negócios.
O estudo completo, financiado pelo Ministério da Cultura, deverá ser publicado em agosto. Os primeiros dados mostram que o Brasil tem 375 empresas no segmento de produção de games. Esse número representa um crescimento de 180% em comparação aos dados de quatro anos atrás, quando o censo foi patrocinado pelo BNDES e aponto para um total de 133 empresas.
Governo
Com isso, além do próprio Ministério da Cultura, também a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil) decidiu criar uma área para estimular a participação de empresas de games em eventos internacionais e assim abrir novos mercados, além de atrair investidores. Recentemente, a agência e a Associação Brasileira das Desenvolvedoras de Jogos Digitais (Abragames), em parceria com a consultoria Euromonitor, elaboraram o estudo “China- Mercado de games 2018”. O levantamento mostra que 800 milhões de chineses são usuários da internet – quase quatro vezes mais que a população do Brasil. Desse total, 600 milhões contam com acesso à conexão móvel e por volta de 400 milhões passam o tempo jogando pelo celular.
Para a Apex-Brasil, o mercado chinês representa uma gigante oportunidade para os desenvolvedores brasileiros. Só em 2016 as vendas de jogos para smatphone movimentaram US$ 24 bilhões, enquanto que os games online geraram vendas estimadas em US$ 11,7 bilhões. Cerca de 40% dos games consumidos na China são dos Estados Unidos, 25% são produzidos na Coreia do Sul, 10% saem das empresas francesas e 5% são japoneses, um dos mercados mais maduros do mundo.
Japão
É justamente no Japão que a brasiliense Behold Studios deve desembarcar em agosto. A desenvolvedora de games foi fundada em 2009 e naquela época seus sócios se dedicavam ao mercado de games sob demanda, usados em publicidade e em treinamentos. Os empreendedores, no entanto, sonhavam com projetos mais autorais. No fim de 2011, a empresa passou por dificuldades financeiras e teve de ser fechada.
Cada sócio encontrou um outro trabalho e nas horas vagas se dedica ao projeto de um game. No ano seguinte, eles conseguiram lançar o primeiro game, o Knights of Pen & Paper. Hoje já são seis jogos, comprados nas plataformas da Apple e do Google, e traduzidos para idiomas como inglês, alemão, italiano, polonês, espanhol, francês, e a partir de agora em japonês.
Hugo Vaz, diretor de arte e sócio da Behold Studios, conta que os jogos da desenvolvedora já foram baixados cerca de 3 milhões de vezes e os brasileiros representam aproximadamente 10% dos jogadores. Além da chegada ao mercado japonês, no ano que vem a empresa deve apresentar ao mercado mais um jogo, desenvolvido com recursos obtidos em um edital da Ancine. “Nosso objetivo como empresa é demonstrar a nossa força como brasileiros para toda a comunidade internacional, atrair investidores e assim conseguir desenvolver jogos cada vez mais complexos”, diz.
Custo menor
Parte da expansão dos games no Brasil tem a ver com a redução do valor cobrado por pacotes de dados para internet, explica Carlos Giusti, sócio da PwC. “Esse mercado cresce a medida que o preço da banda fica mais acessível. Segundo estudo, em 2022 a indústria brasileira de games vai representar mais do que a de livros, música ou cinema em termos de geração de receita. “É uma mudança de hábito que vem se consolidando graças ao acesso cada vez mais fácil”, diz.
De acordo com o estudo da PwC, o mercado de games tem crescido a uma taxa média de 15% ao ano, ou seja, bem descolado do comportado do PIB. Além da queda do preço dos serviços de dados, explica Giusti, também tem ajudado a estimular a adesão de novos jogadores a melhoria da rede de alta velocidade no Brasil. Isso tem permitido o acesso cada vez maior. Hoje, lembra o executivo, cerca de 60% dos celulares do Brasil têm banda larga. Em cinco anos, essa participação deverá chegar a 80%.
Ainda segundo a PwC, no ano passado os jogos de celular movimentaram US$ 324 milhões no Brasil, contra US$ 314 milhões dos PCs (jogados em rede), US$ 211 em consoles e US$ 1 milhão em campeonatos esportivos de games. Em 2022, projeta a companhia, os jogos por celulares deveram gerar US$ 878 milhões de receita, os PCs chegarão a US$ 534 milhões, os consoles serão responsáveis por US$ 269 milhões e os campeonatos abocanharão US$ 3 milhões. Os dados da PwC indicam que o mercado nacional faturou US$ 884 milhões em 2017 e deverá atingir US$ 1,756 bilhão até 2022.
No celular e em campo
Os jogos em smartphone já representam metade desse mercado e os consoles ficam com cerca de 30% no caso do público feminino e 37% entre os homens. Já os PCs respondem por 38% e 44%, respectivamente. E nesse contexto de expansão global que se inserem, por exemplo, as cenas vistas em comemorações de gols durante o Mundial da Rússia.
O campeão francês Antoine Griezmann, por exemplo, ainda nas oitavas de final na partida contra a Argentina, fez uma referência ao Fortnite, um dos games mais populares do momento, ao executar em frente às câmeras a dança do “Tale the L”. O jogo Counter-Strike (CS): Global Offensive levou Neymar e parte da equipe brasileira a exibir uma coreografia no gol contra o México.
Parte do desenvolvimento desse mercado virá dos avanços tecnológicos, explica Giusti. Empresas como Google e Apple, segundo o executivo, têm investido pesado em soluções de games mais complexos e atraentes. Entre eles, aqueles com realidade aumentada. O executivo da PwC acrescenta que há uma outra característica importante que explica o desenvolvimento rápido dessa indústria em termos globais.
Os jogos baixados em celulares têm um valor unitário muito baixo. No caso da brasileira Behold Studios, por exemplo, um game custa entre R$ 20 e R$ 30. Esses são chamados de sistema premium, em que o jogador paga apenas uma vez e joga quanto quiser. Outra modalidade freemium, em que o gamer baixa o arquivo sem custo, mas se precisar avançar etapas mais difíceis ou ter uma melhor performance terá de fazer algum desembolso. “Por conta desse investimento muito baixo para jogar, essa não é uma indústria sensível à crise do país. Ao contrário, a medida que as pessoas ficam sem dinheiro para outro tipo de entretenimento acabam encontrando nos games uma alternativa econômica”, avalia Carlos Giusti, sócio PwC.
Games
O mercado brasileiro
» 75,7 milhões de jogadores
» US$ 1,5 bilhão em negócios
» 13º lugar é a posição do Brasil no ranking global do setor
» 1º lugar entre os latino-americanos