A disputa comercial entre o presidente norte-americano Donald Trump e o líder chinês, Xi Jinping, parece não ter intimidado o bilionário sul-africano Elon Musk, dono da maior fabricante global de carros elétricos, a Tesla. Na sexta-feira da semana passada, a companhia inaugurou sua primeira fábrica de capital próprio na Ásia, depois de pouco mais de 10 meses de construção.
Apelida de gigafactory, em razão de suas dimensões e capacidade de produzir, de imediato, 250 mil veículos por ano, a planta de Xangai abriga todas as etapas de produção de um carro, do chassi à carroceria e pintura final. O plano de Musk é dobrar a produção para 500 mil unidades anuais em 2020. Atualmente, a China é o maior mercado global de carros elétricos, responsável por comprar 50% de todos os automóveis desse tipo no mundo. No último trimestre encerrado em setembro, as vendas mais que triplicaram no país. Chegaram a 10.542 unidades, segundo a empresa de pesquisa LMC Automotive.
Na sexta-feira, mesmo dia em que a unidade abriu as portas, a Tesla começou a vender o Model 3. Com a função de piloto automático – que deixa o veículo com status de direção semiautônoma – o preço parte de 355.800 yuans, cerca de US$ 50,3 mil. Assim, o carro se torna o modelo mais barato da empresa à venda no mercado chinês. A inauguração foi recebida com euforia pelos investidores. Os papeis da companhia na bolsa subiram 20%.
Musk disse, em carta, que as operações em Xangai terão que esperar futuras expansões. Ele também tem planos de abrir uma gigafactory na Europa, em lugar a ser anunciado até o fim do ano. Em nota aos investidores, a Tesla garantiu que a produção do Model 3, seu carro mais simples, sairá até 65% mais barata. Com suas ações negociadas a US$ 298, o valor de mercado da Tesla alcançou US$ 53 bilhões, superando o valor de mercado da GM, de US$ 51 bilhões, e se tornou a empresa de automóveis mais valiosa dos Estados Unidos. Ela já havia ocupado tal posto anteriormente, mas voltou a perdera posição para a rival.
A expansão chinesa da Tesla é inédita no mundo dos automóveis. A empresa foi a primeira companhia estrangeira autorizada a fabricar carros sem parceria com uma montadora local — isso era uma exigência desde a reabertura do país. A Tesla também recebeu incentivos fiscais do governo chinês.
A decisão surpreende não só pelas cifras envolvidas, mas pelo ambiente de tensão global. No mês passado, as novas tarifas anunciadas pelo governo dos Estados Unidos sobre importações da China subiram para US$ 550 bilhões, em um dos mais complexos episódios da guerra comercial entre as duas maiores potências mundiais. Já a China promete aumentar para US$ 300 bilhões as taxações para os produtos americanos. “É impossível para as empresas planejar o futuro nesse tipo de ambiente”, disse David French, da National Retail Federation.
Reputação A abertura da megafábrica chinesa é peça-chave na estratégia da Tesla para recuperar sua reputação junto aos consumidores e a ampliar suas vendas. A montadora responde a processo nos Estados Unidos, depois de terem sido registrados ao menos três acidentes graves envolvendo o recurso chamado autopilot de seus veículos elétricos.
Embora o sistema da Tesla se chame autopilot, a empresa aconselha os motoristas a se manterem atentos à direção e a não tirarem as mãos do volante sob hipótese alguma. Em comunicado, a empresa de Elon Musk ainda afirmou que, de acordo com estatísticas do setor, seus clientes já acumularam mais de 1,6 bilhão de quilômetros percorridos com o Autopilot ligado, e que, quando ele é utilizado da forma correta, a direção se torna mais segura.
Ainda assim, os acidentes reacenderam a discussão sobre a eficiência do recurso. Para a Administração Nacional de Segurança Rodoviária (NHTSA), o sistema não foi capaz de evitar o acidente nem de manter o motorista com a atenção voltada para a direção. Atualmente, tanto o Conselho Nacional de Segurança no Transporte (NTSB) quanto a NHTSA mantêm investigações sobre outros acidentes com carros da Tesla, envolvidos ou não com o autopilot.
O NTSB afirmou que o motorista ativou o piloto automático e, em seguida, retirou as mãos do volante. O sistema não detectou o controle do carro por pelo menos 8 segundos antes do acidente, quando o carro acabou parando embaixo de um semirreboque e tendo seu teto arrancado. No momento do impacto, o veículo estava a 109 quilômetros por hora em uma rodovia em que o limite de velocidade é de 90 km/h. De acordo com o NTSB, nem o sistema da Tesla nem o motorista tentaram manobras para evitar o acidente.