São Paulo – “Eu vou ignorá-lo. Se ele me ligar, talvez eu não atenda”. A declaração do fundador da Huawei, Ren Zhengfei, em entrevista à Bloomberg Television, caiu como gasolina da fogueira da guerra comercial entre Estados Unidos e China.
Em resposta às retaliações impostas pelo presidente americano, Zhengfei adotou um tom desafiador ao comentar as sanções impostas à companhia.
O bilionário de 74 anos disse que sua empresa tem a capacidade de desenvolver as próprias soluções e que ampliará a oferta de chips ou buscará novas alternativas, como o desenvolvimento de um sistema operacional próprio, para manter sua vantagem em smartphones e 5G.
“Ser capaz de crescer no ambiente de batalha mais difícil apenas reflete como nós somos bons”, afirmou Ren. O problema é que as restrições de Trump devem reduzir a liderança em relação a rivais como Ericsson e Nokia.
Segundo a Huawei, quando sua rival ZTE foi ameaçada com sanções similares em 2018, houve a precaução de acumular chips suficientes e outros componentes vitais para manter os negócios pelo menos por três meses.
Desde 17 de maio, sob acusações de espionagem, a Huawei, maior fornecedora de equipamentos de rede do mundo – e também segunda maior fabricante de smartphones – perdeu o acesso a softwares e componentes produzidos nos Estados Unidos e que eram necessários para fabricar seus produtos. A medida também impacta negócios emergentes da empresa, como a oferta de computação em nuvem.
A proibição imposta à Huawei pode interromper o lançamento do 5G globalmente, colocando em xeque o padrão que alavancaria tecnologias potenciais, desde carros autônomos até cirurgias robóticas. A campanha de Trump contra a Huawei é sustentada pelo argumento de que empresa colabora com o governo chinês na espionagem, ao mesmo tempo em que lidera ambições da China de se tornar uma superpotência tecnológica.
Acusada de roubar propriedade intelectual de empresas americanas, como Cisco Systems e T-Mobile, a Huawei atualmente enfrenta críticas de que isso teria ajudado a escalar seus negócios em tecnologia.
“Eu roubei as tecnologias americanas de amanhã? Os Estados Unidos nem sequer têm essas tecnologias. Nós estamos à frente dos Estados Unidos. Se estivéssemos atrás, não haveria necessidade de Trump nos atacar tenazmente”, disse Ren.
Na semana passada, Donald Trump deixou escapar em uma entrevista que a Huawei poderia ser incluída em um acordo comercial com a China. “Isso é uma grande piada. Como estamos relacionados com o comércio entre Estados Unidos e China?”, questionou o executivo”.
Perguntado sobre uma possível retaliação da China à Apple, Ren posicionou-se contra. “Isso não vai acontecer, antes de tudo. E, segundo, se isso acontecer, serei o primeiro a protestar. A Apple é minha professora, está na liderança. Como estudante, por que ir contra o meu professor? Nunca”.
Analistas do Goldman Sachs avaliam que a Apple, terceira maior fabricante de smartphones do mundo, pode perder 29% de seus lucros (US$ 15 bilhões) caso a China decida proibir as vendas no país, em retaliação à proibição da Huawei nos Estados Unidos. As vendas da fabricante do iPhone na China representam 17% do total.
Esse prejuízo é apenas uma estimativa. Como os produtos da Apple são fabricados na China, a proibição da produção de dispositivos no país poderia acarretar perdas muito maiores. A longo prazo, a medida teria efeitos mais amplos e “poderia ter implicações negativas para o ecossistema de tecnologia da China, bem como para o emprego local”, diz o relatório enviado aos investidores da Apple.