A vida de um ministro da Fazenda em um país que trocou de moeda cinco vezes desde a redemocratização não é simples. Por trás do improviso em torno do Plano Cruzado, em 1986, passando pelo Plano Real, que não estava totalmente pronto às vésperas de seu lançamento, até as decisões que culminaram na última e mais longa recessão da economia brasileira estão os ocupantes de um dos cargos mais desafiadores do governo.
Os bastidores de quem foi protagonista da história econômica do Brasil são contados pelo jornalista e consultor Thomas Traumann no livro O Pior Emprego do Mundo, que será lançado nesta terça-feira, às 19h, na livraria Saraiva do Shopping Eldorado, em São Paulo.
No volume, o autor desvenda as passagens de 14 ex-ministros pelo Ministério da Fazenda, desde o fim da década de 60, e como suas decisões, nem sempre acertadas, afetaram a vida real dos brasileiros e selaram o futuro dos governantes.
"O livro é sobre a tensão que invariavelmente existe entre presidente e ministro da Fazenda, que é quase um primeiro-ministro, mais poderoso do que os outros. Esse excesso de autoridade é o que torna essa relação tão complexa quanto interessante", diz.
Do superpoderoso Delfim Netto, durante a ditadura militar, ao rápido sucesso e amargo fracasso do Plano Cruzado, de Dilson Funaro, o ministro da Fazenda aparece ora como mágico executor de promessas do presidente, ora como portador de más notícias.
É ele quem está no centro da manutenção do equilíbrio de forças entre o Congresso Nacional e o Palácio do Planalto e é um dos primeiros a serem postos em xeque quando as coisas parecem que já não vão tão bem.
Comandar a economia brasileira, na visão do autor, se compararia à lenda de Dâmocles - o cortesão que experimentou um dia de rei, mas tinha sobre si uma espada afiada e só segura por um fio. Para ele, o cargo de ministro da Fazenda é, de certa forma, o pior emprego do mundo.
Aos 51 anos, Traumann foi ministro da Secretaria de Comunicação Social no governo Dilma Rousseff. Atualmente, é consultor e participa de pesquisas na Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Poder. A ideia inicial, conta o autor, era escrever sobre Brasília para os brasileiros, explicar para quem não vive os bastidores da República como as engrenagens do poder se movem. "Em seguida, resolvemos fazer um recorte, para mostrar como o poder funcionava a partir de um cargo."
No livro, ele relata como a desvalorização cambial, no início do segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso, erodiu sua popularidade. Na época, a estratégia foi acusada pelo PT de ser um "estelionato eleitoral" - termo que assombraria o partido no futuro após a reeleição de Dilma Rousseff.
Ministro da Fazenda da petista, o economista Nelson Barbosa diz: "Tem quem ache que o problema foi que ela ganhou a eleição com uma estratégia econômica e depois fez outra. Pois acho que a estratégia que ganhou a eleição também estava errada".
Bastidores
Outros trechos do livro são reveladores de como o destino do País é selado por trás das câmeras. Foi em uma reunião secreta, após ganhar a eleição de 2002, que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu quem comandaria a economia. Lula disse a Antonio Palocci, José Dirceu e Aloizio Mercadante que dali sairia o ministro da Fazenda e o chefe da Casa Civil de seu futuro governo. Que os três decidissem entre si.
Traumann lembra que as crises - que abateram Collor e Dilma, ameaçaram Fernando Henrique Cardoso e desidrataram o poder já cambaleante de José Sarney - tiveram a economia como estopim. E o sucesso ou fracasso de sua recuperação como pano de fundo.
Ele diz que há três tipos de ministro da Fazenda: o que tem autonomia quase irrestrita (como FHC tinha com Itamar Franco), o que vive em um conflito com outra área do governo, mediado pelo presidente (como Antonio Palocci e Lula), e o que tem menos espaço para agir (caso de Guido Mantega e Dilma).
Alvo de pressões de todos os lados, a pasta também ajuda a revelar a personalidade de seus ocupantes. Rubens Ricupero caiu, em 1994, ao ter captada por antenas parabólicas em entrevista à TV Globo a frase: "O que é bom, a gente fatura; o que é ruim, esconde".
Seu substituto no cargo, Ciro Gomes, ao comentar o sobrepreço na venda de carros, disse que quem pagava ágio era "otário" e quem cobrava, "ladrão". Ambos são obrigados a explicar essas frases até hoje. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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