Produtores do Projeto Jaíba, que foi criado no semiárido do Norte de Minas para se tornar o maior perímetro irrigado da América Latina, estão sofrendo com o excesso de água. Terrenos inteiros estão sendo inundados por falta de drenagem do que é retirado do Rio São Francisco. Ao longo de sete anos – de 2013 a 2019 –, a região foi castigada por sucessivas secas, ao ponto de ser necessária uma obra de intervenção no canal do Velho Chico (que viabiliza o empreendimento) para facilitar a retirada de água.
O produtor Edson Pereira Júnior, que pertence ao Conselho de Administração do Distrito de Irrigação do Jaíba 2 (DIJ 2), afirma que o problema do excesso de água no subsolo na etapa 2 do Jaíba atinge em torno de 5 mil hectares – o equivalente a 5 mil campos de futebol, segundo levantamento da Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa).
Um dos proprietários na área empresarial do perímetro irrigado, ele disse que já teve atingidos 75 hectares do seu terreno, com perdas em sua plantação de banana da ordem de R$ 2 milhões por ano. A etapa 2 do Jaíba abrange 19,26 mil hectares, concentrando 56 empresários. Edson diz que não sabe quantos irrigantes – como ele – enfrentam o problema de excesso de umidade nos seus terrenos por causa da falta de drenagem, mas acredita que pelo menos 15% deles foram atingidos.
A parte dos grandes produtores do Jaíba gera 3,8 mil empregos diretos e 15 mil indiretos, com um faturamento da ordem de R$ 142 milhões/ano, informa Pereira Júnior. Ainda segundo ele, 60% da área dedicada à grande produção está em atividade.
O empresário disse que uma lagoa de 500 hectares foi formada junto ao perímetro irrigado devido à falta de drenagem. Mas a “situação dramática”, afirma, é que a água acumulada está invadindo plantações de banana, manga, limão, cana e outras culturas. “Em alguns locais, a inundação está chegando às casas dos agricultores”, informa.
Pereira Júnior relatou que, inicialmente, o encharcamento dos terrenos na etapa 2 do Projeto Jaíba ocorreu de forma lenta. “Mas, de três anos pra cá, o excesso de água no solo teve uma evolução muito rápida, elevando o nível do lençol freático e também os prejuízos”, descreve o produtor, lembrando que a água também invadiu áreas onde estão as máquinas das estações de bombeamento do perímetro irrigado.
"De três anos pra cá, o excesso de água no solo teve uma evolução muito rápida, elevando o nível do lençol freático e também os prejuízos"
Edson Pereira Júnior, produtor de bananas
O empresário explica que a água é captada no Rio São Francisco e levada até as áreas de plantio da etapa 2 do Jaíba por cerca de 150 canais de irrigação. Depois da irrigação das culturas, parte da água lançada nos plantios deveria escoar para as partes mais baixas (vazantes) ou retornar ao próprio Velho Chico, por meio de drenos, que deveriam ser construídos.
No entanto, segundo Pereira Júnior, de 148,9 quilômetros previstos para o Jaíba por ocasião da implantação do megaempreendimento (décadas de 1970/1980), foram feitos somente 70,5 quilômetros, deixando de ser executados 78,4 quilômetros de drenagem. Com isso, o problema foi se agravando ano a ano. Para piorar, foi construída uma estrada de terra entre os lotes do Jaíba 2, o que agravou ainda mais a situação.
Ele salienta que a falta de drenagem acarreta muitos prejuízos nas áreas irrigadas porque “95% das plantações não suportam que as raízes fiquem debaixo d'água, o que ocasiona a falta de oxigênio”. Ressalta ainda que a umidade do subsolo é difícil de ser dimensionada. “Dependendo da cultura, o produtor só percebe o problema quando sua área fica inundada. Nesse caso, áreas ainda não exploradas ficam invisíveis aos nossos olhos”.
O empresário lembra que o excesso de água no lençol freático também provoca a salinização do terreno. “Sem drenagem e com a salinização, o solo perde a capacidade produtiva, como se fosse um deserto”, observa.
Falta licenciamento ambiental
A Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa) informou que iniciou estudo para correção do problema da falta de drenagem na etapa 2 do Projeto Jaíba, mas que o início das obras está condicionado ao licenciamento ambiental. O órgão informou que os serviços estão orçados em R$ 860 mil e a previsão é de que sejam concluídos em oito meses a partir do momento em que forem iniciados, devendo ser gastos 5.070 horas/máquina, com escavação de 3,8 mil metros cúbicos (m3) de terra.
Segundo a Secretaria Estadual de Agricultura, os problemas relativos à drenagem nas áreas do distrito 2 do Projeto Jaíba “são decorrentes de efeitos negativos provocados pelo raso nível de água no subsolo em algumas importantes áreas agrícolas. A pasta informa que realizou o estudo que levou a essa conclusão e que, atualmente, realiza “trabalhos topográficos e os dimensionamentos de dreno específico e de dreno secundário (DS-39)”.
“Ainda para a primeira quinzena deste mês, está previsto o agendamento do serviço de campo que fará a análise da melhor locação, alinhamento e escavação de dreno alternativo”, informou a Seapa, acrescentando que a ação é gerenciada pelo DIJ 2, com apoio técnico da Secretaria de Estado de Agricultura.
A Seapa alega que o serviço de drenagem da etapa empresarial do Jaíba não foi realizada até hoje “por se tratar de uma obra complexa, que requer a realização de um estudo detalhado e envolve processo de licenciamento”. Por outro lado, informou que, junto com o Distrito de Irrigação do Jaíba 2, está trabalhando na obtenção das licenças ambientais e na adoção de outras providências.
Procurada, a 1ª Superintendência Regional da Companhia do Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba (Codevasf) em Minas, responsável pela implantação do Projeto Jaíba, apenas alegou que a etapa 2 do projeto de irrigação é de competência administrativa da Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento e do Distrito de Irrigação do Jaíba 2 (DIJ 2).