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Estado de Minas ENTREVISTA/WALTER SCHALKA

'Se o Brasil mudar, pode crescer 6% ao ano', diz executivo da Suzano Papel e Celulose

Para o executivo, próximo governo terá de enfrentar reformas e abandonar antigos modelos


postado em 05/11/2018 06:00 / atualizado em 05/11/2018 08:45

(foto: Divulgação)
(foto: Divulgação)

São Paulo – Walter Schalka, presidente da Suzano Papel e Celulose, está otimista com a possibilidade de o novo governo fazer as reformas necessárias para tornar a máquina do Estado mais eficiente e retomar o crescimento da economia.

Segundo ele, para chegar a essa meta será preciso atacar várias frentes, cortando privilégios tanto de empresas, que recebem subsídios, quanto do funcionalismo público – inclusive dos militares.

“Não tem sentido um militar se aposentar aos 45 anos de idade com salário pleno”, afirma Schalka, em entrevista ao Estado de Minas na quinta-feira, pouco antes de o novo governo dar sinais de que poderia voltar atrás na fusão entre os ministérios do Meio Ambiente e Agricultura.

O executivo da Suzano é contra essa possibilidade de junção das duas pastas e defende uma decisão na direção oposta, já que a biodiversidade brasileira é justamente um de seus diferenciais. “Essa história de devastar a Amazônia é um erro brutal que nós não podemos nem pensar em incorrer”, diz. “Sou a favor de dar ao meio ambiente um papel fundamental no desenho macroeconômico e político global que o Brasil tem.”

Quem é Walter Schalka

Presidente da Suzano Papel e Celulose desde janeiro de 2013, o executivo conduziu recentemente a operação de compra do controle da Fibria. Juntas, as companhias terão capacidade de produção de 11 milhões de toneladas por ano. Sua carreira começou no setor financeiro, no Citibank.

Schalka teve ainda passagens pelo Grupo Dixie Toga e Votorantim Cimentos. O executivo é engenheiro formado pelo ITA e tem pós-graduado em Administração de Empresas pela Fundação Getulio Vargas de São Paulo (FGV-SP). Participou de cursos de Especialização e Aperfeiçoamento nos Institutos IMD (Suíça) e Harvard (EUA).

Quais são as primeiras medidas que o novo governo deve tomar para estimular a economia?
Minha percepção é que o Brasil vai ter de passar por múltiplas reformas. A primeira reforma e a mais importante de todas é a do Estado brasileiro. O Estado é absolutamente ineficiente e nós precisamos ter um ganho de produtividade significativo na gestão do que representa aproximadamente 40% da economia brasileira, que é o Estado. Temos de fazer uma reforma para ganhar produtividade, digitalizar muito mais e dar uma eficiência muito maior ao gasto público. Para fazer isso, nós teremos que pensar ou em privatizar uma parte (do patrimônio) ou mudar o sistema operacional que nós temos no país, principalmente a questão da estabilidade do servidor público. Essa estabilidade, na minha opinião, gerou com o tempo uma perda de eficiência muito grande.

O que mais deve ser feito para retomar o crescimento do país?
A segunda reforma que tem de ser feita é a previdenciária. É insustentável esse déficit público. O Brasil precisa buscar o equilíbrio das contas públicas e para fazer isso é preciso passar obrigatoriamente pela reforma previdenciária. Nesse quesito, há dois pontos fundamentais. Um é a idade mínima e o outro é a reforma da previdência do setor público. O problema só será resolvido com a combinação da reforma nessas duas frentes.

Como ficam os militares na reforma da previdência?
Pela análise econômica, os militares também têm de passar pela reforma. Não tem sentido um militar se aposentar aos 45 anos de idade com salário pleno. Essa pessoa vai viver até os 80 anos e vai receber 35 anos de salário pleno. Isso não existe na iniciativa privada. Temos, sim, de diferenciar os militares, mas na idade em que vão se aposentar. É justo que se aposentem antes porque eles têm um nível de risco de morte muito maior, mas sem receber na aposentadoria o salário pleno. E depois ainda passam isso para os filhos ou esposa. Isso não existe em nenhum lugar do mundo. A reforma tem de ser para todos, inclusive para os militares.

"Não tem sentido um militar se aposentar aos 45 anos de idade com salário pleno"



Onde mais as reformas devem ser feitas?
O sistema tributário brasileiro entrou em exaustão, por isso a reforma é muito importante como um caminho para atacar parte do problema, reduzindo o número de impostos e sendo mais eficientes na sua cobrança. Tem muita gente que não paga imposto, mas todos deveriam pagar.

A revisão da concessão de subsídios à indústria deve entrar na pauta?
A redução dos subsídios também é necessária. Neste ano, se não me engano, tivemos R$ 287 bilhões em subsídios. Isso não tem o menor sentido. O sistema de cooperativismo e de patrimonialismo no Brasil, em que alguns têm benefícios sobre os outros, precisa acabar. É preciso reduzir os subsídios para todos. Dou como exemplo o Simples, que como conceito foi muito bom, mas depois foi desvirtuado longo do tempo. Hoje há empresas que têm dez simples como forma de não estourar a cota e não ter de pagar imposto. Nós temos de acabar com isso. Hoje o Brasil abre mão de R$ 80 bilhões por ano no Simples, R$ 60 bilhões na Zona Franca de Manaus. Com esse valor dá para fazer qualquer coisa para a população que está na Zona Franca de Manaus.

Como seria esse corte de subsídios?
Na minha percepção, é preciso reduzir não só esses subsídios, mas todo o grupo de subsídios tem que ser reduzido dramaticamente. Não acredito que seria necessário tender a zero, porque alguns setores específicos, que não é o meu, para deixar muito claro, precisam ter algum tipo de subsídio. Agora, por exemplo, estão discutindo o plano 2030, da indústria automotiva. Não faz o menor sentido dar incentivo para montadora. Tem empresa de refrigerante que tem subsídio. Qual é a lógica? Nós precisamos acabar com isso. Esse conjunto de ações vai permitir liberar muito dinheiro porque alcançaremos um nível de superávit com esses quatro grupos de ações que levarão a algo fundamental, que é a possibilidade de o Estado voltar a investir e gerar muito emprego. O Brasil tem de investir muito em infraestrutura e em itens básicos, como educação e saúde. É preciso colocar recursos em estradas, em portos, na digitalização. Para isso, só com a liberação de recursos. O Brasil tem hoje 98% da arrecadação comprometida, portanto não tem espaço para investir.

A possibilidade de incorporação do Ministério do Desenvolvimento (MDIC) pelo Ministério da Fazenda, ou da Economia, como vem sendo chamado pelo novo governo, é boa ou ruim para o setor produtivo?
Não acho que essa seja uma discussão para fazermos. O que importa não é onde estará a pasta, mas como será conduzido o processo. Para mim, essa coisa de as pessoas defenderem seus feudos não é o mais importante. A agricultura é muito importante, a indústria e o meio ambiente. Mas se a indústria vai ser secretaria ou ministério, não é o mais importante para discutir. Mas sim que tipo de competitividade nós vamos gerar para a indústria brasileira e que não seja por meio de subsídio.

"O sistema de cooperativismo e de patrimonialismo no Brasil, em que alguns têm benefícios sobre os outros, precisa acabar"



A indústria brasileira se acomodou com a ajuda por meio de subsídios ou esse tipo de auxílio é necessário em qualquer economia?
Como a carga tributária é absurda e o custo/Brasil é muito grande, a indústria perdeu competitividade. Para mitigar isso deram subsídios. Tem que retirar as duas coisas ao mesmo tempo. Tira o custo tributário das empresas e em contrapartida tira subsídio também. Mas o que está acontecendo é que para mitigar o custo/Brasil é necessário dar subsídio. No exterior, uma empresa tem uma, duas pessoas fazendo sistema de cálculo de imposto. Já no Brasil são dezenas de pessoas para a mesma função.


Pelo histórico que temos no país, você tem confiança que é possível fazer essas mudanças?
Tenho muita confiança. O que qualquer presidente de empresa faz quando assume o cargo, além de fazer um plano estratégico? Olha quais são os custos e tenta reduzi-los, o que resulta em aumento de lucratividade. O que o Brasil faz para reduzir custos? Nada! O Brasil vive naquele esquema que tem que dar aumento atrelado à inflação todos os anos, que precisa remunerar os funcionários públicos, que são mal remunerados. E ganham pouco por quê? Porque são muitos e, no geral, ineficientes. É um jogo muito perverso que existe no Brasil. Dá para colocar essas mudanças em prática imediatamente, não precisa de quatro anos. Os efeitos não serão no curtíssimo prazo, mas se mudar o modelo eu posso garantir que os investimentos aqui vão ser descomunais e o crescimento será absurdo. Se o modelo for mudado, o país vai sair de um crescimento marginal de PIB (Produto Interno Bruto), de 1% a 2% para um crescimento de 5% a 6% ao ano.

A recuperação do país levará muito tempo?
Depende de como vão ser as ações. Se o governo for na direção e com a velocidade correta, o crescimento será muito rápido, porque o país está muito pronto para as reformas. Se não, nós vamos ficar nesse voo de galinha.

Este é o momento para o Brasil tomar partido de algum país ou virar as costas para algum parceiro comercial?
O dinheiro é muito fluído no mundo. O país precisa demonstrar com ações, não com discursos, que quer se inserir globalmente. Se fizer isso, o dinheiro virá naturalmente, porque há muita liquidez. O Brasil não precisa fazer nada para melhorar as relações. Se as reformas forem feitas, o país vai ter um nível de crescimento que vai poder gerar qualidade de vida para todos.

O que você acha dos primeiros sinais do novo governo sobre comércio exterior, que poderiam interromper as relações com o Mercosul e criar barreiras às aquisições por empresas chinesas?
Eu acho um absurdo. O Brasil tem relação com o mundo todo, por isso não deveria colocar a questão política acima da questão econômica. A China é um parceiro fundamental e o Mercosul também, por isso eu não abriria mão de nenhum parceiro. O mundo busca convergências, e é isso que nós devemos buscar.

A Suzano é uma grande exportadora. Como as relações exteriores devem ser conduzidas para melhorar a inserção do Brasil no comércio internacional e minimizar os efeitos colaterais de uma guerra comercial entre EUA e China?
O Brasil infelizmente tem muito pouca inserção na economia global. Isso precisa mudar, para isso é preciso buscar competitividade. Sem isso, o país vai ficar sempre como potência não realizada, com baixo nível de crescimento. Vai ficar vivendo em uma bolha, como um exportador de commodity, o que é muito ruim. O Brasil tem de agregar muito mais valor aos seus produtos. O efeito da guerra comercial no curto prazo é pequeno. Mas se houver um decréscimo no comércio global, isso vai afetar fortemente o nosso país.

"O Brasil precisa demonstrar com ações, não com discursos, que quer se inserir globalmente"



A euforia quanto a expectativa de eleição de Bolsonaro impulsionou a Bolsa. Isso deve continuar?
Se o Brasil fizer as reformas, o dinheiro virá e a Bolsa vai subir. Mas se isso não acontecer, a Bolsa vai cair.

A fusão entre Suzano e Fibria acontece em um período peculiar, tanto na política quanto na economia do país. Isso pode demandar mais tempo até que os planos de crescimento da nova companhia possam ser definidos?
Não, a Suzano é uma empresa de 94 anos, nunca deixou de investir em nenhum momento do Brasil e vai continuar investindo para aumentar a sua competitividade e a sua capacidade. Isso não muda nada. O que muda é como está o mercado global de papel e celulose, não o cenário eleitoral do país

A possibilidade de fusão das pastas da Agricultura e Meio Ambiente, como foi cogitada pelo presidente eleito, é boa ou ruim?
Sou contra essa aglutinação da Agricultura e Meio Ambiente, muito contra. O meio ambiente é um fator extremamente relevante para o Brasil. Nosso país tem de exercer um papel muito mais relevante globalmente nessa área. A Amazônia tem um papel fundamental para o mundo e nós temos de saber como colocar essa relevância de forma adequada para o mundo. Essa história de devastar a Amazônia é um erro brutal que nós não podemos nem pensar em incorrer. Sou a favor de dar ao meio ambiente um papel fundamental no desenho macroeconômico e político global que o Brasil tem. Temos de produzir valor para a sociedade inteira, não para poucos.

 

 


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