São Paulo – A compra da operadora Nextel Brasil pela mexicana América Móvil deixou os mercados de tecnologia e de telefonia agitados nos últimos dias. O negócio, que custará US$ 905 milhões (cerca de R$ 3,5 bilhões) ao grupo que controla a Claro, Embratel e Net no Brasil, é considerado uma pechincha pelos especialistas. “Pelo número de clientes, abrangência e marca, a Nextel teria de valer pelo menos o dobro disso”, afirma o consultor Saulo González, diretor da consultoria Infotec, do México. “A América Móvil esperou as condições financeiras da Nextel se deteriorarem para comprar a rival pelo menor preço possível.”
O bote da Claro sobre a Nextel está incomodando principalmente as concorrentes Vivo, Oi e TIM, que vinham tentando ampliar suas bases de linhas por meio de uma guerra de preços, algo que a Claro não terá de fazer ao incorporar os clientes pós-pagos da Nextel, principalmente em São Paulo e no Rio de Janeiro. Especificamente sobre o mercado paulista, a liderança da Vivo fica menor. Pelos números da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), a operadora tem participação de 36%. A fatia da Claro fica em 25%, enquanto a TIM conta com 24% e a Nextel, 3,1%. Analisando apenas o market share em pós-pago, a Vivo tem 41%, a Claro 26%, a TIM 18% e a Nextel 5%.
No Rio de Janeiro, a Nextel tem presença ainda mais encorpada. Em geral, o mercado de pós-pago fica dividido em 33% para a Vivo, 25% para a Claro, 15% para a TIM, 14% para a Nextel e 10% para a Oi. “Junto com a Nextel, a Claro fará frente à Oi de forma mais robusta e aumentará a concorrência”, disse a analista do Itaú BBA Susana Salaru, em análise publicada no portal Teletime. “A TIM perdeu oportunidade de aumentar a participação em São Paulo ao não comprar a Nextel.” Por outro lado, segundo ela, a Telecom Italia teria problemas para executar um investimento desse porte, já que a TIM Brasil não poderia abrir mão de caixa a ser consolidado pela controladora.
Dentro da Nextel, a incorporação da empresa pela Claro está gerando medo e apreensão. Um executivo da operadora, que pediu para não ter o nome relevado, afirmou que são esperadas mais de 700 demissões nos próximos meses. Os cortes, segundo ele, serão efetivados com a união de vários departamentos das duas empresas, como tecnologia, comercial e atendimento ao consumidor. “Todos estão se preparando para o pior nos próximos meses. Sabemos que muitos departamentos serão extintos e isso já vem sendo alertado pelos altos executivos da companhia.”
ACORDOS Outra fonte de dúvidas com o negócio entre Claro e Nextel é o futuro do atual compartilhamento de rede da Nextel com a Vivo. Fontes consultadas pela reportagem afirmam que os acordos de roaming e compartilhamento de espectro entre a Vivo e a Nextel deverão ser mantidos. Com o vencimento dos contratos de fidelização, o tráfego seria migrado normalmente para a rede da Claro.
Uma eventual disputa na Justiça poderia ser prejudicial para a prestação do serviço e acabar sendo onerosa para o grupo mexicano. “Não tem razão para não continuar. Talvez tenha alguma repactuação do valor, mas acho que compartilhamento é bom para todas as operadoras, pois elas não querem ter de construir rede sobreposta. Do ponto de vista operacional, faz sentido em continuar a dividir a rede”, acrescentou Susana.
O negócio, sob a ótica dos fracos resultados da Nextel, faz todo o sentido. No balanço do ano passado, a operadora divulgou receita operacional consolidada de US$ 621 milhões, com adição líquida de 99,3 mil clientes apenas no quarto trimestre. O ARPU (receita média por assinante) foi de US$ 14 (aproximadamente R$ 53), valor superior à média nacional. No final das contas, a operadora fechou o ano com prejuízo operacional de US$ 42 milhões, depois de ter registrado prejuízos em 2015, 2016 e 2017.