São Paulo – Se você assistiu a séries como Stranger things e Game of trones, conferiu no cinema um dos filmes de franquias como Star Wars ou de heróis da Marvel, viu os episódios de The Simpsons ou tem em casa um bonequinho do Homem-Aranha ou SuperMan, saiba que se encaixa na categoria dos geeks, que consomem a cultura pop.
Exemplos como os citados acima mostram o tamanho do chamado mercado geek. O consumidor não precisa ser nerd, basta um ponto de contato para aumentar as cifras dessa indústria, que passa pelo cinema, pela TV, pelos quadrinhos, pela internet, por parques de diversões e pela loja de departamento que vende camisetas da Mulher Maravilha.
Apesar de não ser um grande produtor de audiovisual, de quadrinhos ou de outros segmentos da cultura pop, o Brasil já conta com o maior evento do gênero em termos de público, o que tornou o país atraente para quem investe nessa área – de grandes estúdios a editoras de quadrinhos.
A CCXP (abreviação de Comic Con Experience) começa hoje, em São Paulo e, até domingo, deve reunir 280 mil pessoas (em 2018, foram 262 mil visitantes). O acesso é caro e restrito. Os preços dos ingressos, já esgotados, iam de R$ 90 a R$ 8 mil, com pacotes que incluíam ainda algumas exclusividades. A sexta-feira, dia de entrada mais em conta, esgotou em algumas horas. Já ingressos para o sábado, que custam mais (R$ 240), levaram mais tempo para acabar, um mês. Foi o primeiro ano que houve essa mudança.
Segundo Pierre Mantovani, CEO da Omelete & CO, dona do evento – um nerd que gosta de tecnologia, é fã de Game of trones e De volta para o futuro –, esse foi um dos efeitos do momento econômico do país. Os interessados se apressaram em comprar as entradas mais em conta, apesar de tradicionalmente o fim de semana atrair mais visitantes. "Nitidamente, as pessoas querem pagar menos.” Apesar dessa mudança no perfil de compra de 2019, esse ainda é um dos eventos com maior público pagante de São Paulo. Na Fórmula I, lembra o empreendedor, são 40 mil pessoas por dia.
ATRAÇÕES
Em 2014, Mantovani e os sócios decidiram promover o festival no Brasil – o empreendedor não chama a CCXP de feira, por se tratar de um festival indoor com experiências, não um espaço para compra e venda de produtos (apesar de também ser possível levar para casa alguns souvenires). Os participantes vão em busca de palestras, debates, encontros com ídolos e masterclass com as maiores referências no mundo geek, de ilustradores a roteiristas e diretores de filmes.
Entre as estrelas de 2019 estão Margot Robbie, que interpreta a personagem Arlequina em Aves de rapina, Gal Gadot, de Mulher Maravilha, e Ryan Reynolds, de Esquadrão 6, que também tem na sua filmografia o incomum herói Deadpool. Praticamente todos os grandes estúdios estão representados e fizeram investimentos em atrações, como a exibição exclusiva de produções que ainda não chegaram aos cinemas ou nos pacotes de streaming.
Além das experiências para o público – 40% dele de fora de São Paulo –, ocorre um evento paralelo, com 200 empreendedores que atuam no mercado de entretenimento e buscam novidades na área de licenciamento, por exemplo. Para os patrocinadores, a CCXP é uma vitrine que encurta o caminho, em especial até o público jovem.
Parcerias de olho no público jovem
A varejista Riachuelo terá uma megastore de 540 metros quadrados (m²) e vai oferecer um mix de 800 itens, incluindo livros lançados em parceria com a editora Aleph. Segundo Julia Medeiros, gerente de licenciamento da Riachuelo, os produtos voltados ao público geek são um pilar muito importante para a empresa. "A CCXP é o momento perfeito para unir essas duas frentes, e este ano, estamos trazendo muitas novidades do mundo dos games, filmes e séries para encantar ainda mais os nossos fãs”, explicou, por meio de nota.
A operadora Oi, que tem buscado se firmar por meio da participação em eventos voltados ao público jovem, neste ano vai oferecer aos visitantes Wi-Fi de graça. Para isso, instalou 60 quilômetros de cabos de fibra ótica. A cobertura se estende por 100 mil m², com hotspots que garantem, inclusive, conexão wireless à área do estacionamento anexo ao São Paulo Expo – onde parte do público passa a noite para garantir os melhores lugares. São, ao todo, cerca de 375 equipamentos conectados pela empresa.
Hoje, o evento tem grandes proporções, a ponto de já ter sido exportado para a Alemanha, onde ocorreu, em junho, em Colônia, a primeira edição. Antes, foram necessários três anos de estudo de mercado. Mas Mantovani conta que, no início, não foi tão fácil. "As pessoas não tinham entendido, há seis anos, que esse não é nicho, mas o mais mainstream. Todo mundo está consumindo cultura pop sem querer. É como a relação com o celular. A gente não precisa ser viciado em smartphone para usá-lo, simplesmente faz parte da vida."
CRUZEIRO GEEK
Além dos planos de ampliar a marca no exterior, a CCXP já tem passaporte carimbado para chegar ao alto-mar. O primeiro cruzeiro geek, que incluirá cabines temáticas, ocorrerá entre 18 e 21 de março de 2021. Os pacotes do chamado CCXP Cruise vão ser vendidos a partir do dia 9 no site oficial, mas também já estarão disponíveis no evento.
"Nem no sonho mais otimista esperava que chegaria aonde chegamos. Até então, o evento mais notório era o de San Diego (EUA). Quando criamos o nosso, queríamos o nosso DNA, para não ser uma convenção, mas uma experiência. Hoje, podemos dizer que tivemos o mérito de convencer a indústria que o dinheiro investido é para gerar experiência com engajamento. Com isso, ela vende mais ingressos e mais produto”, conta Mantovani. Hoje, lembra, a Warner deixou o encontro de San Diego, mas garante presença no Brasil.
Apesar da experiência acumulada até agora, Mantovani conta que ainda é desafiador preparar a CCXP do ano seguinte. Todo ano, é preciso pensar em algo diferente e correr contra o relógio para não perder o timming. "Mais do que modelo de negócio, a sustentabilidade vem de nunca deixarmos de nos reinventar.”
O CEO não divulga o faturamento da CCXP ou da empresa Omelete Company. Diz apenas que tem uma receita equilibrada, entre B2B e B2C, e que vem trabalhando para manter essa divisão entre as fontes de receita. No entanto, Mantovani acredita que o grande potencial como gerador de caixa será a participação cada vez maior de empresas que não são do mundo do entretenimento. O empreendedor dá o exemplo da própria Oi e da empresa de cartão de crédito Trigg, que participa pelo segundo ano, com o lançamento de produtos exclusivos.
Apesar do tamanho do empreendimento geek, Mantovani não trabalha, por ora, com a possibilidade de atrair investidores para a Omelete Company, dona da CCXP, que conta com seis sócios e 170 funcionários. "Tudo começou com o site, em 2000. Foram 11 anos sem ganhar dinheiro. Hoje, geramos caixa suficiente e não precisamos de capital de fora." (PP)