São Paulo – O reconhecimento fácil por meio da biometria, auxiliado por recursos da inteligência artificial, vem ganhando terreno em diferentes frentes. Já é usado por bancos digitais, por universidades na hora de liberar acesso, para check-in de companhia aérea, para acionar eletrônicos, como celulares, e em uma série de atividades que querem aumentar a segurança das pessoas, como o monitoramento por meio de câmeras – o que ainda é considerado um tema controverso.
Estudo da consultoria americana Tractica aponta que o mercado de biometria apresentará uma receita acumulada em 10 anos (no período entre 2016 e 2025) de US$ 69,8 bilhões, com uma taxa de crescimento anual de 22,9%.
O principal impulso, mostra a pesquisa, virá da região Ásia-Pacífico, graças a “uma combinação de alto volume populacional, várias economias fortes ou fortemente em crescimento e uma demanda crescente por soluções biométricas para gerenciar grandes iniciativas, como programas nacionais de identificação”, informa o relatório da companhia. A receita global total no último ano do período de previsão, 2025, alcançará US $ 15,1 bilhões.
No Brasil, já há startups desenvolvendo novas aplicações para o reconhecimento facial, mas ainda não é o tipo de recurso plenamente popularizado. Uma rede de lojas de produtos para animais domésticos decidiu usar a tecnologia para alavancar a venda on-line de seus produtos. No caso, em vez de a identificação ser feita a partir do rosto do dono, o escaneamento tem como alvo o animal.
O bichinho escolhe A rede Petz está lançando um e-commerce ativado pelo reconhecimento fácil para os cachorros, batizado de Pet-Commerce. Eles vão escolher os brinquedos que serão incluídos na cesta de compras graças ao recurso de inteligência artificial (AI, na sigla em inglês) que permite mapear e interpretar as expressões do animal e de qual produto ele mais gostou.
O primeiro passo é posicionar o cão em frente à tela (computador, tablet ou smartphone) para que ele seja fotografado. Quando o dono for fazer a compra, o animal será posicionado novamente diante da tela e exposto a vídeos de brinquedos e ossinhos. A câmera capta a reação do pet e o sistema de inteligência artificial mapeia o nível de interesse de compra dos produtos, identificado em um gráfico de ossinhos.
O projeto surgiu da agência Ogilvy Brasil e o desenvolvimento foi feito pelas empresas D2G Tecnologia e Hogarth. Da ideia à conclusão, foram necessários cerca de nove meses.
Para chegar ao produto final, passaram pelo sistema de AI milhares de fotos de cachorros, com variação de raças (inclusive os sem raça definida). “O olhar, as orelhas apontando em direção à câmera, um animal sem medo e sem desconfiança, que não recue ao ver o site, sinalizam que o cão gostou da brincadeira e se interessou pelo produto mostrado”, relata Leonardo Ogata, adestrador e profissional que participou do treinamento da inteligência artificial.
Foi preciso ainda pensar na melhor experiência de navegação (UX) não para os humanos, como de costume, mas para os pets. Para isso, levou-se em consideração, por exemplo, a visão do cachorro, que enxerga em uma escala de amarelos e azuis, além de não prestarem atenção em imagens estáticas. O problema foi resolvido com a apresentação dos produtos em vídeo e na paleta de amarelos e azuis. Foi preciso ainda ajustar o áudio dos filmes, já que a audição dos cachorros é muito potente.
Se a reação captada pela AI é positiva, o produto é pré-selecionado para o carrinho de compras do site. Mas o negócio só é concluído quando o proprietário do animal preenche seus dados. Por enquanto, o Pet-Commerce é exclusivo para cães.
Além da parte de petshop, a empresa lançou no fim do ano passado a bandeira Seres, de centros veterinários, voltada à saúde animal. A companhia tem ainda a unidade Petz Garden, com plantas, flores e material para jardinagem e piscina. Uma das propostas da nova ferramenta é aumentar a ligação entre o cachorro e seu dono, mas um incremento na receita do canal de vendas do e-commerce, que hoje responde por 5% do faturamento da Petz, será bem-vindo.
A empresa tem atualmente 86 lojas, distribuídas por oito estados – entre eles, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul –, além do Distrito Federal. Os planos para este ano são de chegar a outros estados e pela primeira vez passar da casa de R$ 1 bilhão de faturamento, como contra o presidente, Sergio Zimerman.
Petz deve passar de R$ 1 bi de faturamento e chegará ao Nordeste
O envolvimento com os assuntos do mundo dos animais de estimação não ocupa a cabeça de Sergio Zimerman, presidente da Petz, apenas enquanto está trabalhando. Quando chega em casa, encontra tempo para brincar com dois cachorrinhos da raça yorkshire e um gato. Quando vai para seu sítio, a jornada é maior. Lá, são seis cachorros. Veja os principais trechos da entrevista aos Diários Associados.
Deve haver algum impacto nas vendas on-line ou é uma novidade mais lúdica?
O objetivo principal não é ter impacto nas vendas, até porque o aplicativo é limitado apenas à escolha de brinquedos, não inclui outros itens. Considero ser mais o lançamento de um produto conceitual que mostra a capacidade que os cachorros têm de escolher seus brinquedos. Esperamos muito menos de resultado de vendas e muito mais poder apresentar um conceito inovador para o mundo de e-commerce.
Quanto o e-commerce representa no faturamento? Isso deve alterar a programação de abertura de lojas?
Neste ano, o comércio eletrônico deverá responder por 5% do nosso faturamento, com uma tendência forte de crescimento. Há três anos, para se ter ideia, significava algo como 1%. A maior parte vem mesmo das vendas nas lojas, que são todas próprias. No ano passado, o faturamento da rede ficou em torno de R$ 920 milhões e a previsão para 2019 está em torno R$ 1,2 bilhão. Todas as nossas unidades são próprias. Se lançássemos franquia, aumentaríamos fácil para mais 200, 300, 400 lojas. Não estamos descartando abrir para franquias, mas temos outros focos.
Quais são os planos?
Queremos expandir o projeto Seres, de hospitais veterinários. Já temos vários em construção, ou seja, teremos uma rede hospitalar. Os atuais consultórios da Petz serão convertidos para o modelo Seres e esse processo deve ser concluído até o fim do ano que vem. Deixaremos como uma rede, uma marca e gestão independentes. A prioridade é que as unidades Seres sejam abertas junto a unidades da Petz, no conceito que oferece aos clientes a possibilidade de resolver sua vida em um só lugar. Mas nada impede que separemos as marcas
Quando deve passar a oferecer a ferramenta de AI para outras espécies?
Deve ficar só nos cães. Além de ser um universo muito maior, existe uma dificuldade do próprio adestrador em relação ao gato, por exemplo. Pelo viés administrativo, gatos podem ser opção se não houver impedimento técnico, mas queremos consolidar e viralizar a ferramenta com cães.
Você já pensa em novas funções para a ferramenta de AI? Por exemplo, uma série de jogos interativos para cães?
O primeiro passo está dado. A gente está entrando em coisas top no mundo, é um lançamento mundial. A notícia sobre o aplicativo foi notícia até no Japão. Um aplicativo com essa funcionalidade é inédito. Mas não faz muito sentido pensar em outros passos ainda. Queremos ver como vai funcionar em grande escala. Tem um período de aprendizado. Precisamos saber se vai funcionar bem e a partir daí se pode pensar em abrir outros caminhos, seja para fazer algo semelhante para gatos ou transformar em jogos lúdicos para cães. Por enquanto, estamos mais no terreno da curiosidade, da brincadeira. Será importante ver se vai funcionar a segunda vez, porque a primeira vez a pessoa usa pela curiosidade. É preciso saber se ela vai querer repetir a experiência. Paralelamente, o banco de dados vai aumentando exponencialmente e o aplicativo vai sendo aprimorado.
O Brasil está perto da saturação de oferta de pet shops ou ainda há muito mercado?
Quando analisamos o mercado quantitativamente, o número de pet shops instalados no Brasil é bastante expressivo, mas já era assim há 16 anos, quando a Petz começou. De lá para cá mudou o fato de termos a presença de duas redes importantes (Petz e Cobasi), mas esse ainda é um setor muito dominado pelo pequeno, que detém cerca de 80% a 90%. Isso mostra que a concentração ainda é baixa no Brasil.
Que tipo de oportunidade essa realidade cria para você?
Esse movimento de expansão nacional ainda está nos primeiros passos para a Petz. Estamos entrando no Nordeste neste ano. Começamos entre junho e julho por Salvador, mas já temos contratos para Recife, Natal e Aracaju para os próximos meses. Em junho, chegamos a Vitória.
Quem controla a Petz
Desde 2013, o controle da marca Petz está nas mãos da Warburg Pincus LLC, empresa com atuação internacional que possui ativos da ordem de US$ 58 bilhões sob sua gestão. A Warburg Pincus detém 55% de participação no capital da Petz, mas seu portfólio é bem grande e inclui em torno de 180 empresas, com diversificação segundo estágio do negócio, setor de atuação e região geográfica. De 1966, quando foi fundada, até hoje, a companhia criou 18 fundos de private equity, responsáveis por investir cerca de US$ 74 bilhões em mais de 800 companhias, espalhadas por 40 países, aproximadamente. No Brasil, a Warburg Pincus detém participação também em empresas como Camil, Restoque, BI&P e Eleva Educação.