São Paulo – As ações da Movida valorizaram mais de 100% desde que a locadora de carros abriu o capital na bolsa de valores, em fevereiro de 2017, e suas receitas crescem ao ritmo de 40% ao ano. Parte expressiva desse desempenho deve ser creditada ao mineiro Renato Franklin, de 38 anos, responsável pelas transformações tecnológicas que tornaram a Movida uma das maiores empresas do setor no Brasil.
Na entrevista a seguir, Franklin, que está no comando da empresa desde 2014, explica por que o mercado de locação de carros vive uma explosão sem precedentes, destaca o papel da tecnologia no crescimento da companhia e analisa a agenda de reformas proposta pelo governo de Jair Bolsonaro.
Na entrevista a seguir, Franklin, que está no comando da empresa desde 2014, explica por que o mercado de locação de carros vive uma explosão sem precedentes, destaca o papel da tecnologia no crescimento da companhia e analisa a agenda de reformas proposta pelo governo de Jair Bolsonaro.
Qual é a importância da reforma da Previdência para o país?
O cenário econômico brasileiro tem sido desafiador nos últimos anos. Isso não é novidade para ninguém. O país carece de várias reformas para poder se tornar realmente competitivo. Acho que a aprovação da Previdência é um marco importante para o país começar a caminhar. Além da economia estimada em R$ 800 bilhões, é um sinal importante que as coisas vão começar a andar. Traz mais otimismo e aumenta a confiança do empresário, dos grandes investidores, para que o país tenha um ciclo de crescimento mais consistente.
Na sua avaliação, que outras medidas podem melhorar o ambiente de negócios do país?
A reforma tributária. A carga é alta, mas dificilmente vamos conseguir uma modificação grande. A questão é que podemos facilitar a apuração e o controle dos impostos. Com a reforma, teremos, no início, mais recolhimento, e aí sim, poderemos pensar em ter uma redução da carga, porque mais gente vai contribuir. Principalmente porque a reforma vai tornar o processo mais fácil. Hoje em dia, o custo de controle e apuração dos impostos é muito grande para qualquer indústria, qualquer empresa, de qualquer setor. Você tem um exército de gente apenas para controlar a parte fiscal. Essa improdutividade acaba sendo transferida para o preço final. O país também carece de infraestrutura, as desestatizações também são importantes para a economia. Tem muita coisa por fazer.
O otimismo do empresário variou muito ao longo do ano e foi influenciado pela tramitação da reforma da Previdência. Qual a projeção para o último trimestre do ano?
O sentimento era de que a economia ia crescer, mas a gente não chegou a ver isso em números. Quando olho para o meu setor, meço muito pelas viagens corporativas. Se elas aumentam, você vê que a economia está retomando. Porque a primeira coisa que a empresa corta quando está em crise é a viagem. E a gente percebe isso no nosso mercado. A gente viu um sentimento forte de otimismo no início do ano, que depois esfriou. Agora, não estou vendo tanto sentimento, mas estou vendo números. De agosto para cá, o número de viagens corporativas está aumentando.
O que representa isso?
O crescimento mostra que as empresas estão começando a trabalhar projetos, abrir novas frentes comerciais para vender. Então, acredito que já é um sinal de que as pessoas estão acreditando. Estamos caminhando para um momento melhor.
As ações da Movida na bolsa e de outras locadoras tiveram uma valorização significativa neste ano. O que explica esse movimento?
Realmente, estamos passando por um ciclo positivo de valorização. A Movida valorizou mais de 100% já desde o IPO (em fevereiro de 2017). O mercado como um todo tem fundamentos positivos. Era um mercado com pouca penetração, e ainda hoje é. Se você pegar os números, estima-se que só 3,5% da população brasileira dos motoristas habilitados já alugou um carro. Então, é muito baixo perto do que deveria ser. Falta muito para o potencial de crescimento e acho que cada vez mais o mercado tem reconhecido que o futuro do setor é oferecer serviços. A cultura do compartilhamento hoje está em tudo e vai revolucionar o nosso setor. As pessoas preferem pagar apenas pelo uso em vez de ter um ativo imobilizado. Isso é um estímulo para o aluguel de carro.
Em que situações faz sentido alugar um carro?
Não faz sentido você alugar um carro e ir em um compromisso em um bairro próximo. Agora, se você precisa ir para o aeroporto, você já pode fazer conta. Dependendo de onde você está já é um pouco mais barato o aluguel do carro. Para fazer uma reunião em outra cidade. Tem cinco reuniões em um dia, se você somar os cinco transportes, o que fica mais em conta? Tem muitas situações que faz mais sentido o aluguel e isso está cada vez mais entrando na rotina das pessoas.
O que a Movida tem feito para crescer diante desse potencial?
Obviamente, surfamos uma onda que está varrendo o mundo inteiro. Hoje em dia, com o Waze, você consegue alugar carro em qualquer lugar. Antigamente, você não sabia dirigir em uma região e, portanto, não alugava. Para ajustar nosso modelo às mudanças da sociedade, fizemos algumas transformações. O mercado, no início, era feito para atender viagens corporativas durante a baixa estação e ser carro reserva de seguradora. Entre as pessoas físicas, a classe média e a classe média alta usavam os carros alugados em viagens de lazer, nas férias e feriados. Você não via pessoa física alugando carro para usar em deslocamentos de reuniões durante um dia. Não tinha isso. O mercado não estava estruturado para isso. Os carros eram todos prata ou branco, não tinha carro de varejo.
E como é hoje?
Quando você olha no exterior, a indústria já é totalmente diferente. Carros legais, vendidos no varejo, coloridos, diversidade de opções e um monte de coisas. No Brasil não se tinha nem lojas em bairros de classe média baixa para atender. Você ia para bairros populosos e não havia locadoras. Enxergamos uma necessidade nesse cenário, de alugar para todo mundo.
Isso foi uma vantagem em relação aos concorrentes?
Foi muito grande e serviu para puxar o mercado. Trouxe uma demanda nova e mais pessoas foram atraídas para o setor. Quando chegaram os motoristas por aplicativo, isso também não existia há cinco anos, fomos a primeira empresa a ir lá e oferecer uma parceria para o cara que não tem carro, mas quer trabalhar.
Em que áreas a Movida precisa se fortalecer?
Temos trabalhado para eliminar as burocracias. Desenvolvemos, por exemplo, biometria facial pelo próprio celular para evitar que isso seja feito na loja. Agora, buscamos fazer toda a análise antifraude com várias startups, com um sistema de big data. Cruzamos dados para diminuir riscos e fazer o processo mais rápido possível. Investimos muito em tecnologia para simplificar os processos. Acho que essa é a principal alavanca que vai fazer aquele número de 3,5% chegar a 80%. A tecnologia ajuda a fazer negócios de uma maneira muito simples.
O carro já não é mais um sonho de consumo para uma fatia relevante da população. Isso cria oportunidades, mas também traz desafios. O que ameaça o setor?
Sempre brinco que, muitas vezes, a gente nem sabe quem é nosso concorrente. Porque os negócios se transformam em uma velocidade tão grande que você tem que estar atento para tudo, porque vem outro negócio disruptivo que transforma tudo. Então, essa é a nossa obrigação: olhar para tudo que acontece fora e tentar ser mais rápido para capturar as oportunidades.
Sobre as oportunidades, uma em evidência é o aluguel mensal para pessoas físicas. Qual a participação nos negócios da Movida?
Tem sido um negócio bastante relevante desde que abrimos, em abril em 2017, e vai crescer muito ainda. Atualmente, todos os concorrentes têm serviços semelhantes. Eles são voltados para as pessoas que querem o carro todo dia, mas não pagar pelo veículo, não pagar o IPVA, ficar controlando a documentação e todas as burocracias, ter dor de cabeça com a manutenção quando aparece algum problema. Esse, na minha avaliação, será o maior mercado das locadoras no futuro. A indústria de serviço de mobilidade vai faturar trilhões por ano. Isso vai atrair muita concorrência, das montadoras, empresas de tecnologia, investidores em geral. Acho que estamos bem posicionados para essa realidade. O grande desafio para não ser superado no mercado é continuar sendo a melhor escolha para o cliente. Ou seja, oferecer a melhorar a experiência de serviço, facilidades e, claro, o menor custo.
Como os investimentos em inovação podem contribuir para isso?
A inovação é fundamental. Desenvolvemos um sistema QR code, totem de autoatendimento nas lojas, aplicativo. Do ponto de vista de operação, são quase 5 mil carros alugados por dia. Então, precisamos estar com a frota atualizada e conectada, para o cliente fazer a consulta de preços e avaliar o melhor serviço para ele.
Qual a projeção de crescimento da Movida para os próximos anos?
O negócio tem respondido muito bem. Há uma demanda boa dos clientes. A companhia vem crescendo quase 40%. Isso, em um ano em que a economia ainda está desse jeito. Imagine com uma retomada mais consistente. Vejo um cenário muito positivo para o futuro próximo.