"Convidem as menos privilegiadas, nós ricas compramos no exterior ou novas, nas lojas". O "alerta" é de uma dona de salão de beleza em Belo Horizonte, que se incomodou ao ver um post de divulgação de um bazar de roupas novas e usadas no perfil da influencer Polly Bernardes no Instagram.
"Fiquei espantada com a reação e repostei o comentário. As pessoas rapidamente foram contra a opinião dela. É uma ofensa tanto para nós que estávamos fazendo uma ação de reciclagem, quanto para quem busca uma alternativa de consumo", resumiu Polly. A personal trainer Rosângela Pereira dos Anjos Capelo, que estava no bazar, disse que o comentário foi maldoso. "Me agrediu".
Mas, afinal, comprar roupas de segunda mão é apenas para quem tem baixo poder aquisitivo?
Não é o que dizem especialistas em moda e donos de brechós ouvidos pelo Estado de Minas, e os números do setor de peças usadas. Segundo a consultoria Euromonitor, o mercado de luxo no Brasil encolheu nos últimos três anos - em 2017, movimentou R$ 22,5 bilhões, queda de 8,5% em relação a 2016. Enquanto isso, os brechós que vendem produtos de grifes crescem, de olho em quem quer gastar menos e de forma consciente. Segundo o Sebrae, a economia pode chegar a 80% em relação às compras em lojas tradicionais.
O estilista Ronaldo Fraga lembrou que a indústria da moda é a segunda que mais polui o meio ambiente, ficando atrás apenas do petróleo. "Sempre vai existir essa elite horrorosa, insensível às questões ambientais e pouco afeita à história e à memória", critica. Ele reforçou que o uso dos brechós é algo que demanda cultura e entendimento sobre práticas sustentáveis. "Não é demérito e vergonha alguma comprar em brechó, por exemplo, todas as classes têm esse costume, o problema é aqui no Brasil", emenda.
Raquel Fernandes, proprietária do brechó Brilhantina, na Savassi, reforçou que esse tipo de consumo é bem comum em países da Europa e nos Estados Unidos. "O mineiro é um pouco fechado e ainda existe preconceito, mas é um mercado que vem se mantendo. As pessoas estão mais inteligentes às causas sustentáveis e a prática de comprar ou vender roupas usadas está virando filosofia de vida", destaca.
Segundo ela, o consumo em brechós não dita o poder aquisitivo de uma pessoa. "Tenho clientes de todas as classes sociais e que não devem ser rotulados. Às vezes, a pessoa é próspera porque soube investir seu dinheiro", opina.
Avessa à fast fashion (moda rápida), conceito que prioriza a venda de produtos baratos e de pouca qualidade, a dentista Joana Farias da Cunha frequenta brechós há pelo menos 10 anos. "Sou contra alimentar uma indústria que polui o meio ambiente e que, ao mesmo tempo, explora uma mão de obra barata, exemplo da prática de trabalho escravo não só na China, mas também aqui no Brasil", disse.
Economia inteligente
O consumo consciente está na moda e está diretamente relacionado aos impactos sociais e ambientais negativos de uma produção e consumo desenfreados. Ou seja, vai além de gastar menos e do tanto que o cliente tem na carteira para investir em uma peça.
"Grande parte dos nossos clientes são pessoas com boas condições financeiras, mas que optaram por fazer uma economia inteligente, investindo em peças seminovas, de excelente qualidade, mas que por um motivo ou outro não interessam mais ao seu antigo dono", explica Vinícius Delmaschio França, proprietário da loja Brechó & Brochuras, no Bairro Santo Antônio, em Belo Horizonte.
Para o empresário, os motivos do desapego podem ser tão diversos quanto os de quem compra. "Seja por perda ou ganho de peso, um novo emprego, uma mudança de estilo. Definitivamente, o cliente de brechó busca exclusividade e uma oportunidade de encontrar peças diferentes, fora do padrão atual. Poder economizar é um ganho, com certeza, mas nem de longe é a prioridade", conclui.
Famosos são adeptos
Os brechós caíram no gosto de várias celebridades mundo afora. Em 2016, a cantora Anitta foi a uma premiação no Copacabana Palace, na Zona Sul do Rio de Janeiro, com um vestido do estilista Guy Laroche, comprado em um brechó.
Um ano depois, a atriz Angelina Jolie causou alvoroço ao revelar a jornalistas e fotógrafos que estavam na porta da première do filme “Um poderoso Coração”, no Teatro Ziegfeld, em Nova York, que o vestido que estava usando havia sido comprado em um brechó e custara apenas US$ 26 (cerca de R$ 50) - na época.
Se elas podem, por que nós não?