São Paulo – Um dos setores que mais têm representado esse esforço de investir no desenvolvimento de novas tecnologias é o das montadoras de veículos. Ontem, a americana Ford Motor Co. anunciou que planeja lançar uma tecnologia sem fio para seus novos modelos de veículos nos Estados Unidos já a partir de 2022. Com a novidade, prevê, será possível a comunicação direta entre os dispositivos conectados. A nova tecnologia, chamada C-V2X, tem como objetivo aumentar os sensores usados em carros autônomos, tornando a visão do veículo a partir de radares e câmeras mais abrangente. Em novembro, a multinacional informou que espera iniciar as vendas de carros autônomos em 2021.
A Ford é uma entre tantas montadoras globais que seguem no esforço de avançar com os carros que dispensam a figura do condutor e também descobrir novas formas de melhorar a performance dos carros elétricos e híbridos. Para o setor automobilístico, essa decisão é crucial para a sobrevivência.
Para o especialista, a próxima grande onda de mudança no segmento será a do carro elétrico, que a partir deste ano deverá ter uma oferta mais significativa também no Brasil. Mas para esse tipo de veículo acelerar no país, acredita Brossi, só mesmo com algum tipo de incentivo governamental, além do investimento em infraestrutura, como a instalação de postos e de estacionamentos com fontes para o carregamento das baterias. Do contrário, os potenciais consumidores não vão se sentir confiantes em trocar o modelo a gasolina e etanol.
"Não acredito que o Brasil consiga fugir dessa tendência. A previsão é que em 10 anos o país tenha de 20% a 30% de veículos elétricos em sua frota. Com esse aumento nas vendas e o aperfeiçoamento das tecnologias, a tendência é que o preço caia"
Lucas Brossi, sócio da Bain & Company
“Apesar desses detalhes, não acredito que o Brasil consiga fugir dessa tendência. A previsão é que em 10 anos o país tenha de 20% a 30% de veículos elétricos em sua frota. Com esse aumento nas vendas e o aperfeiçoamento das tecnologias, a tendência é que o preço caia. E vai pesar na decisão do motorista o fato de ser um veículo muito mais econômico”, explica o executivo da Bain.
Líder do setor automotivo da KPMG, Ricardo Bacellar também destaca que a inovação tem sido o principal pilar dessa indústria. Ele lembra que em uma história de pouco mais de 100 anos, poucas mudanças significativas foram feitas. Nos últimos anos, no entanto, por pressão do mercado consumidor, esse comportamento dos fabricantes teve de mudar.
“A indústria percebeu que os consumidores estavam ficando cada vez mais tecnológicos. Os primeiros veículos começaram a absorver tecnologia de dentro para fora, por exemplo, com câmbio automático e freios mais eficientes. Depois veio a evolução com o kit multimídia e a tela touch-screen. A tecnologia tem aparecido de forma ainda mais enfática, com veículos elétricos e autônomos. A indústria não vai poder parar, ou perderá espaço para os novos competidores”, explica Bacellar.
O executivo da KPMG se refere a empresas que surgiram nos últimos anos já com a proposta de investir em veículos mais inovadores. O maior exemplo é o da Tesla, de Elon Musk, que apesar de ainda não ter 100% da confiança dos investidores, tem conseguido avançar com uma das plataformas mais tecnológicas dessa indústria.
“É uma questão fundamental para a indústria automobilística fazer investimentos em inovação, com ciclos cada vez mais rápidos. Afinal, o usuário vai querer sempre mais do que tem hoje. A grande questão é a velocidade com que as montadoras conseguirão atender a esse desejo por produtos mais inovadores”, pondera o especialista.
Nos últimos dez anos, segundo Bacellar, o ciclo de inovação nessa indústria caiu de cinco para três anos. E a tendência é que esse período seja encurtado ainda mais à medida que o risco à segurança do usuário recuar – inclusive digital, já que a medida que os carros são mais conectados, também ficam mais expostos à ataques virtuais.
NOVO COMPORTAMENTO Mas toda essa transformação pela qual vem passando a indústria não tem a ver apenas com a pressão dos consumidores por veículos mais inovadores, mas também pela mudança de comportamento que tem se acentuado nos últimos anos. As gerações mais novas estão cada vez menos preocupadas em ter – seja um carro ou um imóvel – e têm optado pela experiência do compartilhamento e até o uso de outros meios de transporte. Com isso, tem crescido as empresas de aplicativo de transporte, como Uber e a brasileira 99, e ainda de forma tímida o conceito de “car sharing”, de uso compartilhado de carros. E não é só daí que vem a ameaça às montadoras, lembra Bacellar. Também os “novos” meios de transporte, como bicicletas e patinetes elétricos, em que se paga por tempo de uso, representam uma concorrência adicional aos carros.
“Se todos estão avaliando as vantagens possíveis com a mobilidade, não dá para as montadoras pensarem apenas em fabricar e vender carro, como se fazia até outro dia”, destaca o executivo.
Estudo divulgado no início do ano passado pela PwC aponta que até 2030, um em cada três quilômetros rodados será percorrido por carros autônomos. Influenciarão esse crescimento aspectos como a autonomia dos veículos, a eletrificação, a conectividade e o compartilhamento.
“A maioria das montadoras já se apresenta como provedora de mobilidade, tanto por conta da evolução tecnológica quanto pela mudança da cabeça dos consumidores, que adquire novos hábitos”, explica Marcelo Cioffi, da PwC. O especialista no setor acredita que esse era um comportamento esperado, há que o automóvel é o segundo maior custo no orçamento familiar.
Mas não é apenas o compartilhamento e o tipo de energia para o funcionamento do carro que vão mudar. Também vão crescer os serviços prestados por empresas de outros setores. Cioffi lembra que a Amazon, por exemplo, já testa uma fechadura residencial que pode ser aberta por seus funcionários na hora da entrega da mercadoria em uma residência. “Por que não imaginar que esse mesmo tipo de tecnologia pode ser usado para que uma empresa tenha acesso ao porta-malas e deixe ali uma encomenda?”, diz. O executivo da PwC resume o que vem por aí: “O veículo do futuro será elétrico, compartilhado, conectado e altamente atualizável.”
ABB triplica vagas para especialistas em robótica
Em Guarulhos, na Grande São Paulo, foi concluído recentemente o projeto de ampliação de uma escola diferente. Nada de aulas de português, geografia ou história. O espaço foi preparado para formar especialistas em robótica. Foi a estratégia encontrada pela multinacional ABB para preparar mão de obra especializada em trabalhar com seus produtos, os robôs.
Por ano, são vendidos no Brasil por volta de 1,5 mil robôs industriais. O país tem uma média muito baixa de robotização de seu parque industrial. São 10 robôs industriais a cada 10 mil habitantes. O número da média global de robôs para cada 10 mil trabalhadores é 85, segundo a Federação Internacional de Robótica. Já em grandes economias, o volume é bem mais relevante. Na Alemanha e no Japão, os números variam de 700 a 800 máquinas desse tipo a cada 10 mil habitantes.
Para empresas como a ABB, investir em inovação – tanto no desenvolvimento de equipamentos quanto na formação de profissionais – é uma forma de perpetuar o negócio.
Até inaugurar a ampliação do laboratório de robótica, a ABB oferecia cursos apenas para empresas com quem tinha relação comercial. Cassio Scarpi Brochado, chefe global de serviços e treinamento da robótica da companhia, acredita que essa seja uma forma de aproveitar o potencial que o Brasil tem nessa área. Com a ampliação do Centro de Treinamento, o objetivo é triplicar o número de vagas – de 500 para 1.500 – ainda em 2019.
"No Brasil, um dos empecilhos para o crescimento do número de robôs é a falta de mão de obra qualificada para esse tipo de trabalho, por isso, achamos importante investir em mais vagas para treinamento e abrir para o mercado como um todo"
Rodrigo Scarpi Brochado, chefe global de serviços e treinamento da robótica da ABB
O crescimento do e-commerce tem sido uma das áreas que tem impulsionado novos negócios nesse segmento. A cada robô industrial instalado, é preciso ter profissionais que programem as máquinas, instalem e façam a manutenção durante sua vida útil. “No Brasil, um dos empecilhos para o crescimento do número de robôs é a falta de mão de obra qualificada para esse tipo de trabalho, por isso achamos importante investir em mais vagas para treinamento e abrir para o mercado como um todo”, detalha o executivo da ABB.
A iniciativa da ABB é apenas um exemplo de como a indústria acredita que investir em inovação é imprescindível, além de ser uma decisão sobre a qual não se pode voltar atrás.
Durante o treinamento, os alunos aprendem, por exemplo, a identificar falhas do equipamento em tempo real, a trabalhar com ambiente virtual. Parte da atividade é feita com a ajuda do software RobotStudio. Com essa tecnologia, é possível simular uma réplica exata da fábrica no mundo virtual, prever e resolver problemas técnicos com antecedência.
Os alunos também têm contato com o YuMi, o primeiro robô colaborativo de dois braços do mundo. O equipamento tem sensores de movimento antichoque e tecnologia antiesmagamento, o que aumenta a segurança de quem trabalha por perto. Ele permite várias aplicações, como a dobradura para embalagens de doces e a montagem de smartphones.