San Francisco – Um nome polêmico, lucros crescentes: esse é o retrato do gigante agroquímico americano Monsanto, que deverá pagar cerca de US$ 290 milhões a um jardineiro americano por não ter informado sobre os riscos de seu herbicida Roundup. A decisão histórica foi tomada por um júri de San Francisco, no estado norte-americano da Califórnia, que considerou que a companhia agiu com “malícia” e que o herbicida, assim como sua versão profissional RagenrPro, contribuíram “substancialmente” para a doença terminal do trabalhador californiano Dewayne Johnson.
Classificado como “cancerígeno provável” pela Organização Mundial de Saúde (OMS) desde 2015, o glifosato é o pesticida mais usado no mundo. Lançado em 1976, o Roundup é o mais conhecido deles. “Recebi muito apoio desde o começo deste caso, muitas orações e energia de pessoas que sequer conheço. Estou contente de poder ajudar em uma causa que vai além de mim. Espero que esta decisão dê ao assunto a atenção que necessita”, declarou Johnson após o resultado no tribunal.
Após oito semanas nos tribunais, o júri ordenou à companhia pagar US$ 250 milhões em danos punitivos com danos compensatórios e outros custos, levando o total a quase US$ 290 milhões. Johnson, de 46 anos, sofre de um linfoma não Hodgkin incurável, que ele atribui ao fato de ter usado repetidamente RoundUp e RangerPro durante seu trabalho em uma escola entre 2012 e 2014. Esta foi a primeira vez que a Monsanto, comprada pela alemã Bayer, foi ao banco dos réus pelos potenciais efeitos cancerígenos desses produtos que contêm glifosato, uma substância controversa.
FUSÃO BILIONÁRIA Em 2017, o lucro líquido da empresa foi de mais de US$ 2 bilhões, com um volume de negócios de cerca de US$ 15 bilhões. Depois de ter elevado três vezes sua oferta de compra, a Bayer finalmente pôs sobre a mesa mais de US$ 60 bilhões para adquirir uma empresa norte-americana. Uma vez concluída a megafusão, o grupo alemão rapidamente informou que a marca Monsanto seria abandonada.
Há décadas, o nome Monsanto tem sido associado a produtos controversos por seus efeitos sobre os seres humanos e sobre o meio ambiente, principalmente o Roundup, que contém glifosato. Fundada em 1901, em St. Louis, no Missouri, a Monsanto começou produzindo sacarina, um potente adoçante, para, em seguida, lançar-se na agroquímica a partir da década de 1940.
A Monsanto tem sido associada à fabricação, junto com outros grupos químicos, do desfolhante conhecido como Agente Laranja, usado pelo Exército dos EUA durante a Guerra do Vietnã. Seu principal e controverso pesticida, o Roundup, foi lançado em 1976. Depois, a Monsanto desenvolveu a primeira célula vegetal geneticamente modificada, antes de se especializar em transgênicos. As primeiras sementes geneticamente modificadas, concebidas para resistir ao Roundup, são vendidas desde a década de 1990.
O Roundup contém glifosato, uma substância muito polêmica que é objeto de estudos científicos conflitantes quanto à sua natureza carcinogênica. Também é acusado de ser prejudicial ao meio ambiente, de contribuir para o desaparecimento das abelhas, ou de ser um disruptor endócrino. O glifosato é o pesticida mais usado no mundo sob várias marcas, desde que a patente da Monsanto se tornou pública em 2000.
DEFESA DO GLIFOSATO No dia seguinte à condenação da Monsanto, o grupo farmacêutico Bayer declarou ontem que o glifosato é “seguro e não cancerígeno”. Apesar da decisão judicial que pode estabelecer jurisprudência, o grupo farmacêutico alemão não vai parar a produção do glifosato, usado em nível global na agricultura por sua eficácia e baixo custo. “Baseando-se em provas científicas, avaliações regulamentadoras em escala mundial e em décadas de experiência prática do uso do glifosato, a Bayer estima que o glifosato é seguro e não cancerígeno”, declarou um porta-voz da companhia.
Polêmica ronda o Brasil
O Projeto de Lei 6.299/2002, que altera a legislação sobre agrotóxicos no Brasil, apelidada de Pacote do Veneno na Câmara dos Deputados, sugere mudança na nomenclatura dos agrotóxicos, que passariam a ser chamados de “produtos fitossanitários”. O argumento dos ruralistas é de que há “preconceito” no termo atual. Além disso, eles afirmam que o país deve se adequar à expressão utilizada em outros países (em inglês, agrotóxicos são chamados de pesticidas). O registro de novos produtos passaria a ser centralizado no Ministério da Agricultura, em vez do controle atual que é feito por três órgãos: Ministério da Saúde, Ibama e o próprio Ministério da Agricultura.