
A expansão do carnaval de Belo Horizonte cria oportunidades de receita até mesmo para os setores mais especializados da economia, a exemplo do ramo da segurança patrimonial. Prédios residenciais e comerciais, além dos órgãos públicos, lançam mão do aluguel de grades para conter aqueles foliões afoitos e descuidados da responsabilidade coletiva com a preservação da cidade. O número de contratações do serviço chega a aumentar 50% durante os dias oficiais da folia. Enquanto isso, os recursos movimentados pelos blocos de rua e pelo setor de comércio da capital mineira contribuem para o grande fluxo de dinheiro que a folia traz para BH.
A empresa Tentec Eventos, especializada em aluguel e montagem de equipamentos para festas, verificou aumento considerável de demanda durante o carnaval. O gerente da companhia, Cléber Pinheiro, afirma que com o crescimento do carnaval da cidade, cada vez mais condomínios e prédios comerciais alugam grades para proteger as portarias e jardins de potenciais atos de vandalismo. Ele estima que o número de contratações desse serviço aumente 50% durante os próximos dias da festa. “É capaz de alguns empresários nem conseguirem atender à demanda”, conclui. A empresa cobra diária de R$ 7 por grade. Pinheiro afirma que o aluguel de tendas também aumenta, em especial no interior.
Os moradores do condomínio L'Unico, no Bairro Funcionários, decidiram gradear o entorno do prédio pela primeira vez para o carnaval de 2020. A empresária e síndica do prédio, Ericka Franco, acredita que o custo foi elevado: R$ 50 por metro quadrado. “Tivemos que colocar este ano e vamos colocar nos outros que virão devido à falta de educação das pessoas. É inviável este tipo de investimento todo ano”, conta. Ela afirma que o problema piorou com o crescimento rápido do carnaval de Belo Horizonte.
O problema de alguns é a oportunidade de outros. A empresa Mark Eventos trabalha exclusivamente com a fabricação e aluguel de grades de proteção há 10 anos. Segundo o proprietário da empresa, Marcos Antony, nos últimos três anos a demanda pelos aluguéis cresceu muito. “É uma demanda surpreendente. Aguardo que continue crescendo. O carnaval tem sido bem interessante pra gente”, afirma. Segundo o empresário, as contratações do serviço tiveram elevação de 50% nos cinco dias da festa, sem contar o período de pré-carnaval. A empresa cobra diária de R$ 8 pela unidade. “Não é [benéfico] apenas para nós, mas também gera emprego e renda para os mineiros da capital”, diz.
A Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) responde por cerca de 90% do total de aluguéis de grades oferecidas pela Mark Eventos. A PBH contrata os serviços das empresas de aluguel de grades com o intuito de “proteger o patrimônio público e garantir a segurança”. Segundo a Empresa Municipal de Turismo de Belo Horizonte (Belotur), foi feito um estudo dos blocos com público acima de 500 foliões. No percurso definido para um bloco desse tamanho mínimo, a prefeitura gradeou praças, jardins e estátuas. Pelo menos 16 praças foram cercadas, incluindo a Praça da Liberdade e aquelas integrantes do programa Adote o Verde. Prédios como o Palácio das Artes, a Fundação de Educação Artística e o Instituto de Criminalística também receberam gradeamento.
Patrocínio privado
De acordo com a Belotur, o dinheiro gasto com o aluguel das grades vem das planilhas de estruturas e serviços, que têm valor total de R$ 8,3 milhões. Esse valor é captado por meio de edital de patrocínio privado e se destina a gastos de estrutura em geral, como arquibancadas. Ainda segundo a Belotur, os prédios residenciais e comerciais que quiserem alugar as grades não precisam de autorização da prefeitura.
Os gastos dos blocos de rua são outro lado que mostra o que o carnaval significa para a economia na capital. Os grupos criam postos de trabalho e investem em estrutura para a festa. O Bloco da Calixto, por exemplo, emprega mais de 70 pessoas diretamente, sem contar os postos de trabalho indiretos. Entre dezembro e fevereiro, o bloco gasta R$ 70 mil: R$ 50 mil com pessoal – que inclui músicos, fotógrafos, assessores, seguranças e técnicos –, mais R$ 20 mil destinados à estrutura e trio elétrico.
A produtora do Bloco da Calixto, Renata Almeida, afirma que todos os funcionários recebem pelo trabalho. “Já está na agenda, já é um evento nosso anual e nos programamos para cumpri-lo. Fora o que é gerado de forma indireta: os locais onde realizamos os shows, o público que utiliza transporte pra ir ao local, o que vem de fora. É muito dinheiro”, conta. Porém, ela afirma que o carnaval é um investimento “zero a zero”. “É basicamente para pagar conta, não temos lucro com o carnaval”, diz.
Renata Almeida acredita que o carnaval de rua de Belo Horizonte se tornou um dos três maiores do Brasil graças a “uma mobilização única e exclusiva da população”. Por outro lado, a produtora avalia que os órgãos públicos demoraram a entender que a festa gera lucro e turismo para a cidade. Ela afirma que há muito a ser feito ainda, especialmente no que se refere ao sistema de financiamento dos blocos. “Acho que o carnaval de BH tende só a crescer, mas ainda está aprendendo a lidar com seu tamanho. Crescemos muito e em pouco tempo”, diz.
O bloco Funk You também dá ideia do tanto de dinheiro movimentado com a festa em Belo Horizonte. O bloco e a banda que leva o mesmo nome movimentam juntos cerca de R$ 250 mil durante todo o período do carnaval. O orçamento inclui, além do desfile, ensaios, eventos e vendas de produtos. Pelo menos 75% desse montante vem dos cachês que a banda recebe. Parte do dinheiro é usada para pagar os 50 funcionários diretos do grupo.
A produtora do Funk You, Polly Paixão, conta que para conseguir pagar o desfile, que custa cerca de R$ 50 mil, é necessário promover outros eventos durante o ano. O custo é maior do que os R$ 12 mil recebidos, este ano, da prefeitura, o máximo permitido. “O tanto que os bares ganham, circula dinheiro, favorece o emprego de pessoas. Os grandes blocos, a rede hoteleira, de transporte por aplicativo. Movimenta-se muito mais dinheiro nessa época. Tanto no pré-carnaval como no dia do desfile”, afirma.
*Estagiário sob supervisão da subeditora Marta Vieira
Varejo pronto pra faturar
O crescimento do carnaval de BH puxa também a expectativa de ganhos de alguns segmentos do comércio e do setor de serviços e turismo. A conclusão é de pesquisa da Federação de Comércio, Bens e Serviços de Minas Gerais (Fecomércio-MG), indicando que 66,7% do empresariado acredita que o período será positivo para o setor. Pouco mais da metade (51,2%) espera vender mais este ano do que em 2019. Os comerciantes apontam o número maior de turistas na cidade e o crescente movimento nas ruas como as principais razões para o otimismo.
“O retorno é garantido”, disse ontem a comerciante Jaqueline de Moura, enquanto montava banca de produtos para venda durante o carnaval na Praça da Savassi, Zona Sul de BH, local tradicional da folia. Jaqueline investiu R$ 5 mil no estoque e na estrutura para lucrar com a festa. Há dois anos, ela deixou de curtir o carnaval na Bahia e transforma o carnaval em fonte de renda na capital mineira.
Entre as empresas que participaram da pesquisa da Fecomércio-MG, 48,9% funcionarão durante todo o período do carnaval. Desse universo, quase 70% abrirão todos os dias. Já 68,6% das empresas que estarão abertas durante a festa realizaram investimentos para atender à demanda maior. Aumentar o estoque de produtos, vender itens que não são normalmente comercializados e treinar funcionários foram as ações mais citadas. A entidade consultou 280 empresas das regiões Centro-Sul, Leste e Oeste de BH, entre 28 de janeiro e 13 de fevereiro.
Para a analista de pesquisa da Fecomércio-MG Letícia Marrara, a expansão do carnaval em Belo Horizonte favorece o turismo interno. “Observamos aumento no fluxo de turistas nacionais, principalmente pela alta do dólar, o que favorece o setor, impactando, principalmente, as atividades econômicas. Além disso, o carnaval já é considerado pelos empresários como um período de grandes oportunidades de vendas”, afirma.
De acordo com outra pesquisa, da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL/BH), o gasto médio de cada folião deve ser de R$ 54,79 em cada compra feita durante o carnaval na cidade. Os empresários entrevistados pela associação esperam maior volume de vendas de alimentos (57,4%), bebidas (52%) e roupas (17,6%).
Para conseguir atender à demanda maior, as empresas que participaram da pesquisa pretendem contratar em média três funcionários temporários para o período. O levantamento da CDL/BH também aponta que os turistas que visitarão a capital mineira ficarão hospedados por quatro dias, e gastarão em média R$ 810 na rede hoteleira. A pesquisa foi realizada com empresários de BH entre 20 de janeiro e o último dia 3.
Segundo cálculos da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o setor do turismo e entretenimento de Minas Gerais deve movimentar R$ 809,7 milhões durante o carnaval. O volume de recursos estimado para o estado é o quarto maior do Brasil, atrás do Rio de Janeiro (R$2,68 bilhões), São Paulo (R$ 1,94 bilhão) e Bahia (R$ 1,36 bilhão). Ainda de acordo com a CNC, 88% da receita gerada com o feriado no país virá dos segmentos de bares e restaurantes, transporte rodoviário e hotelaria. (Com Felipe Quintella)
Hotelaria
R$ 810
É a estimativa de gastos dos turistas que ficarão hospedados em BH nos próximos quatro dias
Infraestrutura
R$ 8,3 milhões
Cifra total destinada à estrutura e aos serviços necessários para a organização do carnaval de BH, segundo a Belotur