A decisão do governo federal de flexibilizar as regras de restrição de funcionamento das atividades econômica a partir de segunda-feira é considerada péssima pelo doutor em economia Thomas Conti.
Em estudo divulgado no início desta semana, ele alerta para o risco de permitir que as pessoas voltem a se aglomerar, impedindo o já difícil controle da contamisão pelo novo coronavírus.
“Não é esperado que a pandemia acabe em 2020. Mesmo no melhor cenário, não há retorno à normalidade no sentido de voltarmos aos hábitos despreocupados de fevereiro, salvo inovação tecnológica”, diz Conti, que defende a máxima franqueza das autoridades.
“A população deveria ser avisada sobre essa realidade o quanto antes, de forma clara e transparente, para que possa ajustar expectativas.”
Em entrevista exclusiva ao Estado de Minas, o professor do Insper e do Mestrado do Instituto de Direito Público (IDP-SP) destaca que todos devem se preparar para muitas privações, inclusive de poder sair às ruas.
Em estudo divulgado no início desta semana, ele alerta para o risco de permitir que as pessoas voltem a se aglomerar, impedindo o já difícil controle da contamisão pelo novo coronavírus.
“Não é esperado que a pandemia acabe em 2020. Mesmo no melhor cenário, não há retorno à normalidade no sentido de voltarmos aos hábitos despreocupados de fevereiro, salvo inovação tecnológica”, diz Conti, que defende a máxima franqueza das autoridades.
“A população deveria ser avisada sobre essa realidade o quanto antes, de forma clara e transparente, para que possa ajustar expectativas.”
Em entrevista exclusiva ao Estado de Minas, o professor do Insper e do Mestrado do Instituto de Direito Público (IDP-SP) destaca que todos devem se preparar para muitas privações, inclusive de poder sair às ruas.
Logo no começo do estudo, você ressalta não ter vínculos políticos ou partidários. Até que ponto esses vínculos estão contaminando as discussões sobre as melhores formas de frear o novo coronavírus?
O vínculo, em si mesmo, não vejo como problema. O problema acontece quando a paixão política transborda para questões que não têm relação com a política. Modelos epidemiológicos não diferenciam direita e esquerda, filiação partidária. Remédios também não, e o vírus menos ainda. O problema maior no caso é que as intrigas políticas estão tomando conta do debate e cada dia perdido com elas é um tempo precioso que não está sendo usado para se organizar o melhor possível contra a pandemia.
Você pede que os líderes sejam “transparentes” e prefiram “a verdade difícil a uma mentira conveniente”.
Quando defendem a flexibilização do distanciamento social, reabertura do comércio e outras atividades, políticos estão prestando desserviço à população?
Acredito que há um desserviço ao não avisar a população quanto aos riscos desse tipo de decisão. Talvez um desserviço ainda maior é não avisarem claramente para a população o que significa realmente “reabertura”, “vida normal”, e o que é esperado para o restante de 2020. Reabrir tudo hoje sem novas regras sanitárias e um plano coerente de contenção do vírus se provará trágico em poucas semanas.
Também há um pedido para “pacificar os ânimos”. Está faltando isso a algumas autoridades?
A presidência precisa se decidir se nessa luta contra a pandemia será parte da solução ou do problema. Incitar parte da população a entrar em conflito com prefeitos e governadores no meio de uma pandemia não é boa ideia. Países mais ricos e mais organizados que nós estão com dificuldade, mesmo se esforçando ao máximo.
Você alerta que nossas limitações, como falta de leitos e testes, nos colocarão em situação complicada. Estamos perdidos ou há esperança?
Acredito que há esperança, mas cada dia é decisivo. Eu mesmo queria explorar mais a fundo vários pontos do meu estudo, mas o lancei antes porque a situação está ficando crítica. Se vamos suprimir essa primeira onda do contágio, precisaremos de reforço imediato das medidas de distanciamento que já estão vigentes. Se vamos tentar a mitigação por prazo mais longo, precisamos de metas claras e um plano de contenção de meses. Se querem reabrir a maior parte das atividades sem a população ciente das novas regras de comportamento, precisaremos de um plano para nos preparar para a tragédia.
Com perspectivas ruins, o que os brasileiros devem esperar do futuro?
A melhor estratégia é se preparar para o pior e comemorar caso o pior não aconteça.
Muitos dizem que ou se morre de vírus ou de fome em função das restrições. Seria essa uma falsa premissa?
O congresso aprovou o maior auxílio em dinheiro da história brasileira para que essa escolha trágica não precise ser feita. Mas já era para este dinheiro estar na mão da população que precisa. Falta agilidade. São três meses para conseguirmos conter a primeira onda.
Seria melhor adotar a supressão social, como fizeram Espanha e Itália, até pela dificuldade que os brasileiros têm de ser disciplinados?
Não acredito que temos problemas acima do normal com disciplina. Antes das quarentenas municipais e estaduais, muitos iniciaram voluntariamente medidas de distanciamento. A supressão pouparia mais vidas e ganharia mais tempo para o sistema de saúde. Mas não é claro se é isso que estamos fazendo agora.
Você defende o “comprometimento e cooperação” de todos. E também que convencer a população a ficar isolada é o mais fácil e barato. Alguns governantes têm errado nisso?
Infelizmente, os piores exemplos têm vindo de quem ocupa o cargo mais importante do país, o presidente. Não é seguro retomar as atividades sem novas regras sanitárias, não é seguro caminhar sem cuidados por aglomerações e já há previsão de um benefício de três meses para que as pessoas não precisem se expor ao vírus sem necessidade devido ao medo da fome. Essas são as mensagens que precisam ser reforçadas, e não o contrário delas. É preciso ter claro que, mesmo se fizermos tudo certo, ainda há chance de perdermos essa guerra. E não estamos fazendo tudo certo.
As regras sanitárias mais rígidas são essenciais, principalmente se houver relaxamento do isolamento. Mas como tratar disso com parte da população não tendo acesso a água tratada e esgoto?
É muito triste que fornecer saneamento básico e água potável para todos não tenha sido prioridade no Brasil nas últimas décadas. Mas a pandemia trabalha com prazos de dias e semanas, saneamento é em anos e décadas. A emergência de saúde pública precisa que as pessoas tenham acesso à higiene básica, respeitem distância dos demais, usem máscaras, evitem aglomerações e quaisquer outras exposições evitáveis.
O quanto as notícias falsas atrapalham no combate à pandemia da COVID-19?
Muito. Os modelos de contágio mostram que mesmo um pequeno percentual de pessoas que não respeite as novas regras de distância, higiene e comportamento podem causar um dano desproporcional ao esforço de quarentena. Cada notícia falsa é um incentivo para que existam mais pessoas nesse grupo e menos pessoas ajudando a frear o vírus.
Os dois pontos de vista
O que o Ministério da Saúde recomenda
Suspensão das atividades ou lockdown
- A mais radical das atitudes, utiliza o uso de profissionais de segurança para controlar a circulação de pessoas, causando alto custo econômico para governo, empresas e pessoas. Ainda não há, no Brasil, a adoção dessa medida
Distanciamento social amplificado ou DSA
- Deve ser adotado quando todos os setores da sociedade precisam permanecer na residência porque o número de casos confirmados impactou mais que 50% da capacidade instalada do sistema de saúde local. Isso até que o suprimento de equipamentos (leitos, EPIs, respiradores e testes laboratoriais), além de equipes de saúde, estejam disponíveis em quantitativo suciente? para promover, com segurança, a transição
Distanciamento social seletivo ou DSS
- Nos locais onde os casos confirmados não tenham impactado em mais de 50% da capacidade do sistema de saúde, é indicaca a transição para o DSS, no qual apenas alguns grupos cam? isolados, com atenção aos de maior risco de agravamento da doença, como idosos e pessoas com doenças crônicas (como diabetes e hipertensão) ou condições de risco – como obesidade e gestação de risco. Nesses casos, pessoas abaixo de 60 anos podem circular livremente, se estiverem assintomáticas
O que Thomas Conti defende
- Manutenção do afastamento social amplificado até, no mínimo, o achatamento da curva de contágio
- Quando do relaxamento de política de afastamento social, adoção de regras sanitárias rígidas
- Clareza e transparência dos governantes em todas as esferas para convencer a população ao sacrifício
- Ação coordenada pelo governo federal para implantar todas as ações necessárias ao controle da COVID-19
- Atenção às cadeias produtivas para evitar risco de desabastecimento, que provocaria caos social