Augusto Fernandes, Ingrid Soares e Simone Kafruni
Brasília – O presidente Jair Bolsonaro assinou na tarde de ontem o projeto de lei da privatização da Eletrobras, maior empresa de geração de energia elétrica do país. Agora, o governo vai encaminhar a proposta ao Congresso Nacional, que tem de aprovar o texto na Câmara dos Deputados e no Senado para que o projeto possa ser sancionado pelo Palácio do Planalto. A proposta prevê a venda do controle da empresa sem que o governo mantenha uma golden share, ação especial que dá direito a veto. O projeto foi apresentado na manhã de ontem pelo ministro das Minas e Energia, Beto Albuquerque, durante café da manhã com jornalistas. A intenção ministro era levar ainda ontem, pessoalmente, o projeto na Câmara.
Entre os principais pontos do projeto de lei estão a capitalização da companhia, com a diluição da participação do governo para menos de 50%, e a revogação do dispositivo que excluiu a empresa do Plano Nacional de Desestatização (PND), para que ela possa ser privatizada. O valor considerado base para o governo arrecadar em outorga com o processo de capitalização é de R$ 16,2 bilhões. Esse é o montante que consta no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2020, enviado ao Congresso pelo Executivo, com a privatização da Eletrobras.
Após a privatização, o governo não terá "golden shares" na Eletrobras. Golden shares ou "ações de ouro" são ações de classe especial de empresas estatais ou de capital misto. Esses papéis pertencem ao governo que garante com eles direitos especiais, como o poder de veto de algumas decisões. O objetivo do governo com a venda da estatal é a obtenção de “novos recursos para a Eletrobras para que a empresa possa continuar contribuindo para a expansão sustentável do setor elétrico, em novos empreendimentos de geração e de transmissão de energia elétrica”.
“Sabe-se que a situação econômico-financeira da Eletrobras restringe sua atuação na expansão da oferta de geração e transmissão de energia elétrica, diminuindo a sua capacidade de competir no mercado no qual é um agente relevante”, informou a Presidência da República, por meio da sua assessoria de imprensa. Ainda de acordo com o Poder Executivo, “a proposta reflete o reconhecimento de que o Estado brasileiro deve priorizar gastos em áreas em que a sua atuação é essencial, como educação, saúde e segurança pública”. “A sociedade, na qualidade de acionista, recebe menos dividendos e tributos com os atuais resultados da companhia diante do que essa poderá se beneficiar com a capitalização da empresa. É justamente nesse cenário que surge a proposta de capitalização da Eletrobras”, justificou o Palácio do Planalto.
Data da venda “A empresa vai se tornar uma corporação em que nenhum acionista terá mais que 10% de poder de voto. Inclusive a União, que provavelmente terá bem mais que 10% em ações, mas só 10% com poder de voto. Golden share está fora”, disse Albuquerque. A privatização ocorrerá por meio de capitalização da companhia, com a diluição da participação do governo para menos de 50%. “Nossa expectativa é poder realizar essa capitalização no segundo semestre de 2020. Agora, depende da tramitação no Congresso. É difícil para o MME (Ministério de Minas e Energia) dizer que o PL será aprovado ainda em 2019 ou no primeiro trimestre de 2020. A tramitação deve ocorrer ao longo desse período, para que no segundo semestre a gente tenha condições de aprová-lo”, destacou o ministro.
“A empresa vem trabalhando para se tornar cada vez mais atraente. Vamos ver quanto será captado com o processo de capitalização. A ideia é que a companhia volte a ter capacidade de realizar seus investimentos”, ressaltou. Albuquerque lembrou que a Eletrobras não participa de leilões de energia desde 2014. “As contribuições da empresa no setor de geração, de 31%, e no de transmissão, de 47%, vão cair se não voltar a ter participação efetiva no mercado”, assinalou. “Se o mercado tiver bom apetite a emissão pode ser maior. E poderá haver uma segunda emissão, num segundo momento”, ressaltou o ministro.
Descotização Isso significa que a Eletrobras terá de pagar R$ 16,2 bilhões à União, pela retirada de hidrelétricas do chamado regime de cotas. No entanto, se, no processo de capitalização, a companhia emitir valor maior, poderá usar o montante para investimentos. O regime de cotas foi criado em 2013 e estabeleceu que a energia produzida por uma parte das usinas da Eletrobras seria vendida aos consumidores a valores mais baixos, o que ocasionou alto endividamento da companhia.
Com o fim do regime, a chamada, descotização, a empresa poderá vender energia a preço de mercado. A Eletrobras também terá de destinar cerca de R$ 8 bilhões para reduzir subsídios da conta de luz, dinheiro que será aplicado na Conta de Desenvolvimento Energética (CDE). Outros R$ 3,5 bilhões, pagos em parcelas de R$ 350 milhões ao longo de 10 anos, vão para a revitalização do Rio São Francisco.
Outras medidas A assinatura do presidente aconteceu durante cerimônia no Palácio do Planalto para comemoração dos 300 dias do seu governo. Na ocasião, ele também assinou cinco decretos: um que dispõe sobre o Programa Forças do Esporte (Profesp); um que simplifica e desburocratiza o zoneamento do plantio de cana de açúcar; um que revoga outros 257 decretos que dificultam e burocratizam a vida de pessoas e firmas; um que revoga 334 órgãos colegiados que foram considerados extintos, inativos ou inoperantes; e um que consolida, em um único diploma normativo, 77 convenções internacionais da Organização Internacional do Trabalho.