Após oito reduções do preço da gasolina nas refinarias anunciadas neste ano pela Petrobras, o motorista não vê a queda chegar às bombas nos postos de combustíveis. Para analistas do setor que observam a dificuldade de o benefício alcançar o bolso da população, só o encolhimento da demanda nos revendedores, como resultado do impacto do novo coronavírus sobre a economia, deverá baratear a gasolina no varejo nos próximos meses.
A Petrobras anunciou nessa quarta-feira (24) um corte de 15% no preço nas refinarias, o nono ajuste feito em 2020 para as distribuidoras. As reduções vem em um ano marcado por disputa de mercado entre países produtores de petróleo, e instabilidade nas bolsas de valores no mundo devido ao avanço da pandemia do coronavírus. Dessa sucessão de repasse, houve um aumento do preço. Com a última redução, a estatal estima que o preço caiu 40,5% no atacado desde o início do ano. Enquanto isso, segundo dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), entre janeiro e março o preço do litro do combustível nos postos do país caiu em média 2,1%.
Na pesquisa da semana de 12 a 18 de janeiro, a média nacional do preço era de R$ 4,586. No levantamento feito do dia 15 a 21 de março, o valor era R$ 4,486. Ou seja, a diferença foi de 10 centavos por litro em três meses. A tendência se confirmou em Minas Gerais e em boa parte das maiores cidades do estado. A comparação das pesquisas realizadas no meio de janeiro e em meados de março mostra queda de 2,4% no preço médio da gasolina nos postos mineiros.
No início do ano, a média do preço no estado saiu de R$ 4,815 por litro em janeiro para R$ 4,698 em março. Em Belo Horizonte, em três meses, a média de custos para o consumidor recuou 3,1%, de R$ 4,674 para R$ 4,525 o litro. Em Contagem, na Região Metropolitana de BH, a queda foi um pouco mais expressiva no período. Em janeiro, os postos da cidade cobravam, em média, R$ 4,72 o litro. Em março, passaram a cobrar R$ 4,536, baixa de 3,89%.
Betim, também na Região Metropolitana da capital, registrou retração de 1,2% em três meses. O litro da gasolina no município custava em média R$ 4,665 em janeiro e R$ 4,606 em março. No interior do estado, os preços nos postos também não refletem os sucessivos reajustes da Petrobras este ano.
Em Juiz de Fora, na Zona da Mata, a média de preço do litro da gasolina entre 12 e 18 de janeiro era de R$ 4,882. De 15 a 21 deste mês, desceu a R$ 4,853. Isso significa diferença de aproximadamente três centavos no bolso do consumidor, com variação de 0,59%. Por outro lado, em Uberlândia, no Triângulo, a variação em três meses foi de 5,1%. O preço médio do litro do combustível caiu de R$ 4,891 para R$ 4,64.
Estoques
De acordo com a ANP, os preços registrados na pesquisa da semana de 15 a 21 de março são os menores desde o fim de novembro de 2019, descontada a inflação. No entanto, nenhuma variação na média de preços nem sequer se aproxima do corte total de 40,5% feito pela Petrobras nas refinarias.
Na avaliação de analistas ouvidos pelo Estado de Minas, os reajustes da Petrobras demoram – ou nem chegam – a ser sentidos pelos consumidores na prática por causa da alta tributação e da perda ao longo da cadeia de distribuição de combustível. “O sistema de tributos no Brasil é injusto. Se a reforma tributária não for aprovada, vai ser sempre assim”, afirma o analista da corretora Mirae Asset, Pedro Galdi.
Já Feliciano Abreu, coordenador do site agregador de preços Mercado Mineiro, explica que a redução da Petrobras “vai se perdendo” ao longo da cadeia, que inclui, entre as refinarias e os postos, os distribuidores. Abreu acredita que a demanda reduzida por combustível, com as cidades vazias por causa da pandemia de coronavírus, vai obrigar os donos dos postos a demorar cada vez mais a renovar os estoques, que foram comprados com os preços antigos. Ou seja, os repasses são arrastados por mais tempo.
Contudo, mesmo sem os repasses, a previsão é de que os preços da gasolina caiam – ou pelo menos não subam – nos próximos meses. Pedro Galdi aponta que a própria baixa da procura provocada pela COVID-19 é o principal fator para isso. “A redução da demanda será muito forte e a competição vai forçar queda. Não consigo identificar de quanto, mas virá”, afirma o analista.
Baixa concorrência contém repasses
O analista Pedro Galdi observa que a guerra de preços entre a Arábia Saudita e a Rússia continua puxando o preço do barril de petróleo no mercado internacional para baixo. Esse contexto é a principal razão para os cortes feitos pela Petrobras nos custos da gasolina nas refinarias. Porém, o analista acredita que os países “devem se entender” ainda em 2020. “O preço baixo não é bom para ninguém”, conclui.
Enquanto isso, os postos de combustível devem passar por uma fase difícil, assim como boa parte do comércio, lembra Feliciano Abreu, diretor do site de preços Mercado Mineiro. “O dono do posto vai ser obrigado a baixar o preço por causa da concorrência. Ele vai ter que assumir esse prejuízo de certa forma para atrair os poucos consumidores que estão rodando. A tendência no longo prazo é de prejuízo para os postos”, analisa Abreu.
Questionado sobre a demora dos repasses da Petrobras para os postos, o Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo no Estado de Minas Gerais (Minaspetro) afirmou, em nota, que não estima um período para que o consumidor sinta redução de preços. O sindicato apresentou como razões para esse posicionamento o fato de não haver tabelamento no setor, não ser papel da associação e por não fazer junto aos postos levantamentos de dados comerciais.
“Os estabelecimentos revendedores de combustíveis são apenas mais um elo na cadeia de comercialização. Sendo assim, o Minaspetro ressalta que os postos, sendo o último e mais visado elo no segmento de distribuição e revenda, dependem de decisões e repasses – caso estes aconteçam – por parte dos outros agentes do setor; ou seja, governo, refinarias, usinas de etanol e companhias distribuidoras”, afirma a nota.
No texto, o Minaspetro ainda manifesta insatisfação com os impostos que incidem sobre os combustíveis. Na avaliação do sindicato, a tributação no setor “sufoca o empresário, fecha dezenas de estabelecimentos em todo o Brasil e impede o crescimento sustentável do país”.
(*) Estagiário sob a supervisão da subeditora Marta Vieira