São Paulo – Todo mundo adora receber um pacotinho da Amazon, mas os nova-iorquinos, pelo menos, querem a sede da empresa bem longe da cidade. Para a loja que entrega tudo on-line, construir novos pontos para abrigar seu exército de trabalhadores se tornou um pesadelo de relações-públicas.
Um mês depois de anunciar que a sua nova sede vai ser dividida entre a cidade de Nova York e Arlington, esta última a apenas oito quilômetros de distância da capital, Washington, a companhia enfrenta uma forte reação contrária na Big Apple, com direito a protestos na prefeitura, críticas de conselheiros municipais e questionamentos sobre os incentivos fiscais bilionários envolvidos.
Enquanto executivos do alto escalão da Amazon explicavam como a instalação do novo headquarter poderia beneficiar com novos empregos a região do Queens, em Long Island, do lado de fora se ouviam os gritos dos moradores: “A Amazon precisa ir embora”; “Queremos dinheiro para a educação”; “Não para bancos e corporações.”
Os críticos estão preocupados com os ônus que a chegada de uma gigante como a Amazon traria para o Queens, uma área que já é apertada, tem um transporte público ruim e que começa a sofrer um processo de gentrificação.
O grande temor é que a vinda da empresa piore o quadro e acelere ainda mais esse movimento. Em outras palavras: que o aumento nos preços de aluguéis, imóveis e serviços force a saída dos moradores de baixa renda, provocando uma mudança drástica no cenário social e urbanístico do bairro.
Um olhar rápido sobre Seattle, onde fica a sede atual da Amazon, mostra que a preocupação tem fundamentos. Na última década, o aluguel médio do município subiu três vezes mais do que a média americana, segundo dados do Business Insider, e a cidade tem hoje a terceira maior população de moradores de rua dos Estados Unidos.
A promessa da gigante de tech é gerar 25 mil empregos nos próximos 10 anos em Nova York – 700 já em 2019 – e investir bilhões de dólares na região. Em troca, vai receber da prefeitura e do estado uma isenção fiscal de mais de US$ 3 bilhões.
O benefício considerado extremamente alto também não agradou aos críticos, que apontam ainda uma falta total de transparência durante todo o processo. A negociação entre a Amazon e a Prefeitura de Nova York, por exemplo, foi feita sem nenhuma consulta pública, algo pouco usual neste tipo de decisão.
A Amazon começou a procurar seu novo headquarter há pouco mais de um ano. Houve uma espécie de processo seletivo: 238 cidades se candidataram para a “vaga” e dessa lista a empresa escolheu 20 finalistas, para então chegar nas duas vencedoras. Um professor da New York University, Scott Galloway, já havia feito em fevereiro deste ano uma previsão de quais seriam as duas cidades escolhidas – e ele acertou em cheio.
O fato levantou especulações de que a Amazon sabia desde o início onde colocaria a sua sede e teria estimulado a disputa entre as cidades apenas para conseguir mais incentivos fiscais, além de informações importantes sobre os lugares que participaram do processo.
Para escolher o município vencedor, a Amazon pediu centenas de dados, incluindo o preço médio de uma cesta de produtos básicos na região, informações demográficas, ideias de parcerias entre a Amazon e centros educacionais da cidade, indicadores de qualidade de vida dos moradores, entre muitos outros pedidos. Com todos esses dados em mãos, disseram especialistas, a Amazon terá muito mais facilidade para dar tração à sua expansão.
Na audiência pública da semana passada, os executivos da Amazon afirmaram que a empresa escolheu Nova York “pela quantidade de talentos que a cidade tem”, mas que foram os US$ 3 bilhões em incentivos e subvenções que garantiram que o acordo fosse fechado.
Após a apresentação, Jimmy van Bramer, um dos conselheiros da cidade de Nova York, fez críticas ferrenhas ao acordo e disse que ele não se encaixa na promessa do prefeito Bill de Blasio de diminuir as desigualdades sociais do município. “Esse é um mau negócio para Long Island City, um mau negócio para o Queens e um mau negócio para a cidade de Nova York”, disse.