São Paulo – Daniel Mendez, controlador da holding Abanzai arrematou de uma vez o controle de três startups. O empresário é conhecido pela Sapore, a empresa de maior relevância entre as sete que fazem parte do grupo. Hoje a marca atende a cerca de 1.300 restaurantes corporativos, num total de 1,3 milhão de refeições servidas por dia.
Fazem parte dos negócios, anunciados nessa segunda-feira (27), a Lucco Fit, especializada no preparo e entrega de comidas saudáveis, a Shipp, de entregas, e a Zaitt, dona de uma rede de mercados inteligentes e voltada também ao desenvolvimento de sistemas de automação para o varejo.
A Shipp e a Zaitt pertencem aos mesmos fundadores e as conversas, que aconteceram enquanto havia conversas também com fundos de investimento, levaram nove meses. O valor da compra do controle das três startups não foi divulgado, mas faz parte de um pacote de R$ 20 milhões destinados a esse perfil de negócio. Para este ano, serão outros R$ 20 milhões para novos empreendimentos.
A relação do empresário com o universo das startups começou a ser estruturada na holding há dois anos e hoje é administrada por José Rodolpho Bernardoni, diretor de inovação e venture capital. A Sapore é uma das parceiras do Cubo, um centro de startups e de inovação, em São Paulo fundado pelo Itaú Unibanco e o fundo Redpoint eventures.
Até hoje, pelo menos 100 startups conversaram com Mendez e sua equipe. Ele acredita que a aposta em jovens empresas de tecnologia e inovação é o melhor caminho para dar agilidade aos seus negócios, entender melhor a Geração Millennials e avançar em novos negócios. Com as aquisições anunciadas agora, a holding passa a ter participação em seis startups.
“Me interessa entender essa realidade que ainda se traduz em dois mundos diferentes. O sucesso virá daí, de como traduzir características como agilidade, descomplicação e disrupção para um negócio tradicional”, diz o empresário. Para isso, segundo o controlador da Sapore, é preciso ter o que ele chama de "mindset diferente".
"Seria uma irresponsabilidade uma empresa como a nossa querer tomar papel de startup, porque são modelos diferentes, um mundo tradicional e um mundo que está chegando com startups, com uma nova visão, com um usuário diferente”, explica Mendez. Nesse novo momento dos negócios, o fundador da Sapore cita a importância que os dados dos usuários vêm ganhando, já que podem identificar oportunidades que ainda passam despercebidas. “Ao nos aproximarmos das startups temos a chance de sermos mais especialistas em áreas que de alguma forma já fazem parte do nosso negócio.”
Mendez cita o exemplo da atuação que a Sapore tem hoje na área de logística - por conta da abrangência do negócio, que vai do Acre ao Rio Grande do Sul. “Se surgir um negócio que faça sentido, estamos abertos a olhar. Somos grandes e temos uma operação já consolidada. Mas vemos oportunidades a partir de novas relações com os nossos usuários e por meio de novos serviços. Isso pode vir por meio de tecnologia, da Inteligência Artificial e da melhoria de performance que elas trazem.”
Por enquanto, o fundador da Sapore explica que o momento será de digerir os novos negócios, mas não quer dizer que não possam surgir outras conversas com startups.
Mendez não tem pressa em acelerar o crescimento das três aquisições. A paulista Lucco Fit atua há quatro anos no segmento de preparo e entrega de refeições congeladas e saudáveis. O negócio poderá encontrar sinergia com a bandeira Yurban Food, também pertencente a Mendez e que opera como loja de conveniência de comida fresca.
A Lucco Fit contou com a parceria com a Zaitt para a instalação de geladeiras de alimentos instaladas, acionadas por QR Code, em dois pontos comerciais. Criada no Espírito Santo em 2016, a Zaitt conta atualmente com três mercados em São Paulo e um em Vitória. São lojas com o atendimento 100% automatizado. Assim como a Amazon Go, o cliente entra, pega seus produtos e não tem de passar por um atendente para que a compra seja concluída. Nas unidades paulistanas, a tecnologia empregada é a RFID (Radio Frequency Identification). O sistema de identificação de produtos é automático e funciona por meio de sinais de rádio, o que torna desnecessário o processo de escaneamento das mercadorias.
Além do plano de inaugurar outras três unidades ainda no primeiro trimestre, a startup presidida por Rodrigo Miranda deverá servir de laboratório para o desenvolvimento de projetos de automação de atendimento a partir de agora.
No ano passado, a Zaitt anunciou uma parceria com a francesa Carrefour, que escolheu o negócio como uma forma de testar novos conceitos e tecnologias voltadas à experiência de compra do cliente. No anúncio, o varejista informou que a aproximação com jovens empresas de inovação era uma forma de acelerar a sua transformação digital.
A Shipp, outro negócio de Miranda e de seus sócios que passou para a ser controlado por Mendez, é voltado ao segmento de delivery - dominado pela Rappi e que registra o crescimento rápido de outra concorrente, a Uber Eats. Hoje, cerca de 80% da receita vem das entregas de comida. A bandeira chegou a operar em oito cidades e um de seus concorrentes fez sondagens para uma aquisição. Mas hoje a startup passa por um processo de revisão dos negócios que levou à redução da área de atuação para cinco praças; três delas estão em fase inicial. Por ora, deixaram de ter o serviço Joinville (SC), Niterói (RJ), cidades do ABC Paulista e a capital paulista.
“Estamos olhando para dentro de casa para voltar a crescer. Como toda empresa, é preciso ter estratégia. Hoje, o que vemos são negócios nesse setor com muito funding e a mesma estratégia, com uma competição que não faz muito sentido. Não é muito inteligente. Queremos criar diferenciais que não se limitem a dar desconto, voltaremos com uma estratégia matadora”, avalia Miranda.
Apesar do momento de revisão de estratégia, Miranda não acredita que a Shipp será prioridade a partir de agora, com a entrada de Mendez na operação, apesar de a Zaitt, que não conta com concorrentes, teria sua expansão protelada. Segundo o empreendedor, a visão é de longo prazo para os dois negócios.
Para Miranda, o que pesou na decisão de bater o martelo e ter Mendez no controle das duas empresas foi o fato de o empresário ter tratado os negócios como estratégico, além da possibilidade de troca de experiência em varejo, especialmente alimentar. “Essas perspectivas são muito maiores do que o peso apenas de um investimento. Quando nós nos conhecemos e começamos a falar sobre as empresas, vimos que elas partem com o mesmo apetite para evoluir e capturar sinergias."
Apesar de ser o novo controlador, Mendez não vai exercer função executiva nas startups. No caso da Zaitt e da Shipp os fundadores vão continuar com cargos de diretores e a Sapore passa a ter presença no conselho consultivo. O acordo foi costurado com a assessoria da Focal Capital.
Sem IMC, Mendez estuda negócio para expandir a Sapore
- Apesar da empolgação com as startups que passam a integrar a holding controlada por Daniel Mendez, esses investimentos não suprem os planos que tinha para um outro negócio. Em julho de 2019, Daniel Mendez, dono da empresa de refeições coletivas Sapore, deu adeus definitivamente ao acordo que tentou costurar em 2018 com a IMC, controladora das redes de restaurante Frango Assado e Viena. Foram meses de negociação.
- "São coisas bem diferentes. A questão de IMC era comprar uma empresa com ebitda, com vida, com história, bem diferente de startup. Uma coisa não conflita com a outra”, diz o empresário.
- Sem o negócio com a IMC, Mendez diz que mantém a possibilidade de expandir a Sapore por meio de uma associação. "Depois desse movimento, muitos bateram na nossa porta”, diz, sem dar pistas se está em conversas avançadas com alguma empresa. O empresário admite apenas que está observando o mercado. "A gente foi muito assediado".
- A IMC assinou um acordo de fusão com a MultiQRS, franqueadora master para o Brasil das marcas americanas Pizza Hut e KFC, pertencente à família de Carlos Wizard.
- Antes, Mendez havia feito uma oferta pela participação na IMC, sem negociar antes com os controladores. Como reação, os acionistas da IMC, listada na bolsa, aprovaram uma mudança no estatuto na tentativa de inviabilizar o negócio entre as duas companhias. Com a alteração, o investidor que chegar a uma participação de pelo menos 30% na IMC passou a ser obrigado a fazer uma oferta a todos os acionistas. A exigência é chamada no jargão do mercado de capitais de "poison pill" (ou pílula de veneno) e tem por objetivo atrapalhar a tomada do controle no caso de empresas com capital pulverizado na bolsa.
- Mendez tentou adquirir 40% dos papéis da IMC na bolsa, em uma operação direta, no que é conhecido como”oferta hostil”- sem uma negociação prévia com a administração da empresa. Seu lance foi de R$ 8,63 por ação da IMC. O objetivo era fundir a companhia e a Sapore, que juntas teriam um faturamento estimado de R$ 3 bilhões.
- Com a mudança estatutária, Mendez seria obrigado a fazer a oferta a todos os acionistas e precisaria desembolsar R$ 1,357 bilhão, mais que o dobro do que os R$ 600 milhões previstos no início do movimento em direção à dona do Frango Assado.